2º capítulo

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Por volta das seis e meia da manhã, Ben nos levou (eu, luana e luiza) de volta para a casa de minha avó. Isso porque eu estava praticamente dormindo no meio do gramado do campo de futebol. Pessoas normalmente ficam sociáveis e comunicativas depois de alguns goles.

Eu fico autista e totalmente anti-social. Certo, não totalmente, já que Ben me fez companhia a noite toda.

É ótimo conversar com ele. Por ser mais velho, seu papo é diferente dos que eu estou acostumada com leonardo, por exemplo. Ele tem uma visão mais ampla do futuro, leva as coisas um pouco mais a sério, diferente do restante de meus amigos.

Quando chegamos em casa, ele abriu a porta do carro para que eu descesse, me deu um beijo de boa noite e me pediu para sonhar com ele. Acho desnecessário pedir, já que obviamente eu sonharia.

Subimos a grade, pulamos na sacada, abri a janela que daria para o quarto.

Nós entramos dando risadas abafadas sobre nada, eu exclamava um 'shhh' o tempo todo.

"Calem a boca, minha avó pode acordar..." eu cochichei rindo, vendo luana tropeçar sobre seus próprios pés.

"Ela já está acordada" de repente a luz do quarto foi ligada, e ai percebi que minha avó estava sentada no sofá que ficava num canto do quarto.

"Onde você estava, mariana?" sua voz era visivelmente seca e grossa. As meninas me olhavam desesperadas e eu não sabia o que fazer. Minhas mãos começaram a tremer de nervosismo e eu pensava no que dizer.

"Nós... Nós ficamos com fome e resolvemos ir no Paddley Café comer alguma coisa..." falei a primeira coisa que veio a minha cabeça. A feição de minha avó me assustava, ela estava extremamente irritada.

"Não minta para mim, garotinha. As coisas podem ficar bem piores do que já estão! Pensa que não vi o carro dos souza's as deixando aqui?" sua voz já estava exaltada e eu dei um passo para trás, segurando a mão de minhas amigas, que tremiam igualmente a mim.

Sabíamos quais seriam as conseqüências se nossos pais soubessem que chegamos às seis da manha em casa, no carro de um garoto.

"Vovó, por favor..." eu involuntariamente comecei a chorar, pois sabia o que iria acontecer.

"Você me deixa sem escolhas, mariana. É minha responsabilidade cuidar de vocês, o que os pais de luiza e luana vão pensar de mim?" ela levantou bruscamente da cadeira. "Estou ligando para os pais de vocês agora." Eu e as garotas suspiramos desesperadas ao mesmo tempo, e luana apertou meu braço.

"Vó, por favor, não faça isso!" supliquei. Sabia que não adiantava nada do que eu dissesse, então poupei as palavras. A minha família (assim como a das meninas) era muito tradicional. Cheia de regras, assim como a maioria de nossa época. Se você não cumprisse as regras, você era punido. Simples assim. E assim foi feito. Minha avó ligou para nossos pais, que apareceram minutos depois em sua casa. Os pais de luana estavam visivelmente irritados e foram bruscos ao levar minha amiga para casa. Os de luiza pediram desculpa pela impertinência à minha avó, e sem uma palavra a levaram. Sabia que ela não sofreria tanto com as conseqüências, já que afinal, ela estava com o primo.

E eu? Bem, são nessas horas que desejei nunca ter nascido.

Meus pais chegaram em seu Mercury Convertible , e o primeiro a sair do carro foi meu pai. Ele estava com um robe azul escuro por cima de provavelmente um pijama. Seus cabelos grisalhos estavam penteados para trás, como sempre, e seu bigode preto se destacava em seu rosto sereno. Ele tinha um charuto em suas mãos, e assim que entrou no hall da casa de minha avó, minha mãe veio logo atrás, seus longos cabelos castanhos presos em um coque, e uma expressão vazia, mas seus olhos eram cheios de desgosto, isso era visível.

Já não me recordo as tantas vezes que fui punida por não cumpri-las.

Obrigada por ter ligado, Carmen" minha mãe se dirigiu à sogra, mas sem tirar seus olhos de mim. "Vamos para o escritório" ela desviou seu olhar e passou por mim, indo em direção à sala atrás de nós. Assim que meu pai e eu passamos pela porta, ela a fechou.

O escritório estava do mesmo jeito que meu avô deixara antes de falecer. Estantes gigantescas sem espaço por entre os livros. Uma janela de vidro enorme, como a do meu quarto, ficava a fundo, e uma mesa de madeira rústica se encontrava no centro. Meus pais se sentaram nas duas cadeiras em frente à mesa, e quando eu fiz menção de me sentar também:

"Você fica em pé" minha mãe disse friamente, e eu continuei onde estava. Não ousei olhar em seus olhos. "O que você pensa que está fazendo com a sua vida, mariana?"

"O que a senhora quer dizer com isso?" falei calmamente, ainda sem mudar a direção dos meus olhares.

"Voltando para casa às seis da manhã, trazida ainda por um garoto! Não me importa o fato de ser um dos filhos do senhor souza, o que pensa que falarão de você?" sua voz começava a ficar alterada.

Não me importa o que pensam...” continuei serena.

“Mas me importa! Não quero que achem que minha filha é uma vadia!” ela começava a gritar. Olhei boquiaberta para minha mãe, incrédula com o que dizia.

“Não exagere, Mary...” meu pai tirou o charuto para se pronunciar pela primeira vez.

“Não estou exagerando, John. É o que as pessoas pensam!” ela respondeu alterada, se virando para meu pai. Dirigiu-se a mim novamente. “Se você não se importa com a reputação sua e de sua família, alguém tem que se importar por você, mariana. Você está ficando sem limites! E minha casa não tem espaço para rebeldes...” ela se aproximou de mim, e apontou o dedo em minha direção.

“Quer dizer que vai me expulsar?” Perguntei cínica.

“Quer dizer que você vai ficar sem ver seus amigos inconseqüentes por um bom tempo. Incluindo luiza Amarante e luana Franco” ela respondeu entre dentes.

Você não pode fazer isso!” falei mais alterada que o normal.

“Sim, mariana, eu posso. E a menos que queria ficar sem seu carro, e sem vir à casa de sua avó por um bom tempo, acho melhor me obedecer” Mary continuou autoritária. Tive vontade de pular em seu pescoço, sem ligar pelo fato de que foi ela quem me deu a luz. Eu e minha mãe nunca fomos aquele exemplo de mães e filhas perfeitas dentro de quatro paredes, claro que em publico, ela como esposa de um dos donos da cidade, tinha que manter as aparências e fingir ser a mãe perfeita.

Sim, meu pai era um dos donos da cidade. Por ser dono da maior fabrica, a que inclusive mantinha a situação econômica e política estável dentro de Bolton. Então ele era um senhor de muito respeito, talvez era mais respeitado que o próprio prefeito. E eu, como filha pródiga dos poderosos da cidade, deveria me portar como tal. Deveria. Mas como nunca gostei de seguir padrões, minha mãe tentava de todos os meios me colocar na linha. Inutilmente, é claro.

Mary passou por mim elegante e superior, abrindo a porta do escritório, passando por minha avó e indo direto à saída da enorme casa.

Vamos, minha filha...” meu pai colocou uma mão em meus ombros, me fazendo acordar dos meus pensamentos revoltantes. Olhei-o decepcionada. Meu pai nunca dizia algo quando minha mãe me punia, ele simplesmente se calava e me olhava afundar.

Ele deu de ombros e me guiou até a saída da casa, onde minha avó nos esperava.

“Boa noite, mamãe” ele deu um beijo na testa de sua mãe e saiu. Eu não me despedi, apenas olhei-a com o mesmo olhar que lancei a meu pai, e ela retribuiu como se pedisse desculpas. Tarde demais.

O caminho até a minha casa foi silencioso. Havia uma maré de repulsa entre mim e minha mãe. Eu estava com minha cabeça encostada no vidro gélido da parte traseira do carro, e o via embaçar de acordo com a minha respiração.

Assim que passamos pelo portão de bronze gigante e pelo jardim de extensão interminável, meu pai parou o carro em frente à nossa casa e entregou a chave ao motorista, para que ele o estacionasse na garagem.

Subi os degraus de pedra correndo, abrindo ferozmente as portas desenhadas de madeira, que dava lugar a um hall maior que o da minha avó.

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⏰ Última atualização: Aug 08, 2014 ⏰

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