Capítulo 6

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Mais que palavras, silêncio!

Um vento aprazível lhes sopraram no rosto; pisaram no chão sólido com grande esforço; a atmosfera do ambiente se modificou e sentiram-se estranhos; no céu, apenas as inúmeras estrelas; eles as olhavam sem parar, pois seu brilho era muito bonito; a cor da aurora era creme claro; ao derredor haviam plantações atípicas, coloridas e incandescentes, na qual nunca viram no seu mundo; era parecido com um pomar de luz; não havia sol, nem lua, ao menos não àquela hora, “mas que hora?”, desconheciam o ciclo de tempo daquele lugar, mas acreditavam não haver alterações. O céu, ainda claro, mas as estrelas a enchiam em abundância, na qual confundiam se era noite ou dia, ou fim de dia e começo da noite, ou vice-versa; nada parecia mais fazer um sentido lógico desde que entraram na floresta calva; aquele dia pra Agarius seria mais complicado do que o pôde imaginar.
Continuaram caminhando por uma estrada larga; as plantações enchiam horizontes, um rio de flores descia para longe; a estrada começou a descer e subir os montículos; a frente, bem à frente, havia um grande monte numa alta sobrelevação e o caminho apenas tendia para lá.
A voz misteriosa desapareceu e nenhuma outra voz se ouvia; um silêncio aprazível e calmo. A comitiva apenas ficava olhando para o céu, para os horizontes intermináveis aos lados, entre muitas plantações coloridas e brilhantes. Apenas o vento soprava e uma melodia suave aos poucos foi aparecendo, tocando uma música emotiva; desconheciam o instrumento, mas alguns deles pensavam ser o som de uma harpa, mas o era mais aprazível aos ouvidos de todos e diferente de uma harpa ; desciam e subiam os pequenos montículos e seguiam como se estivessem enfeitiçados. O Menestrel sorria com a melodia e se emocionava; eram tantos sentimentos e emoções envolvidos que se sentiram dentro de um sonho lindo. Até mesmo o rei Agarius começava a se sentir tocado, mas parece que quando isso acontecia, ele fugia dos sentimentos e se encobria de suas defesas.
– Onde você está? – falou alto e todos o olharam. O silêncio aprazível se calou e as vozes da desesperança falou novamente.
– Para onde está nos levando? – falou de novo, Agarius.
– Psiu! O que está fazendo? – falou o Menestrel. – Não fale tão alto, senhor! – disse ele, num cochicho.
– E quem é você pra me dizer como falar! – disse o rei, rudemente. Então a melodia se findou e todos estranharam. Mas logo uma nova melodia começou a tocar; era mais rude e agressiva, com violentas pancadas graves e assustadoras, como se quem as tocassem, estivesse com furor.
– Veja o que o senhor fez! – disse o Menestrel, com as mãos nos ouvidos.
– De novo não! – falou o cocheiro, encolhendo-se sobre os joelhos.
– Eu não fiz nada! – disse Agarius em sua defesa.
– Errado! – falou a voz misteriosa, em tom de revolta.
– Pare com esse som, por favor! – estou amedrontado! – disse o copeiro, em súplica.
– O que eu fiz dessa vez? – disse Agarius se contorcendo de dores nos ouvidos.
– Silêncio! É pedir demais? – disse a voz misteriosa, agressivamente e uma última pancada numa nota grave foi dada, e ecoou por alguns segundos, até acabar.
Calaram de terror e choramingavam alguns, de tamanho medo. As mãos sobre o rosto do copeiro tentavam esconder o horror e o choro. Poucos segundos depois, outra vez a música retornou, mais suave.
– Subam aqui! – falou a voz misteriosa. Estava ao pé do monte alto; no topo surgia feixes de luz. Chegaram no alto e seus olhos amedrontados, desviavam-se para todos os lados. Então a voz misteriosa falou novamente.
– Meus amigos... não tenham medo! Por favor, me desculpem da forma como falei, mas estava em meditação, onde o silêncio é essencial e vocês me atrapalharam, em especial o rei! – disse a voz, mas nada disseram e Agarius titubeou o olhar. – O que estão achando do meu lar? – perguntou a voz, mas ainda temiam em falar. – Por que calam quando devem falar e falam quando devem calar? – perguntou-lhes. – Bom, já vi que temos muito a aprender. Podem falar agora. – disse a voz, mais uma vez suave, o que os davam mais segurança para se expressarem.
– Meu senhor, estamos confusos em sua... em sua presença! – disse o soldado, curvando a cabeça. – Não sabemos como falar, ou quando falar, até mesmo quando calar... nos ajude, meu senhor! – disse o soldado numa grande rogativa.
– Humm... isso amolece meu coração... sinceridade e pedido de ajuda! – disse a voz, suavemente. – É disso que gosto em você, meu amigo! Venham mais adiante! – chamou-os.
Então seguiram um pouco mais; o céu agora estava escuro, como a noite de seu mundo e as estrelas mais belas que o comum. Havia um precipício a frente deles; desceram, o cocheiro e Agarius da caleche, e o soldado desmontou do cavalo e foram caminhando para a borda do precipício. Mas não havia profundidade, nem o temor de uma grande queda.
– Eu sempre gosto desse lugar! É aqui que eu pratico a arte de silenciar. Aqui, as palavras não fazem mais sentido e o silêncio se torna o som mais louvável que se pode ouvir! – disse a voz, enquanto se aproximavam.
Admiraram-se ao chegar na borda; não havia fundo; a baixo, um planeta numa exposição surreal e peculiar; tinha um tamanho absurdo; podiam ver sua superfície numa visão ampliada; oceanos, terra firme, lençóis de nuvens alvas, uma grande porção de verde e azul, separados; era como estar em cima do planeta terra, numa capsula de vidro espacial; olharam para frente e ali haviam muitas estrelas e uma nebulosa como um olho profundo abastecia uma grande parte com várias manchas coloridas dentro dela; era como se estivessem vendo o universo, e estavam de fato; algumas estrelas cortavam a imensidão estrelada, cometas seguindo para muito distante, luzes piscando numa infinidade de cores; a comitiva não se deteve e todos começaram a se sentar; um coral celestial começou a cantar bem suave e todos ficaram tenácil naquela visão.
– Que... incrível! – disse o copeiro, baixinho, quase inaudível.
– Isso, antes de silenciar, antes de toda meditação, há uma preparação; preparação para que a experiência não seja qualquer, para que não seja mais uma; é diferente de estar com alguém que gostamos; se já é bom estar com alguém que gostamos, imaginem consigo mesmo. Por que se não estivermos bem conosco, se não nos aceitarmos em nós mesmos, como poderemos aceitar o outro? Se não conseguimos nos perdoar, como perdoaremos o outro? Por que conhecer-se é melhor e mais proveitoso que conhecer a outra pessoa; por que a outra pessoa se vai, mas você fica consigo mesmo; a outra pessoa vai te deixar, mas você nunca poderá se abandonar; nós estamos fadados a nós mesmos, então que estejamos fadados ao nosso melhor. Sim, é no silêncio que nos encontramos, por que a boca fala do que está cheio o coração e o coração pode nos enganar agora, mas o silêncio dirá o que precisamos ouvir; falar sem pensar é falar sem ouvir o silêncio, e falar sem ouvir o silêncio é desmerecer a reflexão; por isso, mais que palavras, silêncio! – falou a voz suave; ninguém mais ousou mais falar, e pra quê se o silêncio estava falando coisas que precisavam ouvir?
O céu estrelado se movia suavemente, às luzes das estrelas encantavam até mesmo o rei Agarius; a nebulosa do olho profundo era como ver a riqueza de um lago claro e transparente. O tempo passou, não se sabe quanto, mas passou longo.
Ficaram ali até quando puderam e ficariam muito mais tempo se a voz misteriosa não tivesse cortado o silêncio de todos, na hora devida; mas acabaram e se levantaram com semblantes renovados; entraram tanto em contato consigo mesmo que no processo, até esqueceram quem estava ao lado. Mas algo incrível aconteceu depois daquilo; quando a comitiva se olhou, um sorriso belo nos rostos deles se viu e com tamanha sensibilidade e comoção, se abraçaram e o rei, de coração duro, chorou em silêncio.

Entremundos - O rei e o PrisioneiroOnde histórias criam vida. Descubra agora