Ariella Lavínia
Minha casa é o meu porto seguro, é onde me sinto confortável e também onde me alegra por simplesmente ter alguém me esperando: minha grande bola de pelos canina.
Lupi é meu xodó, da raça husky siberiano, ele é muito protetor, gordo e esfomeado, principalmente. Quando abro a porta, já ouço seu choramingo acompanhado de latidos agudos.
— Olha quem chegou! — exclamo alegre. Ele vem abanando o rabo e passando entre minhas pernas. — Lupi! Você vai me derrubar.
Fecho a porta com o pé. Vou para a cozinha tentando desviar do cãozinho em minha frente. Coloco algumas sacolas de compras no balcão e abro uma delas, pegando a ração preferida de Lupi. Despejo uma quantidade em sua tigela. Enquanto ele come, faço um lanche rápido para mim.
Algum tempo depois, tomo um banho, coloco roupa de corrida e tênis. Lupi está na sala, mais precisamente em cima do sofá mordendo uma almofada.
— Você tá babando no meu sofá, Lupi! — ele balança o rabo quando percebe sua coleira em minha mão. — Menino esperto. Que tal nós visitarmos o tio Aiden?
Ele late em resposta. Às vezes tenho a impressão de que ele goste mais de Aiden do que de mim.
A academia fica a uns 20 minutos indo a pé da minha casa e normalmente fico de língua para fora quando chego lá, enquanto Lupi ainda está cheio de energias. Na rua, ele late para tudo e para todos que se aproximam de nós. Ele não é do tipo bravo, mas não gosta de que estranho chegue perto.
Mesmo com a noite chegando, ainda vejo o sol se encolhendo atrás das montanhas, o vento gelado acaricia meu rosto e mesmo com uma blusa moletom e correndo para alcançar Lupi, continuo a sentir frio. Em Toronto é simper assim, no verão é como se tivesse no inverno do Brasil. Pra falar a verdade, onde eu morava chovia bastante, mas sempre em clima úmido. Quando cheguei nessa cidade, então… Foi muito difícil aguentar e acostumar- me com o clima. Minha imunidade normalmente se encontrava baixa e era fácil demais para meu organismo pegar algum tipo de epidemia.
O Brasil pode até ser um país lindo e acolhedor, mas o que vivi lá… todas as lembranças ruins, não consigo nem pensar de um dia voltar. Eu prefiro o frio daqui, o ar gelado do que o vazio que senti na minha terra.
Voltando para a realidade, percebo que Lupi se inquieta. Mas é claro, a academia está apenas a alguns metros de nós. Chegando em frente a porta, a empurro e deslizo para dentro, recebendo o calor bem— vindo do ambiente. Caminhamos mais adentro e ouço conversas e ruído de golpes e grunhidos.
— Bloqueio de circular alto! — Aiden berrou e o garoto obedece girando uma perna para o alto do tronco de Aiden, quase o derrubando no chão. — Porra, Stefan! Muito bom!
Me aproximo mais comprovando minhas suspeitas de que só os dois ainda estão ali. Os restantes dos alunos já devem ter ido embora, dado pelo horário em que termina a aula. Aiden e Stefan se despedem e o garoto de aproximadamente 14 anos vai em direção a sua mochila e só então depois que ele sai da academia que meu amigo nos nota.
— Hei! — exclama largando seu celular de lado e anda na nossa direção. Lupi sendo Lupi, logo pula nele quando o vê. — E aí, garotão? Quanto tempo, hein?
— Às vezes é como se ele chamasse por você. É inacreditável, eu dou carinho e ração para esse gordo e acabo por fim, sendo traída na cara dura.— comento falsamente revoltada. No fundo mesmo, eu adoro essa ligação em que os dois têm.
— Não fique com ciúmes, princesa. — diz me olhando com um sorriso de orelha a orelha. Ele solta Lupi da coleira e o leva para o quintal nos fundos do salão, onde, claro, meu cachorro adora ficar. Lá Aiden montou uma espécie de parque canino, apenas para Lupi brincar quando vem aqui.
Me livro do moletom e do tênis, visto as mãos com as luvas vermelhas e começo a me aquecer no saco de pancadas. Meus movimentos são resumidos em socos diretos, cruzados e mais adiante 50 chutes alternando de um pé para o outro. Descobri no Muay Thai um jeito de desferir toda a energia negativa do meu corpo, tanto física quanto emocional. Creio eu, que cada pessoa tem seu modo de tentar se livrar de algo, e comigo não é diferente. Toda vez que piso em um ringue, saio dele dez vez mais renovada e pronta para qualquer coisa que possa me infligir de maneira destrutiva. Pude ver a diferença em cada membro meu depois de ter começado a lutar, tirando aquela tensão muscular que regularmente eu sentia.
— Caramba, mulher! Tô ficando com medo de você. — Sua voz debochada ecoa atrás de mim. Viro um pouco os ombros alcançando seu olhar risonho.
— É bom ficar mesmo. Acho que até estou pronta para te derrubar chão. — provoco desferindo os restantes de pontapés no saco.
— Isso é um desafio em tanto, não acha Cinderela? — sorrio sarcástica com seu apelido ridículo.
Me viro totalmente de frente para ele.
— Você quer perder a cabeça no ringue ou aqui mesmo? — Pergunto irônica e ele cai na gargalhada rindo de minhas palavras.
Idiota!
— Vamos lá, então, pequena guerreira. — com um olhar desafiador, subo no ringue o esperando em guarda, mas Aiden demora alguns minutos antes de juntar-se a mim.
Procuro com os olhos atentos por todos os lados, mas não o vejo e só quando os acordes da música Sugar de Maroon 5 preenche suavemente todo o lugar é que eu entendo o que ele foi fazer. Aiden aparece pulando as cordas do ringue e para por um momento, fazendo uma dancinha de acordo com o ritmo da música.
Definitivamente, não tem como levá-lo a sério.
Acabo em risadas.
— Essa é uma das minhas preferidas, então, arrasa, mulher.
— Sinto Muito em informar, mas eu vou lutar com você e não dançar com você. Há algo bem distintos entre os dois verbos.
— E quem disse o contrário? — pergunta se colocando em minha frente com os punhos altos e fechados, movendo-os em minha direção e que por um fio não pega em meu rosto.
Olho-o um pouco irritada por seu golpe fora de hora.
— Eu não estava pronta, idiota. — reclamo e recebo outro golpe, mas esse eu já esperava e por fim desvio com facilidade.
— Não se estresse, princesa e lembre-se que EU sou o professor aqui. — mostro- o minha língua e ele questiona levantando uma sobrancelha.
A luta começa e me esforço ao máximo em conseguir desviar de todos seus golpes. Me defendo com os cotovelos e joelhos e por uma distração consigo acertar sua barriga jogando- o um pouco para atrás.
— Essa doeu, mas o que um pezinho de princesa pode fazer contra um leão da selva? — ele pergunta me fazendo rir de sua idiotice.
Os movimentos de punhos contra punhos se intensificam e me orgulho por estar conseguindo ficar de igual para igual com ele, mas como nem tudo é como flores, em gesto rápido, Aiden imobiliza meus braços e me vira de costas para ele.
— Quem é o melhor aqui mesmo, Ari? — Ok, Aiden Joshua se acha e eu o detesto por isso.
Fico presa em seu peitoral sem conseguir me movimentar, apenas sentido sua respiração forte em minha nuca.
Ótimo! Estava indo tudo tão bem e ele tinha que me segurar daquele jeito?
— É claro que sou eu. Me solta! — grunho tentando me soltar de seu aperto.
— Olha! Princesinha brava você, não? — brinca — sabe que você fica até mais bonitinha assim? Quietinha, quietinha.
— Vá se foder, Joshua! — puxo um de meus braços e em um movimento bem pensado consigo me soltar e inclinar-me dando uma rasteira em suas pernas. Ele cai de costas no chão e subo em cima dele desferindo socos diretos.
Aiden se surpreende e se protege com os punhos cruzando- os sobre seu rosto. Aproveito para me vingar e soco seu peito me divertindo com a reação dele. De repente ele se levanta e dessa vez quem vai pro chão como um saco de batatas, sou eu. Joshua me prende entre suas coxas e suas mãos vão para meus punhos, os empurrando contra a lona.
— Onde aprendeu isso? — apesar do seu ar reprovador, um sorriso genuíno brinca em seus lábios.
— Lendo um pouco.
— Mulheres e livros são uns perigos. — diz fingindo um tom machista. — Mas lembrando que golpes assim não são permitidos no Muay Thai, você quase me arrebenta, mulher!
Pensando bem, eu poderia tê— lo machucado de verdade com essa brincadeira.
— Me desculpe, Josh.
— Você me chamando assim, tão carinhosa… seria um erro meu não desculpa-la. — ele adora ser chamado pelo segundo nome, pois segundo ele, Aiden não combina com seu perfil charmoso, o que me faz dizer o seu primeiro nome frequentemente e de propósito.
Aiden me olha um pouco intrigado e pensativo. A música de fundo troca e outra da banda Metallica reverbera com os acordes brutos da guitarra em meus ouvidos.
É a primeira vez que presto atenção na letra de Nothing Else Matters.
Tão perto, não importa o quão distante
Não poderia ser muito mais do coração
Sempre confiando naquilo que somos
E nada mais importa
E também é a primeira vez que detalho tanto os olhos de Aiden, ele parece perceber que o momento muda o clima descontraído para algo mais tenso… meus olhos descem para seus lábios e ficam ali, luto contra meus instintos para que eu volte ao normal é também para que eu saia desse lugar o mais rápido possível. O sorriso fácil de Aiden não está mais iluminando seu rosto, agora está sombreado por seus olhos escuros.
O que está acontecendo com a gente?
O que eu mais temo está por acontecer. Aiden se inclina em minha direção com os lábios entreabertos, inspirando e expirando por eles. O som da sua respiração faz meu estômago embrulhar de ansiedade e meu coração que até agora batia descompassado pelo esforço excessivo, já não o fazia pelo mesmo motivo de antes. Fecho os olhos temendo e ansiando por aquele beijo. Sinto ele se aproximar ainda mais.
Porém de repente algo estraga o clima que se criou entre nós. Lupi pula em Aiden, o tirando de cima de mim e quando eles já estavam longe o suficiente para que eu pudesse me recompor, levantei-me aturdida olhando os dois que brincavam no chão, como se nada estivesse a ponto de acontecer se não fosse pela interrupção de Lupi, talvez eu me arrependesse Muito depois, mas por outro lado, ainda estou com a mesma ansiedade de ter os lábios dele nos meus.
— Lupi! Eca! Você está me babando… — Meu lobinho senta parecendo um cãozinho comportado e fica de língua para fora, respirando sem parar.Aiden acaricia o pelo de Lupi e em seguida me olha.
— Ele está bem gordo. Precisa de mais exercícios. — não acredito que ele consegue esquecer algo em momentos… pois eu ainda estou que nem uma idiota pensando em seu corpo em cima do meu.
— Sim… bem, acho que precisamos ir.
— Vocês acabaram de chegar… — será que ele não nota meu desconforto. Porra, quase que eu beijei meu melhor amigo.
— Eu nem viria hoje, mas valeu a caminhada. Obrigada, Josh… pelo treino. — Me sinto perder as forças nas palavras na medida em que ele se aproxima, trazendo seu ar quente para perto de mim novamente.
— De nada, princesa. Amigo é para essas coisas, não? — É, não é? Amigos? Essa palavra me deu nó na garganta, apenas em ser ouvida.
— É… claro. Tchau Joshua. — antes de eu tentar sair sem seu conhecido beijo na bochecha, ele me puxa beijando minha testa e depois me abraça.
— Tchau, Ari. Fica bem.❤️❤️❤️
VOCÊ ESTÁ LENDO
Flama - Paixão que Enlouquece
RomanceAriella L. Ribeiro é uma típica moça brasileira do norte do país, mas que partiu para Toronto em busca de recomeçar sua vida longe do Brasil. Tendo em mente em seguir com sua vida na simplicidade, a moça conseguiu um emprego de recepcionista em umas...