Transar com um homem, quando você é um homem, exige cuidados especiais. É quase como amar, que também exige cuidados especiais, mas só quase, porque desde que não estejam em público, vocês podem se amar do jeito que bem entenderem. Transar, não, transar requer uma checklist específica com suas devidas marcações, independentemente de onde estejam. Não posso dizer que estava pronto porque ninguém está pronto até que se faça ― até que se faça várias vezes ―, mas eu tinha lido o maior número de textos sobre o assunto internet afora à medida que o dia se insinuava inevitável.
(Havia um demônio arranhando debaixo da minha pele, seu uivo atravessava como uma agulha a extensão de meu crânio.)
As únicas pessoas com quem eu conversava eram Luana e o próprio João. Não perguntaria nada a ele, de jeito nenhum. Luana só ria de mim toda vez que eu tocava na questão, tão ignorante quanto eu.
"Você enfia o chuveirinho e deixa 10 segundos lá?"
"Sim. Depois você corre na privada e põe tudo pra fora."
"Que horror! Que nojo! E eu posso fazer também?"
"É pra quem tem cu, Luana. Mulher também tem, não tem?"
"Meu marido sempre me pediu, sabe? Ele deve ter alguém que faça isso pra ele porque um dia ele simplesmente desistiu e nunca mais voltou ao assunto."
"Pode ser."
"Eu não ligo. Não vou fazer. Muito burocrático", mas ela pareceu pensar a respeito. "Me conte depois, ok?!"
Eu devia ter comprado um vibrador. Pensava nisso quando passava em frente a uma farmácia. Mas e a vergonha? Eu morria de vergonha. Eu pedi para ele levar camisinha porque não tinha coragem de comprar. Era como se as pessoas fossem me pegar no pulo assim que eu encostasse a mão na embalagem. "Olha só quem vai transar hoje! O veadinho do 5ºB! Ele finalmente vai ter o cuzão comido, como sempre quis. Ei, mariquinha pão-doce! Ei, boiolinha! Não adianta chorar, vai apanhar até virar homem." Não. Ninguém diria isso, eu sei, mas eu não conseguia.
"Você tem outra vida agora. Você não tá mais lá", João dizia.
O medo não chega de um dia pro outro, porque iria embora de um dia pro outro? Me chicoteava mesmo. Eu devia ter comprado um vibrador. Um massageador, como dizia no site. Um dedo não é a mesma coisa, dois dedos não é a mesma coisa, três dedos não é a mesma coisa! Um pênis é bem mais grosso que três dedos, vai chegar num nível que os dedos não chegaram, como eu vou saber se estou limpo? É bem capaz que eu o suje e ele não queira mais falar comigo, que faça piadas e conte numa mesa de bar sobre a pior noite que teve com o veadinho do 5ºB enquanto flerta com um cara experiente, lindo, com um corpo lindo. Meu corpo é uma porcaria! Meus braços são finos demais, minhas pernas parecem duas varetas, minha bunda não é grande e dura, não sou bem dotado, não tenho peitos largos nem barriga definida, sou uma vergonha, só devia transar quando meu corpo fosse um corpo de verdade, não essa merda aqui!
Contudo, eu havia assumido um compromisso. A intimidade havia crescido entre nós — histórias compartilhadas, beijos trocados, mensagens de madrugada, provocações de todo tipo.
Marcamos de João ir em casa num sábado. Eu não me lembro mais de muitas das vezes em que transamos, eu quase não me lembro mais de muita coisa, mas eu me lembro desse sábado. Era outubro, portanto a noite estava fresca e a cidade toda tinha decidido aproveitá-la. O barulho na minha janela, que dava para a rua Ubirajara, era enorme. Eu vestia um samba-canção preto de cetim que contrastava com a cor da minha pele. Quando ele me mandou uma mensagem dizendo que estava ali na frente, eu tirei a camiseta que vestia e fui atendê-lo apenas com o samba-canção.