One · The Rain

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- E-ela... Vai ficar... B-bem? - sua voz estava fraca, rouca, mais baixa do que de costume. Seus olhos vermelhos ardiam, devido ao excesso de lágrimas escorridos pelas grandes esferas negras. Seus cabelos cacheados ainda molhados por conta da chuva que levara mais cedo - chuva essa que persistia em cair, incansavelmente.

- Por hora, não sei dizer. Só o tempo revelará - o médico com olhos cansados, escondidos por de trás das lentes de seus óculos, fala com um tom calmo. - Entretanto... Muito provavelmente alguma sequela irá ficar.

- S-sequela? - A jovem murmura, incrédula.

- Há muitas lesões em seu corpo. Em especial na região craniana. Infelizmente, a única certeza é que sequelas são inevitáveis. - o homem responde com pesar.

Rose olha para a garota deitada na cama de hospital, imóvel, inerte.

- Agora, eu terei que ir. Outros pacientes esperam por atendimento - o homem anuncia. - Mas, poderia me fazer um favor?

Pela primeira vez, a garota vira sua atenção para o doutor de cabelos grisalhos ao seu lado.

- Que... Favor? - pergunta, receosa.

- Poderia ficar com a paciente - ele aponta para a moça sobre a cama surrada - por um tempo? O hospital está mais cheio que o de custume, todos os enfermeiros estão ocupados. Caso ela venha a ter convulsões, você poderia chamar alguém para ajudá-la - mesmo hesitante, Rose assente levemente com a cabeça. - Ótimo, obrigado.

O médico pega uma planilha que estava sobre uma banqueta no quarto e sai do ambiente, deixando duas jovens desconhecidas sozinhas.

Rose suspira. Procura uma resposta que lhe explicasse como ela podia parar novamente em um quarto de hospital, sob circunstâncias parecidas.

Sentou-se sobre a banqueta antes ocupada pela planilha do doutor. Olhava vagamente para uma pequena janela com grades no local. Pelo vidro, podia-se ver as gotas de chuva deslizando pelo material gélido. Por fim, deixou seus pensamentos inundarem sua mente.

Era como se a experiência vivida logo pela manhã voltasse à tona.

Sangue espalhado pelo balcão, escorrendo pelo assoalho do estabelecimento. Rose gritava, mas ninguém a ouvia. Para todo canto que olhava, havia respingos de sangue. Lágrimas rolavam por seu rosto, sua voz ficando fraca.

Logo mais adiante, pouco centímetros longe de si, perto de uma das mesas do local, um corpo ensanguentado, com um osso da perna esquerda exposto.

Aquela cena perturbadora... Vista mais uma vez pela jovem...

E agora o corpo que encontrara no café em que trabalha estava bem diante de si, em um quarto de hospital.

Um gemido de dor penetra os ouvidos de Rose. A garota olha para frente, vendo a enferma sobre a cama se contorcendo, sua pele suando. Uma expressão angustiante tomara conta de suas feições.

Rose não sabia o que fazer. Não sabia se corria daquele quarto, deixando a moça sozinha. Não sabia se gritava por ajuda - mesmo temendo que ninguém a ouvisse, como de costume.

Sem saber mais o que fazia, levantou-se lentamente de seu assento, caminhando inconscientemente em direção a garota, que agora tremia incontrolavelmente. Tentou parar várias vezes, mas seu corpo não a obedecia, continuava seguindo o trajeto. Até que desistiu de resistir.

Ajoelhou-se ao lado esquerdo da cama, pegando uma das mãos da jovem deitada, que agarrava de forma miserável os lençóis que a cobria.

Entretanto, inexplicavelmente, quando a enferma sentira o toque, parara quase que instantaneamente de convulcionar.

Aquilo não fazia sentido. Era como se fosse uma cena de livro de romance ruim, com provas de amor irreais.

Porém, Rose não se importara com o quão ridículo aquilo parecesse. Continuara segurando a mão da enferma, ainda ajoelhada no chão frio.

···

Acordara com um movimento brusco. Caíra para trás, sentindo em seus joelhos uma dor de origem desconhecida para ela.

Rose olha ao redor, sem saber onde está. Até seus olhos caírem sobre um rosto confuso.

- Quem... É você?

A garota caída no chão piscara muitas vezes, como se não tivesse entendido a pergunta.

- Eu perguntei quem é você - a jovem antes deitada sobre a cama, encontrava-se sentada agora, repetindo a pergunta que fizera instantes atrás, alterando um pouco a voz. - Me responda!

- E-eu... Sou... - Rose gaguejava, com dificuldades em pronunciar palavras que desejavam sair de sua boca.

- Onde eu tô? Quem é você? Por que não me responde! - seu rosto se contorcera em expressões perturbadas, angustiantes. Olhava bruscamente para todos os lados, como se procurasse uma saída. - Me tire daqui! Socorro! Alguém!

A enferma debatia-se sobre a cama. Rose levantara-se do chão, sentindo como se seus joelhos fossem falhar, traindo-a. Afastou alguns passos. Não podia negar que o medo estara tomando conta de seu ser.

Os berros desenfreados da garota transtornada eram altos, apavorantes. Eram capazes de serem escutados pelos corredores e quartos próximos.

- Maya, aplique um sedativo na paciente! - com um estrondo, o médico de cabelos grisalhos abrira a porta, ordenando à enfermeira atrás de si que o obedecesse.

Rose observava tudo atentamente, paralisada. A mulher com uma seringa na mão, cujo nome era Maya, injetara um líquido no braço da jovem que gritava e se debatia sobre a cama.

Aos poucos, a garota fora se acalmando, deitando-se, mesmo à contra gosto. Seu corpo amolecendo.

- Por... Favor... Me tire daqui... - foi um sussurro baixo, mas Rose pôde escutar. Logo após, a enferma fecha os olhos, que instantes atrás suplicara por ajuda.

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