Eduardo assistia ao nascer do sol com admiração. Sabia que logo teria que acordar seus irmãos, já que os dois iam acompanha-lo naquele ano. E assim a renda seria maior. Mesmo relutante, ele aceitou ir pela persistência das crianças. Eles tinham muito a almejar para o ano seguinte e a renda extra viria a calhar na situação em que se encontravam.
Havia feito uma lista mental de tudo que necessitavam e desejavam obter no ano que estava por vir. Em sua opinião, coisas simples. Apenas necessidades. Mas ainda assim, coisas que fariam uma grande diferença. Precisava de uma cama para Felipe, já que a sua havia sido transformada em poeira pelas traças e agora o garoto dormia em um monte de palha no chão. Necessitava de uma porta para o quarto de Ellen, pois a sua teve o mesmo destino fatídico por conta dos insetos devoradores de madeira. E precisava comprar uma mesa, a pouco tempo começou a sentir dores na coluna por comer no chão e na posição que comia.
Havia mais um item em sua lista de desejos. Um que ele considerava de extrema importância e que por isso colocava acima dos outros. Não deixar faltar comida para os irmãos. A fome era algo real naquele reino, ele mesmo já havia sentido as dores do estômago se enlaçando por comida. Não gostaria que o mesmo acontecesse com Ellen e Felipe.
Chamou as crianças, e tudo que ouviu foram os resmungos mal-humorados de Felipe, que mesmo em seus quinze anos de vida, odiava ser acordado. Ellen sempre fora mais fácil de acordar, e por isso logo estavam de partida.
Em frente aos portões do castelo o burburinho era todo voltado a uma pergunta: Será que o rei abriria os portões? Ao lado dos irmãos, Eduardo também se questionava, já que ainda não haviam encontrado a joia da coroa.
O rapaz também acreditava, que naquele momento, o rei pensava que todo seu povo fosse parte de uma corja de ladrões. Então estava convencido de que não haveria comemoração e muito menos casamento este ano. Pois, para o rei, nos pensamentos do jovem, o cidadão que encontrasse a joia, certamente a roubaria.
O suspiro enfadado do rapaz chama a atenção da irmã que apenas o encara, lhe dando apoio. O dinheiro que ganhariam como ajudantes no castelo seria a solução dos problemas por um período. Eduardo se sentia um inútil por não puder fazer nada para alterar a situação em que se encontravam. Tornara-se responsável pelos irmãos há muito tempo, com a morte da mãe, e mesmo agora em seus vinte anos não sabia como cuidar de suas crianças. Estava fazendo o seu melhor e mesmo assim...
Olharam novamente para as comportas de metal e ferro que separavam a plebe da nobreza. Aquele era exatamente o momento em que abririam os portões do castelo para o povo. E para a surpresa de todos foi exatamente o que aconteceu.
– Alguns de vocês serão separados em grupos, enquanto outros trabalharam sozinhos! – Disse o guarda que defendia os portões, fazendo um sinal para que a população o seguisse.
Já Dentro do castelo a voz grave do Rei ecoava, chegando ao ouvido de todos:
– Todos sabem o que aconteceu com a joia da coroa! Eu não espero de vocês, a capacidade de encontra-la – o rei urrava prepotentemente. – Mas saibam, que a pessoa que a encontrar e não a devolver sofrerá graves punições.
Após o tirano se retirar, imponente, todos os plebeus saíram para descobrir suas funções. Ellen estaria na cozinha com seu grupo. Felipe no salão, na equipe da decoração. E Eduardo sairia para o estabulo. Sozinho. Era comum pra ele, aquela função. Não houve problemas ao alimentar os cavalos, banha-los e escova-los.
– Estou cansado dessa vida. Estou farto de ver meu povo sendo tratado como lixo por meu pai. E mais cansado ainda de ver o povo roubar pra poder se alimentar! – Estava alimentando o terceiro cavalo quando ouviu a voz do príncipe, acompanhada de um suspiro. – Não quero ter que me casar com Adeline. Mas não há opções no momento. – Dizia a voz carregada de tristeza.
– Se sente bem? – Questionou Eduardo, saindo do estabulo e ficando de frente para ninguém menos que o príncipe.
O príncipe olhou o plebeu de cima abaixo, em outra ocasião teria apenas dado as costas e ido embora, envergonhado por alguém ter ouvido suas reclamações. Porém, simpatizou com o rosto do jovem que estava a sua frente e disse:
– Creio que já tenha ouvido meu... lamento, por assim dizer. Não, eu realmente não estou bem. – O príncipe balançou a cabeça, em tristeza profunda. – Desejo um reino melhor para meu povo, mas papai é muito cabeça dura.
Eduardo, ao invés de reivindicar a vontade que tinha de viver em um reino melhor e mais justo, disse, para ajudar o príncipe, alguém que ele já considerava um grande amigo pela sinceridade com uma pessoa da plebe, como ele:
– Mamãe me ensinava que sempre que desejássemos algo, a melhor forma de realizar o que se deseja é fazendo uma lista... – Eduardo fala de maneira calma. – Você tem uma lista majestade?
– Acho que posso criar uma agora – Elias estava admirado com a coragem do rapaz, já que seu povo evitava conversar com a realeza. - Meu primeiro item é ser um bom rei. – O príncipe começou, para si mesmo. – Mas não é apenas isso. Quero encontrar pessoas honestas e verdadeiras. Receber carinho e cuidados sinceros, sem que haja um interesse escondido. Mas o maior desejo é encontrar um amor de verdade... – fez uma pausa, refletindo se fez a escolha certa ao se abrir perto do plebeu. - Você acha que isso é difícil...? – deu a deixa para que o rapaz se apresentasse.
– Eduardo Stewart – ele se apresentou com uma reverencia. – Creio que não majestade. Você apenas precisa escolher as pessoas certas para abrir seu coração – as palavras eram sinceras, e Elias percebeu isso. – Sempre que penso em amor e honestidade me lembro da minha mãe... Ela era um exemplo de pessoa honesta.
– Certamente – o príncipe estava interessado em saber mais. – O que mais se lembra dela? – Elias percebeu que o rapaz a sua frente tinha tudo o que desejava.
– Do sorriso largo e do toque suave – Eduardo falava com um sorriso. – Todas as noites ela nos colocava pra dormir, perguntava como foi o nosso dia, e gargalhava das nossas peripécias – o olhar nostálgico que o rapaz mantinha no rosto deixou o príncipe mais do que encantado.
– São boas memórias não é mesmo? – O príncipe disse com um sorriso. Ele queria mais da companhia do rapaz, que diferente das pessoas de seu reino, não era arrogante, muito menos falava com a falsidade que estava acostumado a ver nas pessoas. – Me diga do que...
– Oh! Majestade veja! – foi interrompido como grito de Eduardo que saia em direção a uma pilha de feno. – A joia! – abaixou-se pegando a pequena esfera polida para devolver ao dono. - Príncipe Elias, aqui está a joia de sua coroa – ele devolveu o pequeno objeto com uma mesura exagerada.
– Obrigada meu rapaz – o príncipe estava admirado com a honestidade de Eduardo. – O garoto podia ter esperado que ele fosse embora, para só então pegar a joia e toma-la pra si. Mas escolheu devolve-la desperdiçando a grande oportunidade.
– Por que você não guardou a joia pra si? – a curiosidade de Elias não o deixaria descansar.
– Isso seria roubo majestade – o rapaz olhava para o nobre com expressão seria, fechada. – E eu não sou ladrão.
– Mas todos no reino costumam roubar para sobreviver! – o príncipe ainda estava desacreditado.
– Perdoe-me majestade, mas não sou todos no reino – o tom da voz era sério e ácido. Eduardo odiava ser chamado de ladrão, apenas por ser um plebeu. – Herdei da minha mãe todas as suas características, e honestidade foi a primeira delas.
O nobre não teve tempo de responder, pois naquele instante Adeline, sua noiva, apareceu lhe chamando. Era a hora do ensaio para o casamento.
Elias não queria se casar. Definitivamente não. Mas enquanto não estivesse com outra solução em mãos, ele teria que fazer isso. Mesmo odiando sua noiva. Mesmo sentindo-se estranho com relação ao rapaz do estabulo. Eduardo o deixara tão admirado. Seja pela audácia, ou pela grande honestidade, aquele garoto havia tocado o coração do príncipe.
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Lanternas de Papel
ContoQuando a joia da coroa do príncipe Elias é roubada, o castelo entra em alvoroço. A pergunta que rondava a mente de todos era: Será que o rei vai abrir os portões do castelo nessa primavera? Convencido por seus irmãos a trabalharem no castelo (nov...