Introdução ao amor

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Otávio estava sentado à mesa da casa de Luccino (que também era dele) comendo rapidamente um pão com café. Não estava de todo atrasado, pelo contrário, estava bastante adiantado, mas por alguma razão ele ansiava por completar o desjejum. Luccino ainda dormia, portanto não tinha como lhe perguntar o porquê da pressa. Como se respondesse o amado mentalmente, Otávio disse quase sussurrando:

- Quanto mais cedo eu chegar ao quartel mais cedo eu posso começar a te escrever a nossa história. -

Levantou-se e passou lentamente pela porta que ligava as duas casas. Agora estava em sua casa e admirava Luccino dormindo em sua cama. Se aproximou sutilmente e beijou suavemente seus lábios, tão suavemente que ele sequer acordou. Saiu de casa e começou a caminhar em direção ao quartel.

Em alguns dias comemoraria um ano de avizinhamento com Luccino. Um ano de enlace, pelo que lhe disse Mariana uma vez, corresponde às bodas de papel. Pensando nisso, Otávio decidiu que seu presente para Luccino seria uma série de cartas. Já havia adiado o início da escrita tempo demais. Se ele não começasse hoje, não haveriam cartas para entregar ao amado vizinho.

Entrou no quartel uma hora antes do previsto, cumprimentando os soldados que faziam a guarda da madrugada. Entrou no gabinete que estava completamente escuro, já que o sol ainda não havia raiado. Acendeu as luzes da mesa e observou a caneta, pousada pacificamente ao lado do tinteiro que alguém havia esquecido aberto. Tirou então do bolso da farda azul alguns papéis, já que não queria gastar papéis do exército em um capricho pessoal. Mergulhou a caneta no tinteiro e começou a escrever aquelas palavras que tamborilavam em sua mente durante o caminho. As palavras se formaram com dificuldade, já que ele apenas escrevera cartas oficiais e cartas para amigos, e nunca eram tão longas e tão emotivas, mas mesmo assim se entregou ao sentimento e o sentimento se entregou às palavras. A primeira carta ficou mais ou menos assim:

"O que é a batalha do amor senão uma batalha de esgrima? Quando você chega à certo ponto de desconfiança quanto a si mesmo e quanto aos outros em relação à você mesmo, você não mais passa a enlaçar este sentimento, pelo contrário, passa a batalhar tanto contra ele quanto com ele, esse último, talvez, para mostrar que você ainda está vivo amorosamente. Mas, mesmo assim, gostando ou não gostando de seu adversário, a batalha só termina quando um dos lados acerta o coração do outro. As vezes nem floretes são necessários para se travar a batalha. Um olhar de paz em meio ao pânico, o seu por exemplo, pode ser o tal florete. Os olhares, mesmo que por meio segundo, travam a luta, o mais habilidoso ganha. Você luta de forma mais ofensiva, me ataca sem me atacar, me invade sem me invadir... tento me defender, a espada tenta bloquear o teu olhar, ou o efeito dele, mas é inútil. Sou vencido, o florete me atingiu o coração e a sensação é confusa, porém linda." 

Releu. Não gostou da própria letra, mas também sabia que não conseguiria escrever o que escreveu uma segunda vez, então optou por simplesmente guardar a carta numa gaveta da mesa. Trancou a gaveta e guardou a chave. Afinal, os sentimentos nela colocados eram da conta apenas do dono de seu coração.

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Quando os primeiros raios de sol começaram a aparecer, Luccino acordou. Levantou-se vagarosamente e lavou seu rosto para ver se acordava.

Passou pela porta de ligação e entrou em sua casa para poder comer, já que a casa de Otávio tinha apenas a cama do casal, o acesso para o banheiro e o armário no qual ficavam as roupas do casal, enquanto sua casa tinha os armários para louças, o fogão, um sofá, a mesa para refeições, além da pia para lavar louças.

Sobre a mesa estava um bilhete escrito por Otávio antes de sair, dizendo que ele teria de sair mais cedo. Enquanto comia, Luccino pensava no dia que se aproximava: O primeiro aniversário de casal de sua vida. Queria presentear Otávio com alguma coisa, já que nunca o havia presenteado com algo antes, além de sua companhia, é claro. Não sabia exatamente o porquê, mas sentira um ímpeto de escrever, como já fizera Elisabeta um ano antes (Tirando a parte de publicar e vender) e decidiu que seu(s) presente(s) seria(m) algumas cartas. 

Pegou numa gaveta, então, alguns papéis que ele havia comprado sob a desculpa de escrever cartas para Mariana e Brandão, que estavam em viagem para o litoral. Alguns rascunhos já haviam sido queimados, rascunhos não tão ruins, mas que não representavam a força do que ele queria escrever.

As palavras fluíram rapidamente. Quando a carta foi completa, Luccino olhou orgulhoso o papel. Levou, então, o papel com as palavras para o quarto e sentou em uma cadeira que havia no canto, olhando para a cama esperando a tinta secar. Quando a tinta secou, leu em voz alta para a cama, como se estivesse lendo para Otávio:

"O que é o enlace do amor senão o enlace de um choque elétrico? Ele (o choque ou o amor) nos vê, mas não nos pergunta se queremos ser enlaçados, ou se estamos prontos para recebê-lo. Como quando eu consertei a fiação das luzes que havia falhado na casa dos meus pais. Agarrei-me acidentalmente à um cabo desencapado e fui tomado por uma onda elétrica intensa (também conhecida como choque). O mesmo choque que eu senti quando teu braço encostou no meu, quando teu olhar cruzou com o meu, quando tua essência me envolveu pela primeira vez. E na segunda. E na terceira. E assim por diante. A diferença é que esse choque não me faz querer arrancar minha mão desesperadamente. Pelo contrário. Minha mão, tal qual o resto do meu corpo, anseiam por esse choque."

Completa a leitura, Luccino começou a se arrumar para ir à oficina. De roupas trocadas, ele levantou uma tábua do chão e escondeu a carta no pequeno vão. A madeira voltou com dificuldade, mas Otávio só veria alguma anormalidade caso estivesse procurando alguma anormalidade. Já ia saindo quando percebeu que havia esquecido de duas coisas: sua boina e sua aliança (na verdade a aliança da mãe de Otávio [que agora era sua aliança]). 

Pegou a boina que estava sobre o criado-mudo ao lado da cama e colocou em sua cabeça. O cordão com a aliança estava debaixo da boina. Manipulou, então, aquele anel e já começou a ter algumas ideias do que poderiam ser suas próximas cartas, mas as armazenou em um canto da mente. Se escrevesse tudo que havia pensado nesse instante, não haveria sequência lógica nos acontecimentos. 


A tensão de primeira fanfic (no caso essa é a primeira fanfic da minha vida) tá batendo forte. Mas ta aí. Espero que gostem e eu espero conseguir terminar/continuar. Até mais.

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