Arrependimento

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"Me lembro daquele dia como se fosse ontem... por mais que eu tente apagar da minha memória a expressão, o local das feridas, seus cabelos bagunçados, e por fim suas lágrimas sôfregas.
Lágrimas que só se permitiram cair, quando pronunciei aquelas palavras... eu também choraria se dissessem aquilo à mim, devo admitir.

Passaram-se alguns anos, tentei procurar por essa pessoa, me desculpar, ou até... quem sabe... dizer como realmente me sinto. Mas não havia perdão pelo o que fiz, nem eu mesmo me perdôo. Então desisti, como um verdadeiro covarde faz."

Ato 2.

"Reencontro"

[...]

O dia estava realmente belo. Era primavera, final do ano letivo, e o período que as flores de cerejeira afloravam. A primavera é considerada um período muito feliz para os japoneses, porém, tudo o que eu conseguia sentir era um vazio.
Meu nome é Katsuki Bakugo, sou um estudante japonês de 16 anos, que acabou de se formar do primeiro ano do ensino médio.
Acordei com os raios solares invadindo a janela do meu quarto. Hoje era o último dia de aula da minha vida monótona e chata.

— Katsuki, seu vagabundo! Tira logo essa bunda da cama e venha comer! Hoje é dia de se despedir dos seus Senpais! — Minha mãe gritou de novo lá de baixo. "Mais que velha mais irritante!" Pensei, enquanto levantava da cama. De repente me deparo com umas folhas verdes na árvore de cerejeira. Talvez não tenham florescido ainda... Me veio à mente o rosto dele, as folhas verdes me lembraram seus cabelos e seu olhos esmeraldinos.

Desci as escadas. A única coisa que pensava era em como ele poderia estar neste momento. Será que estaria mais feliz? Espero que sim...
Me vejo perdido em meus pensamentos, quando percebo que estou derramando a xícara de café em minhas roupas. "Merda."

— O QUE DIABOS ESTÁ FAZENDO? Não derrame café em suas roupas como se eu fosse uma máquina de lavar ambulante! O que houve com você? Está meio estranho hoje... — Vociferou aquela velha. A única coisa que ela sabia fazer era gritar na minha orelha. Mas ela estava certa... eu devia deixar para lá essas coisas e me focar em mim mesmo, como sempre fiz aliás.

Subi e troquei minhas roupas. Desci em seguida para terminar meu café. Quando estava quase saindo de casa, minha mãe segurou meu braço.

— Filho, gostaria que você tentasse chegar mais cedo hoje, de preferência antes de escurecer, e tome muito cuidado enquanto anda. — O que? Porque ela estava falando aquilo, geralmente ela nem me manda um "itterashai*", será que ela estava com febre?

— Porque tanta preocupação, velha? — Ela desviou o olhar, sua expressão era de medo.

— Vi no noticiário que acharam o corpo de uma mulher aqui nas redondezas, completamente esfaqueado. Disseram que o assassino fez aquilo enquanto estava viva. E o mais estranho é que o filho dela desapareceu completamente, sem deixar vestígios, ou qualquer rastro. — Gelei com aquilo, não sabia o motivo. Era normal ocorrerem assassinatos hoje em dia, mas, esse em específico me deu calafrios.

— Não se preocupe, velha, tomarei cuidado. — Logo em seguida saí, e fui em direção ao metrô. Aquilo que minha mãe havia dito foi deveras, bem perturbador.
Me lembrei de novo daquela pessoa.
Merda.

Peguei meus fones de ouvido, e selecionei uma música para ouvir até chegar à escola. Comecei a refletir sobre algumas coisas, até que chegou naquela bem dita pessoa... mais que merda! Porque diabos ele não saía da minha cabeça?
O metrô então finalmente parou no ponto, e segui com meu caminho. Eu sinceramente não fazia a menor ideia do porquê de estar indo lá... eu não tinha amigos, e nem ninguém para me despedir.
Quando cheguei à escola, não pude deixar de notar as lindas flores de cerejeira que estavam caindo no chão, enquanto a cerimônia de formatura dos veteranos acontecia. Aquela cena era muito bonita, mas...

Eu não fazia parte daquilo.

Aqueles sorrisos e risadas, a alegria transbordando do rosto daquelas pessoas. Eu não sabia o que significava sentir aquela sensação, seria até um pouco repugnante pensar em mim, com aquele tipo de expressão.
Decidi dar meia volta, eu não me sentia bem lá. Talvez ficar zanzando por aí até dar a hora de voltar par casa.

Passaram-se alguns minutos, de repente, avistei um aglomerado de pessoas formando um círculo em volta de algo. "O que estava acontecendo?" Fui me aproximando daquelas pessoas para saber o que se passava. Notei um homem saindo de lá, com uma cara perturbada, então fui perguntar à ele:

— Ei, o que está acontecendo? — Ele então olhou para mim, sua cara era de medo, pavor. Comecei a ficar inquieto.

— E-Ele e-está... M-MORTO! — Me respondeu enquanto apontava para o círculo, e logo em seguida saiu correndo.
Quem estava morto? Me aproximei, e no momento em que vi, fiquei pálido. Quem poderia ter feito um negócio desses? Ali estava um garoto mais ou menos da minha idade, todo esfaqueado, ele havia morrido por falta de sangue.
Olhei um pouco mais de perto... aquele rosto me parecia um pouco familiar...
Depois de alguns segundos tentando me lembrar daquele rosto, acabei me recordando que esse era um dos garotos que começou a andar comigo quando eu tinha abandonado aquela pessoa...
Merda.

Saí correndo de lá com todas as minhas forças. Gritei bem alto; "VAI SE FODER!" Para eu mesmo.
Cheguei em casa todo suado e afobado, nem olhei para minha mãe, que me lançou um olhar confuso. Fui correndo para meu quarto e me tranquei lá.
Deitei em minha cama, e chorei bem baixinho, até pegar no sono.

[...]

— Kacchan, Kacchan! Você promete ser meu amigo para sempre? Promete? Diz que sim...

— Táá... eu prometo, Deku, mas com uma condição..!

— Qual?

— Você não pode ser amigo de mais ninguém além de mim!

— Kacchan, você é o único para mim!

[...]

Acordei num pulo. Acabei tendo um sonho de uma lembrança minha, uma lembrança que dói recordar. Olhei em volta do quarto, já estava tudo escuro. "Quanto tempo será que eu dormi?" A casa estava um silêncio, a única coisa que conseguia ouvir era o som da minha barriga roncando. Acho que eu precisava comer. Levantei de minha cama, e desci as escadas em direção à geladeira.

Quando cheguei à cozinha, vi que estava tudo escuro. Achei estranho, pois minha mãe sempre estava lá preparando o jantar, e gritando alguma besteira.
Dei de ombros, abri a geladeira e peguei uma maçã para quebrar o galho.
Enquanto comia, decidi pegar meu celular para perguntar onde minha mãe estava.
De repente escuto um estrondo muito alto lá no andar de cima. Fiquei assustado, subi para ver o que tinha acontecido.

Abri a porta do quarto da minha mãe. Ela estava deitada no chão aparentemente desmaiada.

— MÃE? MÃE, VOCÊ ESTÁ BEM? O QUE ACONTECEU??? FALA COMIGO! — Gritei desesperado. Peguei seu braço para ver se ela ainda tinha pulso. Posicionei meus dedos em seu pulso, consegui sentir as batidas. "Ufa..."
Levantei do chão e fui acender as luzes, e logo quando me virei, meu coração pulou. Fiquei tonto e cai no chão. Ainda não conseguia acreditar no que estava vendo... Lá estava aquela pessoa, parecia o mesmo ainda. Cheio de ataduras, roupas compridas, e cabelos bagunçados. A única diferença agora era sua altura, mas além disso, ele carregava uma faca e seu olhar era de dar medo.

— Boa noite Kacchan, gostaria de me mostrar seu lindo sangue?

[...]

Glossário:

Itterasahai*: No Japão, as pessoas que moram juntas dizem isso para a outra que está saindo de casa. Soa como um "Vá com cuidado"

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