Capítulo 1: As Apostas Se Iniciam

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"Aproxima-se o Festival de Primavera em Gangardia, e nos perguntamos: o que será deste ano?

Sabemos de muitas coisas, e que nunca falta diversão. Mas, comparado a este ano, os antecessores passaram a ser desanimadores, visto que temos uma debutante como anfitriã. Astra Goldemberg, herdeira do trono de Gangardia e do Norte, será o assunto principal desta festividade. Mas, quem será o verdadeiro ganhador daquele valioso prêmio?"

EL CASAGRAND–JORNAL OFICIAL DO CONDADO DE CLANES (REINO LESTE),

10 DE MARÇO DE 3612

Artur

Artur perdeu as contas da quantidade de copos de bebida que consumiu. Ainda que acostumado a ingestão do álcool, sentia a última dose queimar em sua garganta. Aquilo jamais seria uma refeição. No entanto, era o necessário para apagar a própria frustração diária de conviver com a sua família. Nada de funcional ou exemplar estava nela, este era o herdeiro, o seu pai, obviamente o rei, e havia a sua mãe que era a rainha consorte e mais três irmãos mais novos. Nenhum deles eram próximos de Artur, com exceção de Kaya, a caçula, que mais era como que uma espécie de obrigação dele de protegê-la, do que qualquer outra coisa. E era a única que tinha um elo em comum com o herdeiro, além do sobrenome e os mesmos pais. Ambos estavam fadados à rejeição.

Inimagináveis vezes o rapaz pensava ser um problema, especialmente ao recordar-se da cena de um garotinho na ponta dos pés observando pela janela de um dos quartos do palácio, o pai aproximar-se do gramado do jardim acompanhado de um amigo. O menino animado em ver seu pai acenou enquanto pulava alegremente, porém tudo o que recebeu foi uma carranca em resposta com a nítida feição de desgosto. Era sempre assim, os olhares, as palavras duras e perfuráveis, a constante cobrança pelo que ninguém estava disposto a ensinar, e a evidente sensação de incômodo em ter a presença de seu filho na mesma sala que ele quando o assunto era trabalho.

Pai. Artur sequer sabia explicar o que era ter um, porque enquanto existia, nunca presenciara um só momento de paternidade.

Quanto à sua mãe, não podia pintá-la como adorável, porque a acidez que ela emanava o expulsava de seu convívio desde muito pequeno. O olhar magoado e voraz que ela possuía vinha de uma vida vaga, que fora fadada a uma frustração sem fim, gerado por seu péssimo casamento. E terem lhe dado um título e uma coroa só colaborou com o pior lado que ela possuía. Ainda assim, ela era a mãe dele e ao menos o dirigia a palavra vez ou outra, diferente do homem que ele chamava de pai, ainda que jamais merecesse.

Ainda haviam os irmãos: um perfeito usurpador, um ano e meio a menos que Artur, uma quase adulta de péssima fama que conseguia imitar perfeitamente a mãe e o pai em todos os piores aspectos e por fim a caixinha de surpresa, que o fazia repensar todos os dias se deveria ou não sair de casa, uma pré-adolescente sagaz, tão rejeitada quanto o herdeiro vinha sendo em todos os seus dias de vida, e que possuía mais conhecimento e agilidade que qualquer membro da família D'loi.

E ainda havia sempre um turbilhão de lembranças, os gritos do seu pai, as traições, seus momentos de completa instabilidade emocional, as coisas terríveis que fazia em seu governo e a péssima reputação que seu reinado carregava, com a contribuição desfavorável do comportamento de sua família. Por que esperavam que Artur D'loi deveria salvar a todos?

Bem, ninguém nunca teve a intenção de lhe perguntar o que queria, como se sentia ou melhor o que estava fazendo com o pouco acesso que tinha. O que ele sabia era que com a sua constante ausência e o escape diário para juntar-se à amiga, a qual o mantém sedado, Artur jamais seria o acréscimo do bom nome da família. Mas, sim, mais um membro exatamente igual aos outros. Um D'loi, diziam, como a perfeita desculpa para os seus atos.

Série A Terra Nórdica- A Herdeira ( Em Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora