Capítulo 17

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Lucjan espremeu os olhos e encolheu os ombros para cima, quase como se com isso fosse conseguir amenizar o arrepio horrendo que atravessava seu corpo cada vez que ligava a furadeira. Quando a abandonou no chão do banheiro, as mãos estavam formigando, mas não poderia se sentir mais aliviado.

Cantarolando uma música do Vance Joy que nem gostava muito, mas que não conseguia tirar da cabeça, inseriu as seis buchas, depois fixou os seis botões franceses prateados que tinha escolhido com cuidado na loja para materiais de construção. Ergueu o espelho nos braços, encaixando uma das extremidades nas fendas que tinham as abotoaduras, então o deslizou até que estivesse no lugar certo, tomando boa parte da parede que ficava atrás do gabinete, onde havia instalado uma cuba de louça branquíssima e torneiras bonitas.

Com um bolo de papel toalha embebido em limpador de vidros, foi se livrando de suas próprias impressões digitais e, entre um movimento e outro, encontrava seu rosto refletido no espelho. "And I see you in this new and perfect light", cantarolou em um dueto com as caixas de som. E enquanto a música seguia, e o cantor garantia "você está tão bem", Lucjan ainda estava preso na frase anterior. "Eu vejo você nessa luz nova e perfeita", repetiu, observando sua própria imagem. Desde o quadril, até um palmo acima do topo da cabeça, naquele espelho feito sob medida - não para seu banheiro, mas para si mesmo.

Com um riso espontâneo, agitou a cabeça e, aproveitando o limpador de vidros que sobrara, foi desembaçar o box, que tinha sido instalado na manhã anterior. Depois varreu a poeira, resultado dos furos na parede, e jogou fora as embalagens espalhadas pelo cômodo. Já estava devolvendo a furadeira na maleta quando ouviu a campainha. Não estava esperando ninguém, em nenhum sentido de esperar por alguém. Não tinha combinado nada com quem quer que fosse, também não achava que qualquer de seus amigos fosse aparecer assim, do nada. Aliás, ponderou enquanto vestia uma camiseta, nem tinha certeza de que passara seu novo endereço.

Desceu o lance de dez degraus que distanciava seu quarto e banheiro da sala do loft, e fez seu caminho até a porta. Do outro lado do olho mágico, reconheceu duas cabeleiras ruivas. Fionn estava mais perto, como se tivesse sido o escolhido para tocar a campainha. Mais atrás, e encostado na parede do corredor, estava Aydan. O rapaz segurava um amontoado de sacolas com o slogan do Sanuk, um restaurante de comida tailandesa que ficava a apenas alguns quarteirões dali.

Seu coração estava fazendo as coreografias mais espalhafatosas no peito quando finalmente girou a maçaneta. Fionn estava esperando com um sorriso que só não foi mais saudoso que o abraço dele.

- Por que não disse que já estava por aqui? - perguntou a ele, espalmando gentilmente suas costas.

- Cheguei de manhã - o amigo contou. - Você tá ocupado?

- Claro que não - disparou imediatamente, seus olhos correndo até Aydan. - Ei, Aydo, e aí?

Assim como ele, Aydan tentou sorrir. Embora não pudesse ver seu próprio rosto, imaginou que estivessem fazendo uma careta muito parecida.

- Entrem, por favor - e, logo em seguida, acrescentou: - ainda tá tudo meio desarrumado, então não reparem.

Ele não estava falando aquilo por educação, como a maioria das pessoas fazia. Estava mesmo um pouco bagunçado, como se parte dos móveis e decorações ainda estivessem esperando para descobrir o lugar para onde deveriam ir. As cortinas blackout cor de osso já tinham sido instaladas, mas estavam afastadas das duas janelas enormes, que começavam pouco antes da metade da parede, mas se alongavam até bem perto do teto. Os sofás também já estavam no lugar, uma dupla de estofado palha com dois lugares cada, e uma poltrona num tom pastel de lavanda que Marlena mandara entregar, como um presente de "casa nova", como ela dissera no cartão. Os assentos estavam todos meio voltados para uma parede livre, de costas para a entrada, para a cozinha e também para o segundo piso, mas de frente para a lareira e também para onde colocaria uma TV - ou não, ainda não tinha decidido.

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