Capítulo 10

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Quebrando correntes mentais

Agarius levantou-se com um pesar; a poltrona da voz misteriosa estava virada para ele, mas não havia ninguém nela; virou-se para a parede e os quadros que ali tinham, estavam lisos, sem nenhum desenho ou imagem; ele se aproximou da porta e abriu-a. Ao abrir, viu um pequeno caminho a sua frente, algumas plantas e rosas aos lados da pequena trilha que conduziam para outro caminho a direita, e subia uma turbulenta colina. Ao virar a direita, retornou a visão de onde tinha saído e viu que era uma simples cabana surrada, mas a porta era esbranquiçada e o símbolo ainda estava nela. Sentiu a falta da comitiva, se perguntando onde poderiam estar; começou a subir a colina íngreme, entre algumas árvores ríspidas e cheias; percebia algumas delas como estátuas rudes de um homem com semblante odiável – eram suas estátuas em trocos –, e elas as assustavam, como perseguidoras; outras apontavam dedos de julgamentos para ele; Agarius estremeceu e subiu a colina correndo, desesperado.
Chegou no cume com a respiração pesada e ofegante; sem ninguém por perto, apenas um penhasco e um oceano extenso lá em baixo; uma lua pálida no céu enegrecido e um vento frio cobria-o; foi a primeira vez que sentiu falta da sua comitiva, mas não havia se quer, nenhum sinal deles.
– Ei! Alguém! Você está aí? O que está acontecendo? O que devo fazer? – chamou a voz misteriosa em desespero. – Por favor, Fill! Onde vocês estão? – procurava por todos os lados, mas não via nada. Aproximou-se do precipício, em euforia e sem perceber, escorregou e caiu.
Ao bater no chão, despertou, assustado – como alguém que acorda de um sonho terrível – e com as mãos sobre o rosto; estava deitado novamente, olhando para cima, num teto escuro; apalpou o corpo para ver se estava inteiro; levantou a cabeça lentamente e viu que estava novamente na sala; a poltrona virada sem ninguém sentado e os quadros na parede, denotavam um vazio profundo. Ergueu o corpo e se pôs de pé, ainda sentindo-se estranho, com grande pesar nas pernas. Dirigiu-se à porta, dando outra olhada naquela sala escura e vazia.
Abriu-a, esperando sair no mesmo lugar, com uma curta trilha entre flores e uma colina à direita, ou ainda na esperança de ver o rosto da sua comitiva, sentados em bancos de um trem espacial; mas ao abrir, havia um longo corredor, com portas na direita e esquerda; deu alguns passos, mas sentiu medo, e então, paralisado, voltou para a porta de onde havia saído, porém esbarrou em uma parede sem nenhuma porta ou qualquer sinal de entrada; além disso, existia um quadro, com uma pintura; era uma flecha com a ponta para cima e dois raminhos – um a direita e outro na esquerda – cresciam para o alto, com faias charmosas.
Agarius virou novamente e começou a caminhar pelo extenso corredor; havia portas abertas, mas não se podia entrar por elas; existia algum tipo de escudo transparente no lugar das portas que davam a uma visão paralela – como um portal do tempo. Foi se aproximando da primeira porta e além dela havia uma cena, de Agarius junto a uma mesa com outras pessoas, como um conselho, mas estava gritando de raiva e com um pincel na mão, assinava papeis, falando em alta voz: “Eles que se virem agora!”.
A cena se apagou e a entrada ficou branca; como se fechada; continuou caminhando e outra cena começou numa porta a esquerda; era Agarius sentado em seu trono, com uma espada ao colo e uma mulher, com um bebê nos braços pedia-lhe clemência, mas Agarius erguia a espada e anunciava uma sentença. Agarius, observando seus próprios comportamentos, sentia-se intimidado por si mesmo, abaixando a cabeça em vergonha; a cena acabou e outros flashbacks, recordações, memórias ou lembranças repugnantes da vida dele, eram expostos, como provas indubitáveis de seu caráter.
No final do corredor havia uma última porta à direita e essa estava fechada; era uma porta comum às que conhecia, feita de madeira e sem nenhuma novidade. Segurou a maçaneta e abriu-a, devagar. Parou numa sala quadrada, aparentemente normal, até fechar a porta pela qual entrou; as paredes, o teto e o chão, tornaram-se espelhos, onde todo o centro era a sua própria imagem. Para onde olhava, se via – como se obrigado a admirar-se –, mas não havia motivo para qual se admirar. Ele ao conseguia fitar os olhos em seus olhos, mas um sussurro apareceu em seus ouvidos: “Contemple-se... Conheça-se... Entenda-o!”. Agarius pôs as mãos nos ouvidos e os olhos se fecharam, recusando aquela interação consigo.
– Quem é você? Quem realmente é você, Agarius... – um sussurro Lhe perturbava e não adiantava tapar os seus ouvidos, uma vez que o ouvia dentro de sua mente.
– Deixe-me em paz... – Agarius disse, tentando confrontar a voz em sua cabeça. Então vários sussurros invadiram-no: “Você consegue... Está quase lá... Quem é você Agarius... Você, Agarius... Agarius... Agarius...”.
– Agarius! – ele parou de ouvir as vozes tumultuando sua cabeça e foi abrindo os olhos lentamente, até perceber-se deitado numa poltrona reclinada, um teto escuro e uma voz às suas costas.
– Bem... Como você está se sentindo? – a voz misteriosa perguntou. Ele, ainda sem saber o eu dizer e sentindo-se estranho, apenas balbuciou algumas palavras.
– Eu... Eu não sei... – disse ele, confuso.
– Agora, falta pouco para a nossa viagem acabar. Você tem que passar por um último teste, e esse mostrará se você está, de fato, apto a voltar para casa – falou a voz. Agarius apenas ouviu, estarrecido.
– Onde estão eles? – perguntou Agarius, querendo saber da sua comitiva.
– Irei levá-lo até seus amigos... Todos eles já o esperam. Levante-se e venha! – chamou a voz misteriosa.
Então Agarius se levantou, tocou os pés no chão e o seu corpo estava mais leve, como se um enorme peso – que a muito carregava – o tivesse deixado; sentia-se bem, como nunca se sentiu antes; era como se tudo isso o tivesse modificado de alguma forma que não entendia; algumas correntes mentais foram se quebrando e novas experiências tornando-se relevantes.
Ele abriu a porta e o céu estava bonito, claro, mais vivo e belo; era novamente a mesma trilha e uma colina.
– O que vai ser daqui pra frente? – perguntou a voz misteriosa, enquanto Agarius caminhava.
– Bem... não sei ao certo, mas muita coisa terá que ser diferente – falou ele, repensando sua vida. – Só não sei se irão acreditar em mim, se serei finalmente compreendido, como serei interpretado – disse em dúvida.
– Nunca se importe totalmente com o que as pessoas falam ou pensam de você. As pessoas pensam o que elas querem, às vezes chega próximo, mas o pensamento mais genuíno é o que você tem acerca de si mesmo. Repense pensamentos negativos, não dê muita importância a coisas de pouca relevância. A sua honra vale mais do que todos os tesouros que possa ter e se todos os tesouros forem trocados pela sua honra, serão riquezas sem valor... – instruiu-o a voz, enquanto o rei subiu a colina.
– Qual será a visão que a comitiva vai ter de mim? Quer dizer, eu só estou curioso de como eles vão me receber... – falou Agarius, preocupado.
– Não fique tão ansioso, as coisas não são mais como eram antes! – disse a voz.
– Eu estou curioso, em saber onde eles foram parar – falou Agarius enquanto chegava ao cume da colina. Havia um sol penetrante e forte; foi deparado com uma fileira de pessoas ao pé do precipício. Elas estavam juntas, com as mãos um no ombro do outro, num abraço fraterno e longínquo; eram seis homens virados de costas, admirando a bela visão do mar ao longo horizonte. Agarius foi se aproximando deles e os chamou.
– Ah... Olá! – disse ele. Então foram virando lentamente e os dois do meio eram o soldado e o prisioneiro que haviam desparecido. Ele, o prisioneiro, abaixou a cabeça ao ver a face do rei Agarius.
– Onde você esteve? O procurei por toda parte! – dizia Agarius, enquanto se aproximava mais deles, e se referindo ao prisioneiro. Ele estava com a cabeça baixa e temendo, enquanto Agarius falava. – Estou falando com você, rapaz! Olhe para mim! – dizia, com autoridade. Ele levantou os olhos, trêmulos e o encarou, temendo ainda a imagem daquele rei a sua frente. Agarius franziu a testa e disse:
– Até que fim que te encontrei... Meu amigo! – falou amolecendo a testa e tirando o olhar pesado, e abriu os braços; o rei e o “prisioneiro” se abraçaram, selando uma paz cordial e todos aplaudiram, e se cumprimentaram, e todos se abraçaram, contemplando todos, o pôr do sol.
– Quais são seus nomes? – perguntou a voz misteriosa.
– Fill, um servo fiel!
– Willy, o menestrel alegre!
– Cornélios, o cocheiro que conduz por caminhos de paz!
– Arn, o soldado leal!
– Jeff, o guerreiro do bem!
– Frederick, o homem sem correntes!
– Agarius, um coração quebrantado, uma alma refeita, eu posso dizer, um novo Rei!

Todos se regozijaram.

– Meu trabalho está terminado! Ao pé da colina vocês vão encontrar... – falava a voz misteriosa, enquanto Willy o interrompeu.
– Espera aí! Está faltando uma coisa! – falou ele.
– Mas que coisa? Não era um bom final? Você estragou senhor Willy, o menestrel alegre! – disse a voz. – O que falta?
– O seu nome! Como é o seu nome? Quem é você? Nós precisamos saber! – disse ele.
Houve uma pausa caótica e a voz misteriosa gaguejou. “É... Eu... Não...”. Então ouviram passou e depois um barulho de uma pessoa correndo desesperada.
– Olha só! Você o espantou! – disse Fill.
– Esse final nunca será um dos preferidos! – falou Agarius e se foram.

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⏰ Última atualização: Sep 23, 2018 ⏰

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