Meu Pastor

prólogo

E lá estava ele, nos olhando ensaiar a dança que iríamos apresentar no domingo. Sentado em uma das poltronas localizada no meio da igreja, o homem direcionava seu olhar azul encantador aos movimentos da coreografia.

Aparentemente, com 1,80 de altura. Seu corpo bronzeado me arrancava suspiros. Quase conseguia ouvir seus braços fortes me chamarem, me seduzirem. Estava sempre vestido sensualmente com roupas sociais, que o deixavam ainda mais atraente.

O que ninguém sabia, era que sua atenção estava fixada somente em mim. Queria que fosse coisa da minha cabeça, todavia, Elton realmente me desejava.

Meu nome é Rafael, óbvio que me chamam de Rafa. Tenho 17 anos. Meu cabelo está sempre bagunçado. Peguei os olhos verdes de meu pai. Sou alto e magro, muito magro, tipo, muito magro mesmo.

Desde meus três anos de idade, sou forçado pela minha mãe a frequentar a igreja evangélica mais conhecida da cidade onde moro, a Igreja Universo do Templo de Deus.

Segundo ela, os ensinamentos bíblicos e a igreja vão me ajudar para que eu não seja futuramente como meu pai. Temos o mesmo nome, altura, tonalidade de pele e olhares penetrantes. A única coisa diferente, é que seus olhos estão sempre banhados de vermelho, acredito que seja por conta de seu vício em bebida alcoólica. Meu pai é um daqueles bêbados chorões que sempre acabam se envolvendo com várias mulheres e se metendo em confusão. As vezes, dorme em bares ou nas ruas e nem parece se importar com isso.

O pior de tudo, é que parece que ele não quer mudar seu "estilo de vida". Isso nos afastou tanto. Continua morando próximo mas quase nunca o vejo, nem o visito, sou recompensado da mesma forma. Mas o respeito muito, o respeito tanto que chego a confundir respeito com amor. E se consideram respeito como uma forma de amar, então, o amo, mesmo com todos os seus defeitos.

A igreja Universo é um local alto. Dentro, estão fixadas no chão aproximadamente quinhentas poltronas para os fiéis. Tanto por fora, quanto por dentro, o lugar é pintado por cores claras, onde prevalece o branco, amarelo e marrom. Seu edifício de dois andares, parecido como um grande galpão, se destaca em meio aos outros prédios e casas baixas de cores escuras.

Um lugar convidativo, que carrega em suas paredes altas, um ar pesado e sombrio. Os muros parecem guarda segredos e esconder mais pecados do que uma boate barata.

Dona Glória, minha mãe, é uma mulher rigorosa. Seu cabelo curto e loiro é sua marca. Olhos castanhos, vivos e atentos. Dona de uma voz forte, firme. Controladora ao ponto de querer ditar até minhas roupas. Perde a postura quando percebe que seu poder em minha vida está enfraquecendo.

Ela sempre conseguiu manter as aparências, até mesmo quando Edi, meu irmão mais velho, foi preso por roubo.

Era desnecessário seu envolvimento com tal crime, ela nunca negou absolutamente nada, era inegável pois todos em todos os lugares já sabiam que o filho da crentizinha estava sendo preso em flagrante. Entretanto, Edi deixou seus estudos e se deixou levar por suas ambições e pessoas erradas, embarcou nessa vida complicada. Espero que algum dia ele evolua e se transforme numa pessoa melhor e que não seja mais como antes ou hoje.

Dona Glória, sentindo-se envergonhada, buscou a melhor desculpa para que pudesse falar em qualquer papo furado com suas colegas da Universo, passou a dizer que a prisão de Edi era apenas uma provação de Deus e que tudo era para ela provar que é digna da vida eterna no Reino dos Céus. Muito convincente, não é?

Nesse período, parei para refletir e tive uma conclusão; melhor frequentar desnecessariamente uma igreja hipócrita, ao passar dias trancado em um cômodo frio, sozinho, sem mais escolhas.

É um pesadelo para mim me imaginar em um futuro sem minha sonhada liberdade. O meu triste presente será meu passado, e meu futuro será livre.

Todavia, para ela, era melhor um filho heterossexual preso por roubar sem necessidade, do que um filho homossexual estudante. Seria um terrível escândalo ter uma pessoa na família como motivo de piada na vizinhança.