Prólogo

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31/10/1997

23h52min

Vernum

Os gritos de Ceridwen ecoavam no meio da noite, impedindo que qualquer pessoa pudesse dormir em paz. Quem poderia descansar, afinal, quando um novo membro da família estava prestes a nascer com o destino traçado em direção ao inferno?

Mais uma morte durante o dia e um nascimento durante a noite.

Findaram-se os tempos em que nascer um Madsdatter era um privilégio e isso preocupava Octavius que, no corredor, perambulava de um lado para o outro com as mãos na cabeça, sentindo-se egoísta por não comemorar o nascimento de seu herdeiro.

Era uma noite de celebrações na cidade, o dia inteiro de preparações para a segunda festa anual.

A data tornava-se mais especial por um fenômeno chamado lua negra, a lua que nasce nos últimos três dias da fase minguante, deixando o céu totalmente escuro.

Em compensação, a cidade estava toda coberta por luzes, enfeites e pessoas fantasiadas por todos os lugares. Inclusive naqueles locais onde em um dia normal, ninguém ousaria pôr os pés.

No final da tarde, ocorriam as cerimônias conduzidas pelo padre, seguidas pelo discurso do prefeito que reiterava o compromisso com a ordem social, econômica e ambiental.

As crianças corriam de um lado para o outro, comiam doces de graça e aproveitavam os brinquedos de acordo com cada idade, estes que ficavam disponíveis até ao entardecer. Para os adultos, a noite era apenas o começo da diversão.

Para Octavius, a diversão tinha acabado no momento em que sua esposa o agarrou no meio da cidade, dizendo que o bebê iria nascer. E agora lá estava ele, vestindo uma fantasia ridícula e totalmente pego pelo aborrecimento e preocupação, enquanto esperava seu primeiro filho.

O patriarca desabotoou a capa negra que estava lhe sufocando, permitindo que ela caísse e ficasse lá como um pano de chão para qualquer um escorregar. Passou a mão pela boca tirando a tinta vermelha que o fazia parecer um vampiro. Mas o que mais o irritava eram as unhas afiadas como garras, Ceridwen tinha lhe dito que iria tirá-las quando voltassem do centro da cidade, mas naquele momento, seria impossível de fazer.

A porta do quarto foi aberta, permitindo que os gritos chegassem até os ouvidos de Octavius, mais altos e perturbadores. Os berros se tornaram um empecilho para continuar seus pensamentos melancólicos.

Jean fechou a porta imediatamente e escorou-se nela. Tirou o chapéu de pirata e bagunçou seus cabelos pretos, utilizando o tampão de olho como uma faixa ao redor da cabeça, separando sua franja do restante dos fios. Sua expressão mostrava que também estava cansado após um dia exaustivo ajudando nas decorações da cidade e consolando sua tia Sara que acabara de perder o marido. Os olhos negros do homem se abriam e fechavam lentamente, mas os manteve abertos o suficiente para fazer uma pergunta que julgava séria.

— O Drácula de Vernum* não vai entrar?

Octavius dobrou a perna direita, apoiando o pé na parede. Ele sabia que sua esposa precisava dele naquele momento, mas não tinha coragem o suficiente para ficar ao seu lado. Cruzou os braços, deixando seu polegar de apoio para o queixo enquanto encarava o irmão.

— Depois eu entro.

— Será que ele vai ter os olhos verdes iguais aos seus?

Não sabiam de fato o sexo do bebê, mas conforme o ultrassom, um menino estava prestes a se tornar o mais novo membro da família. Seu nome seria Brett Madsdatter, em homenagem ao avô materno da criança.

A Chave da Esperança (Em processo de revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora