O Retorno

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Eu poderia ter fingido que não estava mal, e acho que até tentei. Fiz minhas malas sem silêncio. Poderia ter colocado fones no ouvido e embalado o ritual com boa música, mas temi que a música marcasse aquele momento e eu tivesse que descartá-la depois. Esperei pacientemente o decorrer das horas, sentado na minha cama, com os braços cruzados. Quando minha mãe disse que a viagem seria à noite, liguei para Sebastian e propus que a gente se encontrasse. O encontro durou uma hora, mas eu o durei em alpha, no modo automático. Recordo apenas de ter retornado para a casa e de descalçar os tênis antes de me jogar na cama. Não comi nada durante o dia. Quando minha mãe bateu na porta do meu quarto para me chamar para a partida, lembro-me apenas de me jogar no banco do passageiro do carro e apertar o cinto. Nem das malas eu tomei conta.

Apaguei. Achei que seria tomado por nostalgia enquanto percorria as estradas em direção ao Maine, mas quem me tomou foi o sono. Tive sonhos. Sonhei com Sam, como não podia deixar de ser. Sonhava que eu clamava pela atenção dele e ele me desprezava. Ele andava com copos de bebida na mão. Eu implorava para que me aceitasse de volta, mas ele fazia de conta que não me ouvia.

Era um pesadelo, é claro, mas, quando acordei, estava decidido de que a realidade seria exatamente contrária a ele.

Quando acordei, recebi o anúncio de que já estávamos perto da casa em que eu passaria os meus próximos meses.

- Acho esses vilarejos tão agradáveis - disse minha mãe. - Você não acha que eles parecem aqueles bairros privativos de Nova Iorque?

- Nunca fui a um desses - eu respondi, forçando uma boa educação. O cochilo prolongado me deixara com um leve mau humor. O silêncio era aquilo que eu mais desejava.

O carro parou em frente a uma casa puramente térrea, tão pacata e suburbana como todas as outras das redondezas - inclusive a de Angelina e de Sam.

Por conta disso, eu não sabia nem dizer se seríamos vizinhos deles, embora, no fundo, torcesse para não sermos.

- Lugarzinho charmoso, você não acha? - disse minha mãe, apanhando as próprias malas no porta-malas do carro. - Acho que vamos passar um tempo bacana e tranquilo por aqui.

A entrada da casa compreendia uma sala de estar e uma cozinha. Sim, era uma casa charmosa, bem decorada e arrumada. Tinha televisão. Um corredor levava aos dois únicos quartos da casa e a um banheiro. No fim dele, uma porta de vidro levava a um jardim de trás. Passei por ela e me deparei com uma pequena piscina, visivelmente menor do que a da casa de Sam, e uma área para churrasqueira e festas. A nostalgia me arrebatou apenas nesse instante.

- Estou de volta ao Maine - eu deixei escapar. Joguei-me de joelhos na grama. - Oh, meu Deus, eu realmente estou em Portland.

-... Acha que não tem problema mesmo? - disse minha mãe a alguém. Não era a mim, porque ela estava distante, na cozinha, e eu conseguia vê-la através do vidro da porta enquanto ela caminhava de um lado a outro. Falava ao celular.

Há quanto tempo estamos aqui, afinal?, perguntei-me, limpando a grama dos joelhos. A pergunta fazia sentido, porque eu podia jurar que não tinha deixado Nova Iorque há mais do que alguns minutos, mas já era noite e minha mãe parecia super à vontade em uma casa que acabara de conhecer. Talvez já estivéssemos lá há meia hora - então eu ficara meia hora ajoelhado no jardim?

O tempo passa de um jeito estranho quando estamos ansiosos. Ou quando estamos com muito sono.

- Vou aguardá-los, então - foi o jeito como minha mãe finalizou a conversa. - Até logo. - Parou no centro do hall da casa e voltou o olhar para a porta de vidro. Encontrou-me no mesmo instante. - Blaine, eu trouxe alguns mantimentos em uma das malas, acha que consegue trazê-las até a cozinha?

BLAM? ~ Livro 2 ~Onde histórias criam vida. Descubra agora