Capítulo 8 - Pedido

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Assim que Suellen retornou dramaticamente para dentro da Universo correndo sem querer falar com mais ninguém, como eu teria feito, Elton foi buscar as chaves de seu carro para ir me deixar em casa.

Foi uma situação incontrolável. Aquele dia estava pesado para todas as pessoas ali presente. E eu só me toquei que o maior monstro ainda não havia enfrentado, minha mãe.

Dentro do carro, conseguia respirar, o impossível era controlar o corpo para que ele parasse de tremer. Sentíamos a tensão predominando pelo ar durante todo o caminho. Quebrar o silêncio estava em suas mãos.

- O que dirá à Suellen quando voltar a ver?

- Nada. - respondi.

- Nem dará o trabalho de pedir desculpas?

- Se não a traí por quê eu deveria me desculpar?

O silêncio retornou como uma música triste que te espanca mentalmente até que caia ao choro em meio a lembranças e ao tempo que você sabe que jamais retornará.

Foram mais ou menos cinco minutos de silêncio, até que estacionou, soltou o cinto de segurança e me olhou seriamente.

- Esse é o pior momento para se falar qualquer coisa. Hoje é um dos ou, senão, o pior dia da sua vida, isso é inegável. Entretanto, se tanta coisa ruim está te acontecendo, é porque você se recusa a amadurecer e usar tudo isso para crescer, Rafa. - após uma mera pausa, continuou - Acha mesmo que no auge dos seus trinta anos alguém dará a mesma atenção que eu ou outros membros da igreja estão te dando nesse momento difícil?!

- Aonde quer chegar com todo esse papo?

- Cara, ao mesmo tempo que está chateado com essas coisas ruins que está lidando, você parece muito a vontade em se expressar dessa maneira de adolescente rebelde revoltado porque sabe que nada vai te acontecer...

- E nada acontece mesmo, não vejo nada se resolver. - o interrompo.

- Quando você se encontrar de verdade, saberá do que estou falando, enquanto isso, tudo o que tô te falando agora é perca de tempo. Vou te deixar em casa e outro dia nos falamos.

Em nenhum momento ele falou sobre minha sexualidade, ele não me julgou. E toda aquela preocupação que estava demonstrando comigo o deixava ainda mais irresistível.

Ele colocou seu cinto de segurança novamente e antes que ligasse o carro, virei seu rosto rapidamente e o beijei.

Talvez fosse a carência, a necessidade de ter um conforto, que esse desejo estranho tenha surgido. Deixar essa vontade passar seria um crime. Do nada, a coragem me ascendeu e não hesitei.

Elton, me afastou e em seguida voltou a me beijar. Aquilo sim me surpreendeu.

Senti seus pelinhos da barba me arranhar levemente enquanto nossos lábios ainda estavam conectados. Sua boca com gosto de menta, era deliciosa. Beijo molhado, excitante e sem pudor, como nunca havia provado. Porém, é como dizem, tudo que é bom, dura pouco, e foi o que nos aconteceu.

Me afastou de seu rosto. Um pouco desconfortável, voltei para o meu lugar.

- Isso é errado. - Elton afirmou um pouco ansioso ligando seu carro - Espero que nunca mais volte a fazer isso, Rafa.

Fiquei na minha. Entretanto, aquilo me deixou tão mais leve, mesmo após a bronca.

O pastor me deixou na porta de casa, ou melhor, na porta do condomínio, e retornou para Universo, já que ainda eram sete e meia da noite.

Estava consciente de que apenas Edi estivesse em casa, e minha mãe na Universo. Eu não a vi em nenhum momento. Acredito que tenhamos nos desencontrado.

Enfim, fui arrancado a força do armário, o que espero é ser abraçado por minha mãe. Ela é a pessoa que mais amo nesse mundo e seu apoio faria minha vida tão mais feliz e alegre. O que me assusta é conhecê-la bem, sei de seu lado mais carrasco, e isso pode nos presentear muitas brigas.

Finalmente entro em casa, nunca me senti tão aliviado por entrar naquele apartamento como nesse dia. Até que Edi saiu do quarto e veio seriamente até mim, na real, me parecia mais resiliênte.

- Me falaram o que aconteceu hoje. Você tá bem? - perguntou.

- Tô melhor, obrigado.

- Bom, vou ta aqui pra qualquer coisa. Tá certo?

- Certo. Valeu.

Edi sempre foi debochado. Apenas essas duas frases inesperadas foram precisas para que meu olhar sobre ele mudasse um pouco.

O que fez comigo quando mais novo é praticamente imperdoável, entretanto, apenas essa ação me fez repensar sobre o assunto.

Agora mais leve. Peguei meu celular e tentei ligar para Suellen para me desculpar, percebi que era necessário. Não atendeu.

Liguei para Rud com a mesma intenção. Fui um imbecil ao achar que ele faria algo de ruim comigo quando ele só quis estar ao meu lado. Atendeu, mas desligou ao reconhecer minha voz, o que é compreensível.

Ansiedade começou a atacar quando o relógio se aproximava das nove horas da noite, afinal, era esse horário que o culto acabava, e minha mãe chega às nove e meia.

Me sentei no sofá da sala sozinho a esperar. Criei toda uma estratégia para iniciar a nossa conversa. Uma situação incomum, pedia uma papo incomum entre nós.

Então, ela chegou.

Dona Glória, com uma cara furiosa, me encontrou sentado a sua espera no sofá da sala.

- O que tá fazendo aqui? - perguntou.

Eu sem entender o porquê da pergunta respondi.

- Como assim?

Ela colocou sua bolsa em cima da mesa que estava próxima.

- Saia da minha casa agora! - gritou. - Achou mesmo que depois dessa pouca vergonha que me fez passar na frente de todo mundo, ainda continuaria morando debaixo do meu teto?! Achou errado! Pega suas tralhas e saia da minha casa! A partir de hoje você não mora mais aqui! E nem por um momento volte a me chamar de mãe! Esqueça que te pari, menino ingrato!

Me levantei e fui ao meu quarto para pegar tudo o que podia para levar comigo. E lá de dentro ouvia tudo o que continuava gritando.

- Vou sair e quando voltar não quero te encontrar aqui!

Agora sim, chorei como um bebê faminto. Enquanto eu enchia a mochila de qualquer coisa que me pertencia e que via pela frente, Edi me entregou um papel rasgado.

- Pega, liga pra esse número aqui ao sair. Eu não posso ir contigo mas essa pessoa vai te ajudar a encontrar um emprego e um lugar pra ficar por um tempo.

Recebi o papelzinho e agradeci em meio ao choro. Saí pela porta do condomínio envergonhado por tal humilhação.

Sem uma moeda no bolso, sem nem saber por qual rua andar, parei numa calçada numa rua deserta e me deitei ao chão enquanto chorava a soluçar.

Peguei meu celular, no qual esqueci o carregador, e liguei para esse tal número, e ele tinha escrito o nome da pessoa que poderia me ajudar.

- Alô, é o Carlos? - pergunto ao atender.

- Sim, sou eu. Quem fala?

- Meu nome é Rafael, sou irmão do Edi, ele me disse que você poderia me ajudar.

- E o que você precisa no momento?

- De um lar.

Meu PastorOnde histórias criam vida. Descubra agora