Hyonjong rasgou o saco plástico que ele mesmo havia colocado em sua cabeça.
– CALA A MERDA DA BOCA! – e se surpreendeu ao ser obedecido.
Muito lentamente (como se evitasse acordar alguém) acendeu o cigarro. Deu uma tragada e soprou a fumaça. Mexeu nos comprimidos em cima da mesa.
Hyonjong não sorria há mais de três anos, exceto quando estava bêbado. Isso era o que mais odiava em si mesmo. Era um beberrão que às vezes estava bêbado, mas quando não estava bêbado estava sóbrio.
"A pior parte de alguns homens é que quando não estão bêbados, estão sóbrios"
Seu pior inimigo não poderia odiar ele tanto quanto ele mesmo.
Deitou na cadeira giratória e equilibrou-se nas duas rodas de trás. Puxou a cordinha da persiana e deixou o laranja do sol entrar.
Não devia ser nem seis horas da manhã. O ciclo do dia de Hyonjong começava logo cedo.
Acordava antes das três (isso nas noites que dormia) e com pausas para fumar ou beber um gole de vodka, admirava o céu, perguntando a si mesmo em que momento sua vida tinha dado tão errado.
Há menos de seis anos, era um garoto de 16 que estava perto de terminar a escola, com um boletim impecável e uma vida perfeita.
No fundo, Hyonjong sabia que sua vida passou de um luxuoso palácio para ruínas simplesmente por um pouco de maconha enrolada em um pedaço de papel. Sabia que o primeiro cigarro, oferecido por Kwon Jiyong, destruiu tudo o que ele tinha. Pedaço por pedaço.
Depois que sua mãe adoeceu e morreu de desgosto, seu pai o expulsou de casa. E apesar de nunca ter esquecido momento algum de sua vida, Hyonjong passava as manhãs, tardes e madrugadas tentando perguntando a si mesmo em que momento sua vida tinha dado tão errado...
E Hyonjong saiu de seu transe.
"Minha garganta está seca, aah"
Com muita raiva o jovem garoto chutou a escrivaninha, acabou se desequilibrando e caindo para trás. Bateu a cabeça na parede e gritou:
– Todo dia essa filha da putagem na minha cabeça. Se eu soubesse que você ficaria aqui pra sempre eu nunca teria usado aquilo. – ficou vermelho.
"Qualquer pessoa comum seria totalmente capaz de calar a voz da sua consciência. Você é realmente inútil"
- Quer parar de dizer coisas que já sei?! Sei que sou o pior tipo de escória e sei que sou um verdadeiro inútil! Porque você fica piorando minha sensação e depois me impede de tirar minha vida?! – chutou o lixeiro.
"Esse é o trabalho da sua consciência"
– Você não é consciente o suficiente para ser minha consciência, sua filha de um puta.
"Cada um tem a consciência que merece. Sou o pior tipo de consciência e você o pior tipo de pessoa."
– Vá à merda!
"Não ache que pode me mandar para qualquer lugar pior que o inferno que seu cérebro é. Sempre que ajeito isso aqui você fuma ou bebe e bagunça tudo novamente."
O que mais deixava Hyonjong furioso, era que bem no fundo, sabia que a voz em sua cabeça era muito mais inteligente que ele. Só que era muito orgulhoso para admitir.
"Eu só vou me calar quando souber que você está completamente preparado para não estragar o fiapo de vida que você ainda tem."
– Se eu prometer nunca mais tentar me matar e parar de fumar e beber você me deixa em paz? – já havia perguntado aquilo centenas de vezes, mas às vezes era divertido conversar com a voz. Afinal, os diálogos de verdade que tinha tido nos últimos tempos havia sido ali, no escritório do apartamento alugado.
"Hm! E depois o que? Vai para um mosteiro se tornar padre? Qual é Hyonjong? É mais inteligente que isso. Não é capaz de enganar sua própria cabeça? Faça-me o favor!"
– Cale a boca okay? – pediu e apanhou a garrafa de vodka.
"Sede de vodka não! Sede de água! Você sabe muito bem que tem uma garrafa de um líquido transparente que não desce queimando tudo por dentro e que não te deixa mais surtado"
– Tanto faz. – suspirou e abriu a geladeira. Bebeu um gole d'água e sentiu como se o líquido limpasse seu interior.
"Você não sente falta de caminhar? De respirar o ar fresco ao invés da mesma fumaça? Na primeira conversa que tivemos você disse que odeia a monotonia... há quanto tempo sua vida se tornou esse enfadonha narrativa? Vai mesmo apodrecer sentado em uma cadeira de frente para a janela?"
Sem reação, o jovem Hyonjong simplesmente bebeu mais um gole de água. Respirou fundo e sentiu o mesmo cheiro que vinha sentindo há meses. Não ouvia outra voz que não fosse a de sua consciência há séculos. Não sentia outra sensação que não fosse a abafada de seu apartamento apertado há tanto tempo que nem lembrava mais como era sentir frio.
– Sabe... você tem razão! – deixou de lado por algum momento o orgulho- precisamos de algo... refrescante.
A vida do jovem Hyonjong era tão arrumada sempre que um dia resolveu bagunça-lá, e ela estava bagunçada há tanto tempo que talvez fosse a hora de arruma-lá.
Ligou a rádio e uma música antiga começou a tocar. Recolheu as seringas vazias e os pacotes de cigarros vazios e jogou tudo dentro de uma enorme sacola plástica. Abriu a janela e olhou para o chão, uma enorme caçamba de lixo lá embaixo. Jogou a sacola e rapidamente fechou a janela fazendo um movimento esquisito com as mãos, como se além de tentar espantar mosquitos, tentasse espantar pensamentos.
- Vamos naquela praça em Seoul. Não fale nada enquanto eu estiver na rua, eu sei que sou um completo maluco mas nem todo mundo sabe.
"Tanto faz, só não faça nenhuma merda e eu não vou interferir..."
Vestiu a jaqueta jeans e calçou os sapatos. Procurou a chave da porta no meio de alguns outros objetos (muitos quebrados, por sinal) e saiu.
Se Hyonjong soubesse aonde ia terminar, ele não saberia se teria ou não saído de casa naquela manhã...
VOCÊ ESTÁ LENDO
psycho; triple-h
FanfictionOnde um suicida, uma homicida e um ladrão se juntam por terem simplesmente algo em comum. Que tipo de história se tira disso? #1 - em Hyudawn (24/05/19)