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Capítulo 02

Isaac Hale

Minha mudança para Washington é uma das melhores coisas que aconteceram em minha vida nos últimos seis anos. O "MedStar Washington Hospital Center", é um dos centros de referência em cirurgia cardíaca, pelo menos para uma coisa Vivian serviu! A decepção sofrida foi tão imensa que mergulhei de cabeça em minha formação e consegui fazer do meu nome uma referência entre os grandes cirurgiões cardíacos. 

O hospital dispõe de um grande centro de pesquisa, onde eu posso colocar em prática tudo aquilo que já está no papel há algum tempo. Já são quinze dias nesta cidade nova, hospital novo, pessoas novas. Aqui me ofereceram o cargo de chefe do departamento de cirurgia cardíaca, uma oferta que eu realmente não pude recusar.  

O dia hoje está tão agitado, pois o hospital está cheio. Na hora do almoço eu vou até o refeitório, no balcão eu pego o meu almoço e procuro uma mesa em que eu possa pelo menos fazer uma refeição sossegada, mas não há sequer uma desocupada. Avisto de longe, uma mesa em um canto afastado e de certa forma respiro aliviado, porque não quero me sentar com outros funcionários do hospital. Meu humor não está dos melhores. 

Quando me aproximo, noto que há uma moça sentada na mesa. Olho no relógio em meu punho e vejo que não dá tempo para procurar outro lugar, já é quase hora do término de intervalo. Há uma pilastra próxima e por isto não consegui enxergar a loira.

— Com licença, você se importa se eu me sentar? Todas as outras mesas estão ocupadas — Quando ela levanta o olhar para mim, eu não posso crer, é a mesma maluca que me trombou duas vezes na semana passada. — Só pode estar de brincadeira, você está me perseguindo?

— Que eu saiba Dr. Hale, foi o senhor que pediu para se sentar aqui! — diz debochada.

— Como sabe o meu nome? — Ela coloca a colher de doce na boca e aponta para o meu crachá — Hum, bom almoço! — Digo e dou as costas.

— Pode sentar doutor, não vou te morder e muito menos trombar em você novamente. Aliás, você também precisa olhar por onde anda! — Abre um sorriso. — Já estou terminando e vou sair.

Me sento e a observo desconfiado. Meus planos para almoçar em paz foram por água abaixo. Sem querer passo a estudá-la enquanto come sua sobremesa e lê um livro, o qual não identifico a capa. Ela usa um coque bem feito, tem os cabelos loiros, olhos verdes e uma boca bem desenhada. Esguia, se veste de uma forma esquisita, aliás, é toda esquisita, e sem pensar eu pergunto:

— Como se chama?

— Raíssa — Responde e não desgruda os olhos do livro. Me sinto na obrigação de ganhar sua atenção.

— É a segunda vez que te vejo por aqui! Trabalha em que setor?

— Não trabalho aqui doutor, sou voluntária, dou aulas de dança para as crianças da oncologia.

— Interessante — Não diz nada, está mergulhada na leitura e em nenhum momento olha para mim. Mal educada! Almoço por alguns minutos em silênico, seu celular apita, ela verifica e suspira fechando o livro.

— Preciso ir, bom almoço! — Se despede pegando sua bolsa e sai na direção do balcão. A observo pegar uma barra de chocolate e colocar na bolsa.

Posso notar suas belas curvas, ela é alta. Há muito não vejo uma mulher com uma beleza tão natural, não parece se preocupar muito com a aparência, não está maquiada e aparenta ser aquele tipo de mulher que se ocupa com coisas mais importantes do que estar sempre impecável. 

Para com isso Isaac! Está reparando demais na moça. Me repreendi. 

Termino meu almoço calmamente, quando me levanto para voltar ao meu consultório, noto que há um envelope no chão, o pego e nele está escrito "Raíssa Montenegro". Ela deve ter deixado cair quando saiu. Guardo o envelope no bolso do jaleco e saio. O devolverei assim que a encontrar novamente. 

O dia segue sem muitas ocorrências. Wagner e eu estamos trabalhando em um caso complexo, buscando alternativas para conseguirmos salvar a vida da criança que nasceu com uma grave cardiomiopatia e vem sobrevivendo até agora. Temos que buscar algo eficaz e rápido para fazer o preciso, mas o tempo é o nosso maior inimigo. 

Depois de horas de estudo, conseguimos criar uma estratégia para o procedimento. Agendo a cirurgia para o dia seguinte. Wagner antes de sair se depara com o envelope que Raíssa deixou cair. 

— O que é isso?

— Uma moça deixou cair no refeitório.

— Vai encontrá-la na oncologia.

— Você a conhece?

— Sim! É minha paciente.

Confesso que fico muito curioso por saber que Raíssa é paciente dele, mas não pergunto mais nada. Sei que a ética médica nos impede de falar sobre nossos pacientes, a não ser que estejamos trabalhando juntos no caso. No final do meu plantão, eu me dirijo até o estúdio para ver se Raíssa está lá, para poder entregar seu envelope, mas já está tudo fechado e não há ninguém. 

Indo em direção ao estacionamento eu entro no meu carro e ligo o rádio. Toca uma música que eu gosto muito, Still Loving You do Scorpions. No caminho para casa eu mergulho na letra, coisa que eu nunca faço, e que me causa dor e amargura. 

"Time, it needs time
To win back your love again
I will be there, I will be there
Love, only love
Can bring back your love someday
I will be there, I will be there

Fight, baby, I'll fight
To win back your love again
I will be there, I will be there
Love, only love
Can break down the walls someday
I will be there, I will be there (...)"

"Tempo, é preciso de tempo
Para reconquistar seu amor
Eu estarei lá, estarei lá
O amor, apenas o amor
Poderá trazer seu amor de volta algum dia
Eu estarei lá, estarei lá

Lutarei, garota, lutarei
Para reconquistar seu amor
Eu estarei lá, estarei lá
O amor, apenas o amor
Poderá acabar com as barreiras algum dia
Eu estarei lá, estarei lá(...)"

Still loving you (Ainda te amo) – Scorpions

Desligo o rádio com raiva, porque me fez lembrar de Vivian. Aquela ordinária aproveitadora, tomara que esteja apodrecendo em algum canto. Empurro meus pensamentos para o fundo da minha mente e surpreendentemente quem me vem na cabeça é a bela bailarina do espetáculo que assisti com Vivian na noite mais infernal da minha vida. Lembrar daquilo me dá um certo aperto, pois em meio a tantas coisas ruins que aconteceram naquele dia, eu ainda consigo lembrar de todos os passos minuciosamente perfeitos daquela bailarina, a luz própria emanada por ela, tão majestosa quanto a beleza rara de uma flor delicada. 

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Frágil Coração ( Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora