197 dias antes

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Às vezes minha vida parece sem sentido. Eu faço algumas loucuras e me arrependo depois, eu sou muito de  momentos. Tô aqui, agora, quero fazer algo e faço, sempre me arrependo no final. Mas dessa vez foi diferente.
Eu estou gostando daqui, estou me sentindo completa e compreendida. Todos têm uma grande história de como vieram parar aqui, Cecília sabe o porquê da minha fuga, pedi segredo pra uma garota até então desconhecida, mas toda essa agitação me fez querer contar pra ela. Espero que seja de confiança.
Tem muitas pessoas na casa, então as refeições são feitas em grupos, as tarefas são divididas e todo mundo convive bem, na maioria do tempo nem param na casa. Acho que poderia viver aqui até os minutos finais da minha finita vida, mas como sei que não será possível, aproveitarei cada momento aqui.
Cecília está tentando me ensinar a andar de moto- devo confessar que não tenho muito equilíbrio- ah, ela é tão paciente, acho que seremos boas amigas.
Queria que tudo fosse assim, tranquilo. Não queria meu passado me atormentando a cada hora que estou sozinha ou que me falam alguma coisa que me faz lembrar de como era besta e sem graça.
Eu sou órfã de pais biológicos, mas quando fiz 10 anos fui adotada. Meu pai adotivo se chamava Morfeu Green (sim, Morfeu como o deus dos sonhos. A mãe dele era apaixonada por mitologia grega) e minha mãe era a Malu Green (significa mulher guerreira, acho que combina com ela).  Era o casal mais apaixonado que já vi em toda a minha vida, se valorizavam e respeitavam, sabiam seus limites; Não conseguia imaginar eles separados até minha mãe adoecer. Ela ficou internada por uma semana no hospital, lutando contra a Sepse, infelizmente a doença ganhou. A barra ficou pesada, meu pai começou a levar um monte de mulher pra casa, queria alguém que conseguisse substituir o vazio que sentia pela morte da Malu, até achar a Nashira, que é uma mulher esplêndida e de uma capacidade intelectual incrível, ela é amável e companheira, me ajudou bastante.
Após toda essa adaptação com a Nashira, acabei me dando muito bem com ela, contávamos tudo e éramos super amigas. Meus pais não eram ricos nem nada disso, tínhamos condições boas e suficientes para não passar fome ou poder comprar algo no cartão. Depois de um tempo eu comecei a perceber umas manchas no corpo da Nashira (rosto, braços, pernas. Às vezes até mancava, mas nunca escutei gritos então pensava que era fazendo as coisas de casa). Descobri, depois de muitos anos que meu pai mantinha a sua "amada" esposa em um relacionamento abusivo. Quando descobri eu fiquei em choque, não conseguia comer, assistir, dormir, ficava sentada sem fazer nada. Quis muito ajudar Nashira, mas o que eu, uma garota magricela de 14 anos poderia fazer contra um homem forte de quase 40? Na semana de véspera do meu aniversário de 18 anos, ela faleceu, toda a minha esperança foi embora com ela, toda a minha vontade de viver e felicidade. Então eu esperei, cada dia era um tormento. Ele voltou a levar mulheres pra casa, mas agora era pior. Elas gemiam alto, faziam escândalo, ficavam jogadas bêbadas na escada, eram duas/ três todo dia. Então finalmente chegou o grande dia, meu aniversário de 18 anos, me livrar daquele tormento, era tudo que conseguia imaginar. Fui na delegacia, após chorar horrores no banheiro do meu quarto, denunciei meu pai por abuso psicológico e estupro de vulnerável (mulheres bêbadas, ou seja, sem capacidade de se defender). A denúncia foi anônima mas sabia que se não sumisse, sobraria pra mim. Então, sumi.

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⏰ Última atualização: Sep 11, 2018 ⏰

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