365 dias. 12 meses. Faz 1 ano. Um ano que eu parti.
Há um ano atrás eu tomei aquele veneno e o amargo de seu gosto desce queimando minha garganta até hoje.
O Math, meu namorado, se tornou restos de um jovem. Ele não assiste mais filmes em que tenha o Vin Diesel e parou de jogar futebol aos domingos.
O cabelo dele cresceu, a barba vive por fazer e os olhos são tão sem brilhos que eu suspeito de que ele só enxergue os dias nublado.
Ainda tenho em mente o quão ele estava desolado no dia do meu velório.
— Eu amei a Ana Luiza desde o primeiro momento em que a vi — ele disse enquanto tentava reprimir a vontade de chorar — Ela tinha toda essa pose de durona, mas no fundo travava uma batalha consigo mesma — Math sentou-se ao lado de onde estava o caixão e colocou a cabeça no joelho... suas lágrimas vieram incessantes e altas, fazendo todos chorarem com ele.
— Se acalme meu filho — a mãe dele se aproximou e o ajudou a levantar-se.
— Por que ela fez isso, mãe? — ele encostou a cabeça no ombro dela, incapaz de conter as lágrimas — Está doendo tanto!
— Não somos ninguém para julgar o motivo, meu amor. Só ela sabia o que estava passando.
Os dois caminharam até um banco do outro lado da capela e sentaram, observando minha mãe se aproximar do caixão e passar a mão no meu rosto pálido, pedindo baixinho para que eu abrisse os olhos. Meus olhos estavam pesados, eu não conseguia abri-los.
Duas semanas depois acharam o Math imerso na banheira. A água gelada cobria todo o topo de sua cabeça e no corredor da casa dava para notar a torrente que saía do banheiro.
Ele levantou a cabeça com rapidez e respirou com dificuldade, tentando recuperar o fôlego. As lágrimas não paravam de descer pelo seu rosto e ele disferiu uma sequencia de socos na parede, sentindo-se incapaz.
— Um, dois... três — contou determinado e afundou novamente.
Eu sabia que estava disposto e que dessa vez ele iria conseguir. Passaram-se dez segundos e nada dele levantar a cabeça.
Duas porradas ecoaram na porta.
— Math! Você está aí? — a voz rouca do pai dele perguntou — Tem algo vazando, tá tudo molhado aqui fora!
Mais alguns segundos se passaram.
As porradas na porta aumentaram e agora a mãe dele também gritava para que ele a abrisse.
Mas a única coisa que o Math ouvia eram zumbidos distantes.
— Matheus abre essa porta, agora!
Seus pulmões já doíam, em protesto pela falta de oxigenação. Ele balançou o corpo levemente mais não levantou. Ele não iria levantar. Era o fim.
Depois de muito lutar contra a vontade de subir, seus olhos fecharam lentamente, a água se tornou vermelha por causa do sangue que saia de seu nariz e ele perdeu a batalha. A água entrou, queimando tudo por dentro.
A porta foi parar no chão e seu pai também entrou.
Pi Pi Pi.
Foi o som que ele ouviu ao abrir os olhos e observar aquele branco deprimente da parede do quarto do hospital. O Math respirou fundo, aliviado na verdade...pois, de fato, ele não queria aquilo para si.
— Desculpa, não consegui — sussurrou de olhos fechados. E, eu sabia que era para mim.
Ele não conseguiu se matar. Mas o que a mãe dele e mais ninguém notou, foi que ele já estava morto. Por dentro.
Desde então o Math se definhou, passou a vier na sombra de algo que já foi sólido. Não se permitiu envolver com mais ninguém e abandonou os amigos.
O sofrimento dele parece aumentar cada dia mais e toda noite eu observo ele em seu quarto, acordando suado e berrando meu nome a plenos pulmões. Ele passou a ter pesadelos com meu corpo sem vida no chão daquele banheiro e sua mente vem se tornando doentia por isso.
Eu não queria, de forma nenhuma, causar tamanho sofrimento para ninguém. Eu só não aguentava mais continuar e acabei recorrendo a pior maneira de dar uma solução para minhas dores. O que eu não imaginava, era que arrastaria pessoas que amo para o poço deprimente que antes eu estava.
Aos domingos o Matheus visita minha lápide, leva flores e senta na sombra da árvore, enquanto come meu açaí preferido e escreve um capítulo do livro que está escrevendo: Sombras de Um Recomeço. Espero, de coração, que ele saia das sombras e, enfim, consiga recomeçar.
365 dias. 12 meses. Faz 1 ano. Um ano que eu parti.
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Desculpa, não consegui
Short StoryAos dezessete anos de idade, Ana Luiza, chegou à conclusão de que cometer suicídio não era, necessariamente morrer; mas sim acabar com a dor. Mas, à conclusão veio tarde demais e já não havia como voltar atrás. Desculpe escrever isso no passado, mas...