3. No hospital

15 1 0
                                    

Parece que eu dormi uma eternidade. Quando eu acordei a primeira pessoa que eu vi foi a minha mãe, sentada numa daquelas cadeiras de hospital ao lado da minha cama e os tubos que estavam grudados no meu corpo. Tentei me mexer e doeu. Então reclamei: --Ai!

Nesse momento minha mãe despertou e correu para me abraçar, falando e chorando ao mesmo tempo:

        _ Ângela, você acordou! Minha filha, minha filhinha, meu anjinho. Que bom que você voltou pra mim e me beijava e chorava. Nesse momento a enfermeira chegou e sorriu. Elas estavam felizes! Parece que o meu sono foi mais longo do que eu esperava.

Então minha mãe parou de chorar. E eu, finalmente, pude falar:

        _ Mamãe estou com fome!

Se eu já soubesse o que me esperava, eu nunca tinha falado em comida. Mas eu era apenas uma criança e o meu corpo precisava de alimentos. Mas não tardou para eu perguntar:

        _ Mamãe, cadê o papai?

E não tive respostas. E ela começou a chorar novamente. Só que dessa vez abraçada a mim. A enfermeira que havia acabado de entrar trazendo um prato de sopa. Pediu para minha mãe se acalmar, porque aquilo acabaria me fazendo mal. Deu um copo de água para ela e a tirou do quarto.

E para minha surpresa. Minha dinda Samanta entrou e me deu um beijo demorado. Beijo bom. Calmo. Tranquilo. Daqueles que preparam a gente. E eu perguntei. Mas acho que no fundo eu já tinha a resposta.

        _ Dinda cadê o meu pai? E os meus olhos se encheram de lágrimas.

Ela falou:

        _ Calma pequena. Seu pai não está mais aqui. Papai do céu precisou de mais um anjo e o levou. Agora, ele vai tomar conta de você lá de cima. Do céu.

        E eu chorei. E comecei a falar:

        _ Não dinda. Ele toma conta de mim. Eu sou a sua anjinha. Chama o meu pai. Eu o quero aqui. Quem vai me colocar para dormir. Pede pra ele voltar. Por favor.

E chorando. Orei como os meus pais me ensinaram.  Encostei as mãos e repetia.

        _ Papai do Céu manda o meu pai de volta. Papai do Céu manda o meu pai de volta. Papai do Céu manda o meu pai de volta .

E doeu. Nunca senti uma dor como aquela. Doeu mais do que no dia que eu fui andar de bicicleta sem as rodinhas.

Eu tinha cinco anos. E minha mãe filmava tudo. E o meu pai me segurava na bicicleta dizendo que ia largar e que eu era a menina mais corajosa do mundo inteiro. E ele largou eu andei sozinha, pela primeira vez. Só que passei por cima de uma pedra e cai de testa no chão.

Como eu chorei. Meu pai correu me pegou no colo. Minha mãe já tinha derrubada a filmadora no chão. Buscou o carro e foi dirigindo para o hospital e eu chorando no colo do meu pai, que pressionava o ferimento com sua camisa porque sangrava muito.

Meus pais choravam comigo. Quando nós chegamos no hospital precisei levar seis pontos no corte.

E aquela tinha sido a maior dor que eu havia sentido. Até agora. Porque a dor que eu estava sentindo me tirava o ar. Era como se o meu coração tivesse sido dividido e uma parte tivesse morrido com o meu pai.

Renascer de um anjoOnde histórias criam vida. Descubra agora