Prólogo

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Pula os montes de lixo enquanto vai para fora de casa. Não tinha percebido o quanto estava fedido lá dentro até sentir o cheiro de ar puro lá de fora. Estava se sentindo meio dormente, meio grogue, talvez por causa de sua cabeça, ainda estivesse se sentindo tonta. O vento frio lhe bate no rosto, refrescando-a, a fazendo lembrar da sua bochecha dolorida. Passa a mão nela. Dói. Não, não foi um tapa muito forte, ela que era fraca demais.

Nunca que a um ano atrás sairia sozinha de casa. Mesmo se tudo não tivesse mudado, ainda assim, mesmo com os treze anos que tem agora, não sairia também. Sabia que grande parte do motivo era ser pequena para a idade. Meio mirrada mesmo. Parecia ter nove anos, em altura e peso. E sabia que o restante do motivo era a superproteção de sua família, que dava importância demais ao fato de ser pequena demais. Nunca a trataram como inferior por isso, mas tinham medo do que os outros poderiam fazer. Agora não havia mais isso. Nenhum dos motivos importavam mais.

Sorte sua cabeça não ser de alguém de nove anos também. Sempre lhe disseram que era uma mocinha, que era madura. Mas agora era uma adulta. A única da casa. A única que funciona bem, pelo menos.

Estremecia ao se lembrar de tudo o que perdeu. Sentia seu peito doer e quando se dá conta já estava perto da praça mais próxima da sua casa. Naquele horário ela estava vazia então caminha para o balanço e se senta nele. O balançar lhe lembra um ninar suave e se entristece ainda mais, pois sabia que isso não aconteceria mais. Lembrou-lhe de como era se sentar no colo de sua mãe, das vezes que encostava o rosto no peito dela. O mesmo fazia com seu pai. Nem com suas bonecas isso acontecia mais.

Só quando as lágrimas caíram mais rápido, pingando nas suas coxas cobertas pelo vestido, que percebeu que elas já deveriam estar caindo a um tempo, só não tinha percebido antes. Estava com tantas saudades de mamãe e de papai. Eles morreram em um acidente de carro tem um ano e só ficou ela e seu irmão. Seu irmão maravilhoso que depois daquele dia ficou quebrado.

Tinha tantas saudades dele. De quem ele era. Só tinham um ao outro mas era como estar sozinha agora. Olha suas mãos. Tinha band-aids nos seus dedos indicador e polegar e uma mancha avermelhada de queimadura começava a se formar no dorso da mão. Saíra de casa para comprar a pomada, porém aqui estava. No balanço.

Não sabia o que mais podia fazer para ter seu irmão de volta. Jurava estar tentando ser melhor. Ser boa. Mas ainda não era o suficiente. Não era o suficiente para ele, precisava ser mais.

-Está tudo bem?

Dá um pulo no balanço, sua bunda escorregando e quase caindo no chão. Se equilibra, segurando com força as correntes, enquanto seu olhar se ergue, de forma automática para o dono da voz. Seus olhos arregalam. Sente seu estômago apertar de medo. Lembra-se da história da chapeuzinho e da sua lição. Não se pode confiar em estranhos.

-Não posso falar com estranhos... Desculpa. - Não podia ser mal educada né? Sua mãe a ensinou a ser educada. Mas com estranhos também? Não saia. Nunca aconteceu isso antes. SE seus pais estivessem vivos ou seu irmão estivesse bem, perguntaria o que fazer nessa situação. Mas não tinha ninguém. Só tinha ela mesma com quem contar.

Ele sorri e me diz se chamar Caleb. Era um nome bonito. Não parece o nome que um lobo mau teria. Não que eu soubesse o nome de um. Olho ele de esguelha, para ele não perceber minha curiosidade.

Ele me olha durante uns segundos e se senta no balanço ao lado do dela. Seus olhos deslizam por ela, parando nos pés descalços, na roupa um pouco suja com respingos de sopa e finalmente param nas minhas mãos. Finalmente me pergunta:

-Está doendo? - Ele acena para minha mão.

Era uma pergunta boba. Olha a mão. Uma bolha estava se formando. Parecia dolorido. A cutuco com meu indicador da outra mão e estremeço um pouco com a dor. Sim, dói.

Caçador de LobosOnde histórias criam vida. Descubra agora