Parte II

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''Deveria ter dito alguma coisa?'' Stuart se perguntou, ainda observando quase que hipnotizado Eudora sair da escola de ombros curvados e as mãos no bolso da jaqueta de couro falso, sempre com o mesmo jeito carrancudo e expressão de poucos amigos. "Claro que deveria ter dito seu imbecil!"

Bufou descontente consigo mesmo, ajeitando os livros que segurava e franzindo o cenho a se lamentar pela própria timidez, essa que o impedia de agir como realmente desejava inúmeras vezes. Mas não podia ficar esperando a oportunidade perdida retornar, começando a andar em direção à saída.

Porém, sentiu algo o empurrar para o lado de forma abrupta, o desequilibrado e interrompendo seu raciocínio. Segurou os livros com força, mas deixando cair sem querer um exemplar sobre mitos gregos que tanto havia lutado para conseguir um exemplar disponível na biblioteca. Antes que pudesse se restabelecer, foi jogado ao outro lado, ouvindo risos de escárnio e vendo com o canto dos olhos um bando de veteranos e atletas da escola o olhando com chacota.

Matt Acey, Tommy Smith e Paul Banner. Sempre os mesmos a caçoá-lo pelo sotaque, por ser um pouco mais baixo que a média, e principalmente pelo jeito nerd atrapalhado que não conseguia esconde. Mas Stuart tinha certeza que mesmo se ele não fosse tudo isso, ainda aquele grupo encontraria qualquer outra desculpa para tratar ele e outros estudantes mais fracos feitos saco de pancadas para alimentar o prazer sádico de se sentir acima dos outros. Para logo depois tentarem se redimir, seja para que não fossem denunciados, e geralmente próximo do período de trabalhos e provas, dizendo ser apenas brincadeira e que gostariam de uma ajudinha.

E Stuart caía nessa, em parte por ser o bom garoto de sempre, mas também por temer negar qualquer coisa aqueles trogloditas que não se pareciam com adolescentes, mas com soldados criados em laboratório para trazer caos e destruição.

– O que estão fazendo?! – Protestou alarmado, enquanto arrumava os óculos no rosto e tentava recuperar o livro jogado no chão. ''As folhas amassaram seus malditos! '' pensou irritado, mas não dizendo nada para não criar outro foco para lhe tirarem o sarro.

– Ihhh! Ele ficou irritado Acey! – Um garoto da qual só conhecia de vista disse de forma instigante. Stuart notou o grupo consideravelmente maior de estudantes além do típico trio infernal, provavelmente todos retornando dos treinos de futebol e seguindo o líder feito abelhas.

– Mas claro que não, o menino gênio não fica de mal com ninguém. – Matt disse de forma zombeteira, circulando o ombro de Stuart com um dos braços e o fazendo se aproximar mais dele a força, o encarando feito um predador com um sorriso falso. – Somos amigos, né Stuart? Sabe que só estamos nos divertindo.

Stuart não engolia aquele cinismo, mas não conseguia dizer mais nada além de engolir em seco, paralisado de medo pelo grupo. Riram de seu olhar amedrontado e a falta de resposta, começando a empurra-lo para lá e para cá, até derrubar todos seus pertences, e ele próprio desabar no chão frio do corredor.

Sentiu a garganta se apertar e um sentimento de revolta lhe tomar a cabeça, mas não sendo capaz de fazer muito mais além de morder os lábios para conter um choro que o humilharia ainda mais. O coro diabólico de risos ao seu redor o fez cerrar os punhos de raiva, levantando-se de forma lenta ao tentar se recompor. Contudo, sentiu seu colarinho sendo puxado, o enforcando por um instante, logo estando cara a cara com Tommy que continuava rindo de sua cara, sentindo um beliscão em seu rosto deferido por alguém que não chegou a saber quem no meio do pandemônio.

Ouviu um armário sendo aberto e um arrepio lhe percorreu a espinha, com o mais velho e os outros estudantes o empurrando cada vez mais para trás, forçando-o a entrar no cubículo de metal.

– Não, não, por favor! – Tentou implorar aos gaguejos, recebendo mais risos de desdém em resposta. Infelizmente conhecia a sensação claustrofóbica e do escuro daqueles armários, junto ao momento repleto de constrangimento em que o zelador o tiraria de lá em algum momento do turno da noite. Lembrou-se de quando tentou reclamar na diretoria uma vez ainda no ensino fundamental, mas pouco fizeram além de conversarem brevemente com os agressores que pareceram ficar ainda mais atiçados após aquilo. Stuart desistiu desde então, tentando se desvencilhar dos valentões da melhor forma que podia. Mas infelizmente, nem sempre conseguia escapar, tentando lutar com o máximo de suas forças contra aqueles brutamontes.

Até que de repente, um alarme soou do lado de fora.

Stuart sentiu que aliviaram a pressão contra seus braços, o parando de tentar empurrá-lo no armário por um momento. Era um alarme de carro, e todos se perguntavam se podia ser o de um deles.

– Não é o seu carro Matt? – Paul questionou, fazendo todos se virarem em direção à saída, alarmados.

– Merda! – O garoto praguejou, correndo preocupado para fora da escola, fazendo com que o restante do grupo o seguisse por curiosidade e por não viverem sem o zangão do vespeiro, deixando Stuart livre finalmente.

Ficou consternado por alguns segundos, o peito subindo e descendo rapidamente pelo susto. Mas logo Stuart começou a ajuntar suas coisas o mais rápido que pode, pois só queria voltar para casa de uma vez, quem sabe nunca mais sair de lá de preferência.

Ao sair do edifício, se surpreendeu ao ver Matt e companhia irados e apavorados com o veículo dele completamente vandalizado. Um tijolo no para brisa, a lataria riscada, os retrovisores quebrados. O estrago era terrível e Stuart se perguntava quem poderia ter feito aquilo, pois de certa forma havia sido poupado por conta de tal acidente (aparentemente não tão acidental assim).

Mas ao contrário dos outros distraídos a lamentarem o carro destroçado, Stuart notou um som particular que conhecia muito bem. Ouviu o som de uma correia de bicicleta em movimento, virando o olhar em direção ao asfalto e vendo Eudora pedalar em circulo pela rua antes de prosseguir caminho. Seu olhar era de satisfação, com uma pontada de travessura e malandragem. E quando seus olhos da cor do mel cruzaram com os seus, não foi preciso uma única palavra para saber o que havia acontecido.

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Calmaria RebeldeOnde histórias criam vida. Descubra agora