Recomeço

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Any Gabrielly P.O.V

Faz três semanas que estou no maldito orfanato.

Meus irmãos não parecem estar preocupados com isso, afinal, brincam o dia todo com as outras crianças.
Enquanto isso, meu coração acelera todas as vezes que alguém entra no orfanato com a intenção de adotar.

Tenho a impressão que as garotas da minha idade não foram com minha cara, pois todas as vezes que eu me aproximo, elas se afastam e cochicham umas com as outras.
Não as culpo, a minha expressão de existência é a famosa "cara de cu".

Passo a maior parte do dia lendo.
Só consegui trazer algumas coisas de casa; os walkie-talkies, meus livros, algumas roupas, e obviamente, uma fotografia com meus irmãos e minha mãe. Foi uma foto tirada assim que minha mãe voltou do hospital quando o Ben nasceu. Ela está com um sorriso tão contagiante que mal parece que adoeceu logo em seguida.
Kevin também estava na foto, mas eu rasguei a parte em que ele estava.

Estou sentada em uma das mesas do pátio enquanto leio a obra mais conhecida da Jane Austen, "Orgulho e Preconceito".
Eu realmente amo essa escritora. Também amo a J.K Rowling, acho ela um gênio da literatura.

Mas a Jane Austen é minha heroína.

O primeiro livro que eu li dela, foi o que estou lendo agora. Vi minha mãe ler ele várias vezes.
Peguei no livro pela primeira vez quando comecei a cuidar das minhas irmãs enquanto minha mãe e Kevin trabalhavam. Eu fico entediada facilmente, e os livros da Jane Austen - e a literatura, no geral - eram meu pequeno refúgio.
Meus professores começaram a ver muito potencial em mim ao perceber que eu, na época, uma garota de quase onze anos, se interessava por literatura complexa.

Literatura complexa para uma criança, na verdade.

Fecho o livro ao ver um dos voluntários, um garoto asiático de cabeça raspada, se aproximar de mim e o encaro.

- Any Gabrielly? - ele pergunta e eu arqueio uma sobrancelha - A diretora está chamando você na sala dela.

Engulo em seco e assinto, me levantando, apertando o livro em minhas mãos.
Dou uma última olhada em meus irmãos que estão brincando no parquinho antes de sair andando, rumo à sala da diretora.

Ela é uma mulher chamada Dolores que não aparenta ter mais de cinquenta anos, ela vive com um sorriso simpático no rosto, usa um óculos de lentes retangulares que fica na ponta de seu nariz, seus cabelos castanhos sempre estão presos em um coque apertado, e julgando pelos fios brancos acho que ela não retoca a cor por um bom tempo.

- Com licença, diretora. - digo entrando na sala, ficando surpresa ao ver quem está na mesma.

- Oi, Any. - Michael diz e acena para mim, enquanto come um donut. Olho para Ella, que me dá um pequeno sorriso.

- Sente-se, querida. - Dolores pede, abrindo um sorriso simpático.

Me sento na cadeira vazia que está entre Michael e Ella. Sinto o olhar dos três em mim, e isso faz minhas bochechas corarem.

- Por que me chamou aqui? - pergunto de uma vez, olhando para a diretora.

- Ah, claro. - ela ri e bate a mão na própria testa, abrindo uma pasta - Ella, pode dar as notícias, se quiser.

- Então, Any - Ella diz, com um sorriso empolgado no rosto. Seu cabelo black-power está preso hoje -, parece que tem uma família interessada em vocês.

- O que? - arregalo os olhos e olho para a diretora, e em seguida para Michael, que assente enquanto come o donut - Como assim "interessada"? Em mim e nos meus irmãos? - pergunto e eles assentem.

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