Capítulo 1
Os olhares esmeraldas cruzaram-se enquanto o silêncio emoldurava a sala, Vaughn puxou o ar para seus pulmões e respirou pesado em seguida. A névoa que pairava sobre ele e sua meia-irmã, curvada sobre o tampo da mesa em resoluta expressão de tédio, era pesada. Estou farto! pensou, levantando-se em passos lentos e sentando-se sobre a superfície em madeira polida e brilhante, próximo a cadeira em que ela se encontrava a ocupar. Inclinou a cabeça para o lado e fitou-a numa linha fina, estavam ali por um motivo que ele não gostava de fazer reuniões sobre e ela sabia disso.
Colocou o pé na base da cadeira e, com a expressão séria, empurrou a mesma com força. Assistiu o móvel rodopiar e sua irmã buscar equilíbrio. Ambulou até ela e a ergueu, sem muito esforço, contra a envolvente vidrada apertando-lhe as faces de um jeito doloroso.
— Merda, Vaughn! — Scarlett protestou, com dificuldades. — Está a ferir-me!
— É capaz de sentir dor? Que bom! Talvez assim perceba como nossos funcionários se sentem quando os maltrata. — Cuspiu as palavras em entredentes, próximo ao rosto dela.
Scarlett sacudiu-se batendo a parede de vidro em claro desespero, balançou as pernas, com todas as forças, buscando soltar-se um pouco do aperto, mas falhou miseravelmente. Vaughn era cinquenta centímetro mais alto que ela e, com certeza, o mais forte entre ambos nos seus quase cem quilos.Vou matá-lo, pensou, mirando o irmão, que recuou alguns centímetros analisando-lhe a feição afundada em cansaço e vermelhidão, da luta contínua que mantinha para sair da situação em que se encontrava.
Ótimo! Vaughn desdenhou em pensamento, soltando-a logo de seguida como uma bagagem da qual desejava ver-se livre. E assistiu à queda desequilibrada que a mesma teve, sentando com a bunda no soalho da sala de reuniões.De repente Scarlett não lhe pareceu tão altiva, tão cheia de si e tão acomodada numa bolha de superioridade. Sua irmã lhe pareceu humana, frágil e magoada. Ele ignorou e continuou:
— Quero que reflita, que pense sobre como se sentiu neste exato momento sempre que estiver prestes a humilhar quem quer que seja — proferiu de maneira calma, sem se ater a grandes discursos. O recado estava dado. — Pode sair.
Scarlett inspirou fundo e levantou-se tentando recuperar a postura. Após conseguir, caminhou até onde o irmão encontrava-se sentado.
— Isto não vai ficar assim, eu vou te denunciar — vociferou, com o dedo indicador próximo ao rosto dele.
— Está no seu direito, agora saia! — Apontou a porta com o queixo, em sinal claro de que a conversa tinha chegado ao fim.
— Acha-se o fodão, não é? Espera até eu tirar a diretoria de ti. Sua vida vai se tornar um inferno aqui e vai me implorar por misericórdia.
Vaughn abafou um riso e sacudiu a cabeça aquando da ameaça tola da irmã.
— Scarlett, não me faça rir, — deu uma breve gargalhada que logo se tornou numa feição séria e ameaçadora. — Apenas saia! — ordenou, já ficando impaciente.
— Não saio — desafiou. — Acha que pode mandar em mim? Não sou uma subordinada qualquer, sou tão dona dessa empresa quanto você.
— Se é tão dona quanto diz, saberia que a nossa avó está cogitando em me deixar como seu herdeiro direto. — Contou confiante e assistiu a cor no rosto da irmã desaparecer.
— O quê?!! — indagou com a boca tremendo.
— O que ouviu, a Saltzman logo será minha empresa. E será você quem estará a implorar por misericórdia.
Scarlett gargalhou de maneira nervosa, andando de um lado para outro, sem acreditar no que estava a ouvir. Após dedicar anos a empresa, sua avó daria tudo ao seu irmão. Olhou para Vaughn e fechou o rosto, arrependendo-se de não o ter matado quando teve a oportunidade. O que eram seis anos de diretoria dele comparado aos seus quase vinte trabalhando ali?
VOCÊ ESTÁ LENDO
Cacofonia [EDITANDO]
Romance[UM CAPÍTULO AOS DOMINGOS] Vaughn Saltzman não era o homem que você gostaria de conhecer estando inseguro de si. Dono de repostas duras, era tão alegre quanto uma noite tempestuosa e tão triste quanto um verão ensolarado. Odiava seu presente, vivia...