Capítulo 1

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—Kate! —Bati desesperada na porta da minha vizinha e melhor amiga. Meu punho trêmulo fez muito mais barulho do que às três da manhã exigiam. —Kate! — Chamei ainda mais alto ouvindo seus passos vagarosos dentro de seu apartamento.

A porta se abriu devagar e eu vi minha melhor amiga aparecer grogue, esfregando os olhos e vestindo um pijama do Simpsons. Seu cabelo loiro parecia uma bola de feno.

—Rose, é madrugada. —Ela gemeu, mas quando viu James no meu colo. —O que aconteceu com o James? Ele está pálido! —Sua voz se tornou alarmada ao ver o menino que mesmo de costas para ela, com o rostinho doente descansando em meu ombro, aparentava estar mal.

—Eu não sei, Rose. —Chorei desesperada dando vazão a todo desamparo que sentia. —Ele está com febre de quarenta graus. —Solucei.

Eu não precisei dizer mais nada. Kate voltou para o apartamento e segundos depois apareceu com as chaves de seu carro. Nós três corremos pelos corredores e descemos as escadas do prédio velho a passos largos.

—Mamãe... —Jamie chorou em meu colo. Meu bebê tinha lágrimas em seus olhos, o rosto pálido e a pele quente. —Está doendo. —Sua voz saia baixinho e os soluços o faziam estremecer.

Acariciei o rostinho de Jamie sentindo o calor estranho na ponta dos meus dedos. Ele continuava a chorar, mas o olhar parecia perdido. Me questionei se a febre estava tão alta que ele começava a delirar. Na minha cabeça passavam todos os casos de crianças que tiveram febres tão altas que comprometeram o funcionamento dos órgãos. Ser mãe solo nunca me pareceu tão difícil.

Kate dirigia como uma piloto profissional e eu agradeci por pelo menos ter minha melhor amiga ao meu lado. A rua não estava movimentada pelo horário e dirigia tão rápido que o ponteiro da velocidade não saia do noventa. Eu estava absolutamente grata por ela estar ali, mas me sentia meio culpada de tira-la de casa.

—James, Fique acordado, ok? Fique com a mamãe e a tia Kate! —Ela pediu desesperada e eu sabia que podia contar com ela.

Olhei para a criança de apenas dois anos em meus braços. Nada no mundo me desesperava a não ser a visão que eu tinha naquele momento. Jamie parecia desfalecer a qualquer momento e seu choro se tornava cada vez mais agoniado. Eu não conseguia conter minhas próprias lágrimas, vê-lo sofrer me fazia sentir o dobro da dor.

Kate derrapou no estacionamento e deslizou perfeitamente para a vaga. Em qualquer circunstância eu ficaria chocada com sua habilidade, mas assim que o carro parou pulei com Jamie no colo e corri para a recepção.

O lugar era luxuoso, o hospital mais perto de nosso apartamento não era o mais barato, mas Kate e eu não podíamos esperar. Por mais intimidante que a construção moderna repleta mármore e vidro Jamie merecia um atendimento rápido. Mesmo com tanto luxo o espaço estava quase vazio, apenas algumas pessoas que se dividiam em bêbados e acompanhantes.

—Senhora, eu preciso de ajuda! Meu filho está com muita febre e reclamou de dor na garganta... —Comecei a dizer, mas o olhar da recepcionista não parecesse minimamente comovido com meu pedido.

—Você precisa primeiro preencher uma ficha, depois apresentar seus documentos e...

—Você não entendeu. —Ri sem humor enquanto Jamie continuava a chorar. —Meu filho está com quarenta graus de febre.

—Mamãe... —James gemeu desesperado com a voz repleta de dor quando percebeu a recusa da funcionária do hospital.

—Não é a primeira vez que uma criança aparece com febre aqui. —A recepcionista ralhou olhando-nos de cima abaixo. Eu vestia uma camisa do Guns and Roses, moletom e pantufas, Kate não parecia muito menos tresloucada com seu pijama do Simpsons. Mas aquilo não deveria ser levado em conta, era um lugar para salvar vidas e não para julgar seus pacientes pelas roupas que usavam.

Eu estava prestes a entregar James para Kate e agarrar o pescoço magro da loira cujo crachá dizia Susan quando minha melhor amiga bateu com força no balcão.

—Tem um garotinho de dois anos e três meses ardendo em febre desde às três da manhã, isso é a porra de um hospital e o filho da minha amiga está doente. —Kate berrou e eu assisti os olhos da recepcionista brilharem de raiva.

Elas se encararam por alguns segundos e eu estava perdendo a paciência. Jamie remexia no meu colo como se a dor aumentasse. Beijei o topo de sua cabeça enquanto o rosto descansava no vão do meu pescoço.

—Senhorita Garden, que barulho é esse? —Eu imediatamente congelei com a pergunta para a recepcionista. Eu conhecia aquela voz.

Meus instintos diziam para que eu corresse, agarrasse James e Kate e fosse para o próximo hospital. Me encolhi de forma a proteger a criança nos meus braços do olhar que eu conhecia. Eu sabia que quando o par de olhos azuis encontrasse o rosto do meu filho tudo estaria perdido.

—Doutor, tem uma criança aqui e essa mulher não quer que seja atendido. —Kate foi em direção a ele, mas eu continuei virada para a recepcionista, sem realmente enxerga-la.

Eles conversaram por alguns segundos, mas as palavras não pareciam fazer sentido para mim. Aquilo não podia estar acontecendo naquele momento. Sentia meu coração bater rápido no peito e minhas pernas gelarem.

—Rose! O doutor Brandon vai atender o Jamie. —Ela me cutucou quando viu que eu não me movi.

Olhei para James, seu beicinho e o rosto manchado pelas lágrimas. As semelhanças estavam ali, mesmo com o rostinho contorcido em dor, elas estavam escancaradas. Os mesmos olhos azuis, os mesmos cabelos loiros, a semelhança era tamanha que eu sabia que seria instantâneo. Oliver não era burro, ele perceberia.

Respirei fundo e me virei. Assisti o rosto de Oliver se transmutar de uma surpresa adorável, para completa descrença quando seus olhos pousaram no meu filho.

Ele estava diferente depois de todos esses anos, eu não podia deixar de notar, o tempo tinha lhe feito bem. Tinha a sombra de barba por fazer e seu rosto parecia mais adulto e másculo do que antes. Não era mais o rapaz que ia todas as noites no bar com cabelo meio despenteado, era um adulto completo, usava jaleco branco e parecia impecavelmente profissional a não ser pela expressão em seu rosto.

—Eu não sei o que meu filho tem, Oliver. —Murmurei.

Ele imediatamente andou em minha direção deixando para trás a surpresa e assumindo seu profissionalismo. Oliver puxou Jamie delicadamente do meu colo e por um segundo eu o segurei. Algo em minha cabeça dizia que ele estava, pela primeira de muitas possíveis vezes, tirando meu bebê de mim.

Os olhos azuis encontraram os meus desesperados e seu rosto pareceu implorar. "Pelo bem do meu filho" tentei me convencer e afrouxei meu aperto sentindo parte de mim se quebrar.

—Nós vamos ver o que ele tem. —A voz estava afetada em sua promessa. Não era um médico prometendo a uma acompanhante, mas de alguma forma bizarra era um pai para uma mãe. No entanto ele pigarreou e voltou a ter uma voz profissional e mecânica. —Faça a ficha de admissão, não demora, e pode entrar em seguida.

Eu assisti meu filho deitar a cabeça no ombro do médico e a semelhança parecia maior quando eles estavam lado a lado. Oliver olhou meio assombrado para a criança que pareceu ficar instantemente confortável em seu colo e eu desviei o olhar. Tentava não pensar no laço que de alguma maneira estava se formando ali. Jamie era uma criança adorável, mas não confiava em estranhos daquela forma, não se aninhava em desconhecidos com tanta segurança, no entanto ele era sensível, simplesmente sentia coisas antes que eu pudesse dize-lo. Eu queria, de maneira desesperada, acreditar que aquele era um efeito da febre e tentava manter aquele pensamento.

—A ficha de admissão... —Ele repetiu para organizar seus pensamentos e acariciou as costas de Oliver antes de se virar para entrar na porta que dava para a emergência.

Mordi o lábio inferior e assisti meu filho completamente entregue nos braços o médico. Eu sabia que naquele momento tudo mudaria. Mas parada ali, usando pantufas na recepção de um hospital, eu prometi para mim mesma que lutaria contra aquelas mudanças.

—O que foi isso, Rose? O médico pareceu ter visto um fantasma quando te olhou. —Kate riu meio nervosa ao meu lado. Eu sabia que ela suspeitava também. —Foi tão estranho porque Jamie... —Ela tentou jogar outra indireta visto que a primeira não tinha surtido efeito na minha completa imobilidade.

—Ele é o pai do James. —Esclareci e olhei-a para ver seu queixo cair. 

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