Sexta-feira, seis de outubro
O inverno em Nairn demorava a passar, toda a cidade estava coberta pela neve alva caída do céu cinzento característico da pequena cidade na Escócia. Enquanto a temperatura baixa não afetava os que estavam dentro de suas casas, as mulheres do clã wicca lutavam contra o frio enquanto recitavam o cântico de primavera no meio da floresta. A mesma canção era cantada pelas bruxas transformadas todos os anos. O que os céticos diziam ser obra da mudança de estações era simplesmente obra da deusa Diana, abençoando suas filhas com a chegada da época fértil.
Rhiannon observava da baía o ritual como se fosse a primeira vez. As palavras célticas rimadas, os mantos com as cores da magia das bruxas e a onda mística emanando de sua mãe que a emocionava todas às vezes. Como desejava ser poderosa assim, ser a escolhida de Diana não significava nada se seus poderes eram mais fracos que o de uma criança. Ao som da última batida no tambor o ritual se encerrou com a magia das 13 bruxas sendo enviada para os elementos e lentamente derretendo o inverno.
Ela sentiu a energia de seu clã sendo libertada no mesmo momento em que sua mãe a viu e sorriu carinhosamente. Ela era a única que ainda acreditava que Rhiannon era a escolhida pela deusa bruxa para guardar em si o controle dos sete elementos: sangue, água, terra, fogo, sol, lua e ar. Ao se aproximar da filha o manto branco que usava envolveu o corpo da filha como um abraço quente.
"Como se sente?" Mesmo com a voz angelical, Eileen não era capaz de sanar a insegurança da filha.
"Com a chegada da primavera ou com a transformação?"
"Ambas" Sua mãe respondeu enquanto a guiava em direção ao casebre das duas
"Eu não sei se consigo mãe. Faltam só sete dias e eu nem consigo invocar uma chama."
"Não se preocupe filha. Diana tem algo mais preparado para você"
Era sempre assim, palavras de conforto dizendo que Diana a havia escolhido e seus poderes se revelariam em algum momento, tudo acompanhado de um pequeno sorriso reconfortante. Mas Rhiannon já tinha dezoito anos, estava à beira do ritual de transformação e se sentia mais humana que bruxa.
Desde seu nascimento Rhiannon escutou sua mãe fazendo profecias sobre seus poderes quase inexistentes. Sempre tão esperançosa sobre a grandiosidade da magia da filha, Eileen nunca se preocupou se sua filha realmente tinha magia ou não. Mas a garota já desconfiava que nem bruxa era, todas as meninas de sua idade já dominavam algum elemento e a transformação felina já era não seria problema se elas dominassem a sua magia. Como iria se transformar na gata elementar sendo tão fraca? Nem mesmo os pedidos feitos a deusa lhe ajudaram a desenvolver sua habilidade com os elementos, seria um fracasso, estava certa disso. Tudo o que conseguia fazer era provocar algumas brisas ínfimas. Só houve uma vez em que sua magia agiu de forma tão poderosa que quase a destruiu e Rhiannon não queria ser atacada por um lobisomem toda vez que quisesse usar seus poderes.
Caminhando por entre as árvores congeladas e a grama coberta pela neve, as duas sentiram a brisa da primavera calmamente viajando pela floresta. Com a chegada da época da fertilidade era apenas questão de uma semana para a lua cheia e a transformação felina das novas bruxas do clã. O ritual selaria o pacto das bruxas com os elementos ligados à magia de cada uma e o corpo seria transformado no animal que guardava a energia mística da deusa, a gata. Cada magia era representada por uma cor na pelagem da gata e no manto da bruxa usado nos rituais. A cor branca já um pouco amarelada no manto da mãe não deixava Rhiannon esquecer que ela não só iluminava o caminho dos perdidos como também poderia lançar uma maldição lunar, se fosse realmente uma das escolhidas seu manto seria uma mistura de branco, amarelo e preto, assim como a pelagem de sua forma felina.
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Histórias de terror escritas por quem odeia terror
Cerita PendekQuatro contos de terror. Começos inofensivos e finais devastadores.