The Black Dove

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[Cara]

"Vão em paz e que o Senhor os acompanhe!" Disse o padre, seguido pelo coral cantando uma das poucas musicas de seu repertório.

Finalmente. Não aguentava mais nem um minuto naquela igreja.

Ao primeiro acorde do violão que tocava a música final, peguei meu celular. Tinha uma mensagem de Harry. Respondi rapidamente.

Cara (20:33)

Desculpa... A missa acabou agora... Te encontro lá daqui a pouco x

Assim que apertei o botão para enviar, meu pai me cutucou.

"Cara, você está na casa do Senhor. Guarde esse celular." Ele disse rígido, porém não aparentava estar bravo. Quando meu pai está bravo, é impossível não notar. Ele faz questão de fazer uma cena até todos notarem.

Pensei em responder algo como mas a missa já acabou. Porém, isso causaria uma discussão e todos que já entraram em uma discussão com meu pai, perderam.

Para evitar repreensões, apenas guardei o celular.

"Filha, eu quero te apresentar um rapaz." Meu pai se dirigiu a mim novamente após eu obedecer sua ordem.

Não, não, não. Meu pai tem a terrível mania de me apresentar a garotos da igreja. Toda semana ele me introduz a um e espera que tenhamos uma relação baseada nos pilares do catolicismo. O problema é que todos são alienados e fanáticos religiosos - exatamente iguais ao meu pai. Além do mais, eu já tenho Harry. Nosso relacionamento ainda é segredo para nossos pais. O pai dele quer uma menina rica e meu pai quer um menino que seja praticamente um padre. Eu estou longe de ser rica e Harry mais ainda de ser religioso.

"Prazer, meu nome é Chris." O garoto à minha frente iniciou, estendendo a mão. Ele carregava um crucifixo no peito e um violão nas costas. Nunca tinha o reparado no coral.

"Cara." Respondi com um aperto de mão e um sorriso meio torto.

"Filha, Chris quer ser padre e antes de ir para o Seminário, vai participar de um acampamento vocacional aqui perto." Meu pai disse e eu foquei meu olhar nele, um pouco sem graça com o garoto à minha frente.

"...E sua presença seria muito importante lá!" Chris concluiu, como se tivesse ensaiado o discurso com meu pai.

Chacoalhei a cabeça, sem conseguir associar direito o que estava acontecendo. "Perdão, mas o que é um acampamento vocacional?"

"São quatro dias de palestras e orações, onde você pede ajuda divina para saber se tem vocação para algum tipo de trabalho na Igreja." O garoto concluiu, com o mesmo sorriso no rosto.

Oh meu Deus. Meu pai quer que eu seja uma freira. Inacreditável. Absolutamente inacreditável. Nem em meus sonhos mais loucos eu seria uma freira. Vendo pelo lado mais positivo, pelo menos Chris não era mais um pretendente à meu namorado. Mas... Freira?

"Pai... Eu não acho que seria uma boa freira..." Olhei para ele e disse, tomando cuidado com as palavras para não ofender a ele nem ao garoto.

"Era exatamente assim que eu pensava sobre me tornar padre!" Chris me cortou, irradiante.

Obrigada Chris! Isso é definitivamente o que meu pai precisava ouvir!

Sorri torto.

"Viu, minha filha! Tenho certeza que será bom para você!" Meu pai sorriu. Por alguns segundos pensei na possibilidade de ter sido trocada na maternidade. Provavelmente Chris é filho do meu pai.

O celular em meu bolso não parava de vibrar. Harry provavelmente tinha se metido em mais um de seus problemas.

"Tá bom, pai... Eu vou nesse acampamento." Concordei hesitante, só para poder ir embora rápido. Queria muito ver Harry.

"Tenho certeza que não vai se arrepender!" Chris sorriu, seguido por meu pai.

"Eu também!" disse, caminhando para fora da igreja e sorrindo, não pelo acampamento, mas porque estava prestes a ver meu lindo.

Corri para onde Harry tinha marcado comigo. Literalmente corri. Quase fui atropelada duas vezes, mas não parei de correr. Harry é o único que me entende. É um desabafo o simples fato de estar com ele.

Cheguei ao Hyde Park. Felizmente a igreja ficava a poucos quarteirões de lá e dava pra ir a pé tranquilamente. O parque estava lindo. Os postes iluminavam as muitas árvores do lugar mais verde da cidade. As fontes ligadas criavam um clima de serenidade no lugar. E à beira de uma fonte, Harry. Sentado na borda, deslizando seu dedo suavemente na água. Ele parecia chateado, pensativo. Aproximei-me dele lentamente.

"Ei... Você ta bem?" Perguntei delicadamente.

Ele levantou a cabeça e sorriu levemente ao notar minha presença. Depois acenou para que eu me sentasse ao seu lado. Seus lábios tocaram os meus em um sutil beijo e só então ele me respondeu. "Não. Meu pai quer ser primeiro ministro. E você?"

Ele já me falou sobre o quanto seu pai é corrupto e o ódio que tem dele. Não entendo direito como funciona essa coisa de ações e blá blá blá, mas acho que Harry tem razão. "Nossa... De repente meu problema ficou tão pequeno..." Respondi. Harry sorriu.

"Outro pretendente?" Ele perguntou, revirando os olhos e apoiando minha cabeça em seu peito.

"Não. Agora ele quer que eu seja uma freira." Disse, me aconchegando e acariciando a mão de Harry.

"A gente devia ser livre pra fazer qualquer coisa! Qual é o sentido da vida?!" Harry disse, indignado.

"Também não sei... Se descobrir me fala..." Respondi, suspirando e fechando os olhos, considerando dormir ali mesmo e esperando que talvez Harry descobrisse qual o sentido da vida.

Eu realmente preciso de um sentido.

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