Capítulo 8 - A Colônia Penal Número 14 para mulheres

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Vinte dias depois, Mordóvia, Rússia

Passaram-se três meses e vinte dias (sim, ela estava contando)... Ainda não tinha caído a ficha. Se alguém lhe tivesse dito que acabaria sendo presa e levada para uma colônia penal no meio do nada russo, ela teria dado boas gargalhadas. Não podia prever que estaria afundando num pesadelo digno de Freddy Krueger, quando aceitou trabalhar em cooperação com a BRP.

Logo iria acordar em sua cama quente e macia... Em sua amada e cheirosa casa, em seu amado e livre Brasil. A esperança de que tudo não passou de um sonho ruim, porém, estava morrendo aos poucos.

As mulheres da administração da colônia penal eram indiferentes ao sofrimento das detentas. Estas, por sua vez, precisavam ter um casco duro para sobreviver naquela selva humana deprimente.

Celeste aprendeu algumas poucas palavras em russo ao longo daqueles meses. Precisou aprender, para se defender. As detentas que viviam lá há muito tempo, costumavam lhe dizer: - Você vai morrer aqui. Nunca mais verá sua família. Nunca mais sentirá a brisa fresca do mar beijando a sua face. Nunca mais...

Celeste tentou conter as lágrimas que ameaçavam rolar pelas bochechas. A colônia penal número 14 para mulheres era o mais próximo do inferno que ela podia imaginar. Um inferno gelado... E que ficaria ainda mais gelado com a chegada do inverno.

Ela tossiu, sentindo a falta de ar roubar-lhe as forças. Apoiou-se nos joelhos. Suas mãos trêmulas rasparam no tecido áspero do uniforme verde-musgo. O lenço que todas as detentas são obrigadas a usar para cobrir os cabelos, tremulou com a súbita rajada de vento.

A vigia, em seu uniforme caqui, gritou para ela se mexer. Claro, Celeste tinha que trabalhar. As mulheres acordavam às seis da manhã, tomavam café e, em seguida, já estavam na lida até as treze horas, com uma pausa apenas para o almoço. Depois retornavam ao trabalho até às dezesseis. O restante do dia era preenchido com alguma atividade ou ofício. A luz apagava-se às vinte e duas. Ninguém podia dar um pio depois do horário.

Fazer xixi? Nem pensar... Até mesmo de dia era desanimador sair do prédio, enfrentar uma temperatura que podia chegar a vinte graus negativos, para usar o banheiro que nada mais era do que um buraco no chão.

O prédio, construído nos anos de maior poder da União Soviética, não possuía nem sistema de esgoto. Por isso, as mulheres não podiam usar um banheiro "normal". Os barracões no estilo das Forças Armadas foram construídos aproximadamente na década de 1920. Estavam entulhados de beliches, onde as detentas dormiam. Celeste estava com a coluna em nada, por causa dos ferros do colchão de molas. Não era trocado desde a década de 1970. Estava velho, e fedia horrores, devido à passagem de muitas mulheres ao longo daqueles anos.

A segurança era privilegiada, a higiene nem tanto.

Para atestar tal situação, Celeste olhou para a vigia, que segurava um pastor alemão enorme pela guia. O cão permanecia alerta e pronto para estraçalhar.

A brasileira se voltou para o sulco aberto com a pá, na terra úmida - no qual deveria estar plantando as sementes. As presas trabalhavam arduamente na plantação. Ao redor delas, ao longe, havia o pântano e depois, mais além, as florestas espessas a perder de vista. Se tentasse correr para a floresta, ficaria atolada na lama. Se não fosse a lama, levaria um tiro nas costas ou seria agarrada pelo cão treinado para caçar as fujonas. E não havia só um cão.

Eram dois. Celeste os apelidou em segredo de Matador e Serial Killer.

A enxada pesava cada vez mais em suas mãos fracas. Ela se sentia toda trêmula. Acordou naquela manhã suando frio, com muita dificuldade para se locomover. Estava completamente sem energia. A administração não lhe permitia ter acesso a uma bombinha com o medicamento que precisava usar para combater a bronquite asmática. Sua condição se agravava cada vez mais. Respirar era-lhe dificultoso. Geralmente, se as mulheres queriam ter acesso a alguns confortos, tais como medicamentos, suas famílias precisavam pagar por eles.

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