“I don’t know you
But I want you
All the more for that
Words fall through me
And always fool me
And I can’t react”Falling Slowly – The Swell Season
O voo já acontecia há quinze minutos, por aí. Não contei o tempo, na verdade, a música no meu fone
era muito boa para contar qualquer coisa.Tinha ido assistir em Nova Iorque um musical novo, Always, e simplesmente me apaixonei pelas músicas. Tentava me controlar para não cantar em voz alta Falling Slowly, quando senti um toque no meu ombro direito.
Era o maestro-mendigo.
Tirei só um fone e levantei as sobrancelhas naquela expressão que pergunta em silêncio: Oi?
— Por favor, será que o senhor se importaria de parar de fazer bolinhas com seu chiclete, que estou tentando me concentrar aqui?
Então ele olhou para um monte de papéis nas próprias mãos e me encarou de novo. Era uma partitura,
cheia de uns rabiscos tenebrosos. Nos cantos tinham várias anotações e todos aqueles símbolos, parecia
um hieróglifo impossível de traduzir.Virei para o cara e ele já não me olhava mais.
Minha mãe sempre disse que fazer bolas com chiclete era falta de educação, mas pedir para outra
pessoa parar de fazer bolas também não me pareceu muito educado.Então, coloquei de volta o fone e
esqueci do assunto. A música era muito mais legal do que a necessidade de concentração do cara ao lado.
Um tempo depois senti outra batida no ombro.Meu Deus, que neurótico! O que seria agora?
Tirei o fone e ele respirou fundo.
— Senhor, por favor, você poderia ter a educação de mascar de boca fechada? Ou de cuspir esse chiclete? — E terminou com uma careta como se sentisse nojo.
Eu achava que nem estava mascando de boca aberta, achava... Então, me senti muito mais irritado do
que envergonhado.— Me importo, sim, em parar de mascar, porque a pressão do avião entope meus ouvidos. — Bati de
leve em cima deles para enfatizar o que dizia e concluí com ironia: — Mas já que você insiste.Sem pensar em nada, a não ser em dar uma lição no maestro-mendigo-grosso, enfiei dois dedos na boca e pincei o chiclete. Estiquei o braço e colei a goma grudenta no monitor ao lado, em cima da TV dele, mais precisamente. Olhei para o cara que encarava o chiclete como se ele fosse uma lesma se contorcendo e enfiei os fones outra vez. Não voltei a encará-lo, mas tive certeza de que se os olhos dele tivessem braços eu estaria apanhando.
Aumentei o volume ao máximo. Foi aí que o impensável aconteceu: o cara, o maestro-eu-sou-louco-e-famoso, resolveu brincar de doze anos comigo.
Senti a mão dele agarrar a barra do meu blusão folgado e puxar para o lado e para cima com tudo. Resultado: meu corpo meio que foi junto e num movimento rápido de confundir, aquele animal pegou o chiclete com o meu blusão e só então me soltou.
Então, eu explodi. Quando era criança, minha mãe me chamava de pimenta de sapatilhas, ela dizia que
quando eu estourava, quem estivesse perto sentia na hora.— Você é um grosso, seu idiota! — gritei emputecido.
— E você, meu caro, não tem educação.
Ri, debochando.
— Aposto que dentro deste avião todos concordariam que é ao contrário... não é verdade? —
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senhor florimundo - johnlock
Fanfictionum maestro e um bailarino, ambos cheios de traumas e demônios particulares, brigando diariamente. poderiam superar isso tudo? ou em que o maestro é cego, não literalmente. e o bailarino é a luz na sua vida.