Antes que as ondas levem embora

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Era realmente pior do que eu imaginava. Ela estava ali, sem roupas, pela segunda vez, apenas deitada no chuveiro. Aquele dia, algum ser divino estava testando minha paciência. Bato no vidro, sem graça, virando o rosto. 

-É... Celéstia?-

Ela levanta a cabeça, calmamente, me olhando.

-Ah, Jeon. Desculpa, acho que acabei pegando no sono.

-Sim. Por que não sai daí? Pode acabar ficando doente.-

-Sinto muito, eu não...-

-Não se desculpe. Apenas se vista. A noite está fria, então você devia usar o secador.-

-Usar o secador?-

-Sim, para não dormir de cabelos molhados. Pode acabar ficando resfriada ou pior.-

Ela se levanta, desliga o chuveiro e sai do box. Pingando ela me encara e sorri. Ela não se sente envergonhada? Numa situação assim? Talvez seja normal no lugar no qual ela vive. Mas que país ela vive? Com esses costumes tão estranhos, fica difícil de advinhar.

Me perco em pensamentos, até perceber que ela estava quase colocando as roupas sem sequer se secar. 

-Espera!-

Ela se assusta e derruba a camiseta que  a emprestei.

-Eu só...-

-Você deve se secar antes, com a toalha. Você geralmente toma banho dessa maneira?

-S-sim, eu... só coloco as roupas.- Ela diz sem graça

Acho que a assustei. Me sinto culpado. Porém, essa culpa vai embora quando vejo que ela só secou o corpo e se vestiu. Seus cabelos pingavam, deixando as roupas de algodão úmidas. Dou um longo suspiro e pego a toalha. Começo a passar em seu cabelo, levemente, com receio de machucá-la. Ela fecha seus olhos, aparentemente aproveitando o momento. 

-É macia- Ela diz, se referindo a toalha de algodão que eu passava com delicadeza em sua cabeça.

-Eu também acho. Está gostoso?- Digo dando um pequeno riso.

-Muito!- Ela diz empolgada, mas com uma certa leveza.

Pego o secador e começo a passar pelo seu longo cabelo. Parecia que levariam horas para conseguir terminar de secá-lo. Após alguns longos minutos, desligo o secador. Estava seco, mas antes de tudo estava mais macio do que o normal. Seu cabelo parecia como uma pluma, o que me fazia hesitar em parar de tocá-lo. 

Mesmo relutante, solto seu cabelo. A levo para fora do banheiro. Indico o colchão, forrado com lençóis de seda e algumas cobertas, que estava alocado no meu quarto. Não poderia deixá-la na sala. Ela era, ainda assim, uma estranha. Não a conhecia direito, então não poderia dar liberdade para que fizesse o que bem quisesse.

Assim que ela se acomoda, entro no banheiro e começo meu banho. Um banho rápido era o que eu precisava para tirar o suor e o sal do meu corpo. Após me vestir, volto ao meu quarto. Ela dormia, de forma inocente, como uma garota que se incomodaria de ser vista nua. Não demoro a fazer o mesmo. Adormeço.

_Celéstia_

Acordo com um cheiro maravilhoso. Ele invadia todos os comodos da casa. Jeon, que antes estava ao meu lado em um colchão extremamente alto, havia sumido. Decido seguir aquele odor e, ao chegar no andar de baixo, o vejo em frente ao fogo, com uma espécie de concha de metal, balançando-a de forma brusca em movimentos de vai e vem. Aquilo era assustador e fascinante ao mesmo tempo. Volto a mim quando ele se vira a mim e diz.

-Celéstia, você acordou. Venha, eu fiz café da manhã. Estou grelhando cavalinha.-

-Grelhando? O que é isso?-

-Ahn... Cavala?- Ele diz confuso.

Ele repete o nome do peixe. Me deixa confusa. Talvez ele não entendera o que eu havia acabado de dizer. Talvez...eu tenha dito algo estranho. 

-Eu amo Cavala- Digo sorrindo

-Você conhece o nome desse peixe por "cavala"?- Ele pergunta, ainda focado no fogo e na concha metálica.

-Sim- Afirmo enquanto balanço a cabeça.

Ele coloca outra concha em minha frente. Desta vez...de pérola? Ela era brilhante. Nunca havia visto objetos tão diferentes. O vejo comendo com o tridente de metal. Decido seguir seus movimentos e faço o mesmo. Pego o tridente de metal e o espeto no peixe, que estava duro e mais seco que o comum. Coloco-o na boca. Sinto arrependimento quando minha boca começa a pegar fogo.

-Cuidado! Está muito quente, acabei de fazê-lo. Está bem?- Ele diz me entregando outro objeto estranho. 

Continha água em seu interior. Talvez seja para apagar o fogo que havia começado em minha língua. Coloco a borda do objeto entre meus lábios e o viro devagar, para não derramá-lo. Assim que sinto minha língua menos ardente, o agradeço. 

-Não há de quê. Termine de comer, vou levá-la a um lugar que conheço- Ele diz tomando um copo com um líquido preto.

Termino tudo e o vejo tirando seus estranhos objetos da bancada de pedra. Faço o mesmo e tiro a concha, o tridente e o objeto de vidro que tinha água.

-Você aceita um suco?- Ele diz enquanto pega as estrelas do mar coloridas chamadas aqui de "frutas".

-É algo bom?- Pergunto semicerrando os olhos

-É sim- Ele diz num riso fofo.

Algo nele me deixava estranha. Toda vez que sorria, me vinha essa sensação. Não conseguia negar-lhe nada.

-Então, aceito- Digo sorrindo de volta.

Um tempo depois, ele começa a laminar as frutas. Bolas redondas com uma mistura de verde e laranja. Um líquido de cor alaranjada começa a escorrer em outra espécie de concha. Ele me entrega então, o recipiente que aprendi se chamar copo.

-Espero que goste- 

-Eu também- Digo encarando o objeto

-É realmente bom. Como se chama mesmo?-

-Suco de laranja.- Ele diz rindo com a mão em frente sua boca, como se tossisse.

Ele então começa a subir as escadas, anunciando que iria se vestir. Momentos depois, ele desce com outras vestimentas. Uma blusa preta, que cobri apenas parte de seus braços, calças também pretas folgadas mas apertando suas coxas e um cinto, segurando-as no lugar. Ele era diferente de todos os outros. Roupas escuras, diversas tatuagens, piercings em sua orelha. Uma visão diferente e bela ao mesmo tempo. A maioria das pessoas que tive a oportunidade de ver se vestiam com roupas estampadas e coloridas, extremamente curtas, chinelos ou sandálias e pareciam até se assustar pelo estilo do garoto. 

-Vamos?- Disse Jeon, ajeitando seu cinto.

-Sim- Digo sorrindo, sendo puxada de volta à realidade.

-Vamos de barco terrestre?-

-O que?!- Diz olhando para mim, incrédulo com minha pergunta.

Era aparente que não sabia o nome correto da coisa metálica que ele guarda na cabine ao lado de fora de sua casa. Era aparente, também, que eu havia dito algo estranho. Como me corrigir? 

-Vamos andar de barco?-

-Ah, não. Não iremos. Estou te levando para Waikiki.- Ele diz com um leve sorriso.

-Waikiki? Isso é um lugar?-

-Sim. Onde encontramos lojas, restaurantes, hotéis.- Ele diz de um jeito animado.

                        _Waikiki_

Em alguns minutos, chegamos num centro onde haviam diversas pessoas. Todas pareciam felizes enquanto carregavam grandes sacolas ou entravam em refinados restaurantes.

-Nós iremos nesta loja- Ele diz ao estacionar o carro em frente a um grande prédio.


Long time no SeaOnde histórias criam vida. Descubra agora