Capítulo 19

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[Penúltimo Capítulo]

  Dizem que a verdade é libertadora, que te deixa mais leve, por mais dolorosa que seja tem que ser dita. Ela não pode ser mantida em segredo por muito tempo, você pode mentir, mas se tiver que descobrir alguma coisa você vai.
  A verdade é tema do pensamento de vários filósofos, é o motivo pelo qual muitos relacionamentos não dão certo, é alvo de debate em várias conversas.
  O que as pessoas não dizem, é que a verdade pode fazer tanto mal quanto a mentira. As vezes quando uma pessoa vive a fantasia de que alguém é perfeito, ela acaba tendo um choque de realidade e as consequências podem ser desastrosas.

  Cheguei na casa do meu pai e me estabeleci no meu novo quarto, eu decidi esfriar a cabeça aqui por uns dias até decidir passar em casa para pegar o restante das minhas roupas e me mudar de vez.
  Descansei um pouco e acordei pela tarde, meu pai apareceu no quarto e disse que tinha uma coisa muito séria para conversar comigo, fiquei com medo da mamãe ter contado para ele o que aconteceu no hotel.
  – Meu filho eu queria te fazer um pedido – diz meu pai com um olhar sério.
  – Que pedido pai?
  – Eu quero que enquanto você estiver por aqui você se comporte.
  – Como assim pai?
  – Nada de ficar dando em cima dos caras da região, ou ficar trazendo homem pra cá.
  – Como é? Quem você pensa que eu sou?
  – Eu só estou dizendo que você tem que ser discreto, nada de ficar dando pinta por aí, esse mundo ainda é muito preconceituoso, nós somos pessoas muito influentes. As pessoas falam.
  – As pessoas ou você? – Fiquei sem acreditar no que estou escutando – Então você quer que eu finja que eu sou gay.
  – Se você quiser continuar morando debaixo desse teto vai ser assim. A Cecília foi muito permissiva com você e agora você está aí desse jeito.
  – Você tem vergonha de mim né?
  – Não foi o que eu disse...
  – Não precisa, está estampado no seu rosto, mas não se preocupe pai, eu vou ficar aqui só por um tempo até eu dar um jeito na minha vida – tentei conter as lágrimas – depois disso eu não vou mais incomodar você. Agora se você me der licença eu preciso ficar sozinho.
  Os dias se passaram e o clima na casa estava pesado, o que salvava o ambiente é a alegria da minha irmã Vitória que sempre puxava alguma conversa para incluir papai e eu, mas então chegou o dia da viagem dela.
  Há algum tempo atrás Vitória fez uma prova para estudar na França e passou, já fazia um tempo que ela falava sobre isso e nossos pais concordaram, então esse momento chegou.
  – Ben senta aqui rapidinho – Vitória me chama para sentar ao seu lado na cama enquanto terminamos de arrumar suas coisas para a viagem.
  – Pois não.
  – Eu sei que você está passando por um momento difícil, eu sei que aconteceu alguma muito séria entre você e a mamãe, mesmo que vocês dois neguem, mas eu quero te dizer que tudo vai se resolver.
  – Eu não tenho mais certeza disso...
  – Você está passando por um momento difícil, anda triste pelos cantos e eu sei que o papai não está lidando bem com sua sexualidade, mas pra mim você é meu irmão e eu te amo do jeito que você é.
  – Obrigado irmã – eu a abraço chorando – também te amo.

  Papai e eu fomos com Vitória até o aeroporto e nos despedimos dela, logo depois pegamos o nosso vôo de volta para o meu antigo lar para que eu pegasse o restante das minhas roupas e minha transferência. Seria uma viagem rápida, tanto que optamos de ir primeiro até a escola, fiquei esperando do lado de fora enquanto meu pai resolvia tudo na diretoria, aproveitei para me despedir de Isabela e André.
  Depois fiquei sentado pensando na vida até que Eduardo aparece e senta ao meu lado, ficamos alguns segundos em silêncio apenas parados um ao lado do outro olhando para frente.
  – Ouvi dizer que você tá indo embora – Eduardo quebra o silêncio.
  – Pois é, meu pai está pegando a minha transferência e eu vou morar com ele agora – falo agora olhando para baixo.
  – O que aconteceu Benjamin? Eu sei que você jamais iria morar com o seu pai.
  – Deixa pra lá, você não precisa se preocupar comigo – falo segurando as lágrimas.
  – Mas eu me preocupo. Me conta.
  Respirei fundo e juntei as forças que eu tinha para contar à ele.
  – Minha mãe descobriu tudo.
  Eduardo ficou calado me olhando e eu continuei:
  – Eu tentei... Tentei não ter mais nada com o Alisson, mas ele ficava insistindo, me chantageando, me encurralando e quando ela descobriu tudo ele conseguiu se safar. Agora minha mãe me odeia e eu não sei se eu posso viver com isso.
  – O Alisson já passou de todos os limites. Depois que eu descobri sobre vocês dois ele foi até a minha casa e ameaçou a mim e minha família caso eu contasse alguma coisa pra sua mãe ou pra alguém.
  – Ele está fora de controle.
  – Nós vamos dar um jeito nisso – Eduardo pega na minha mão – eu vou te ajudar.
  – Não tem nada que se possa fazer, já é tarde demais pra mim, eu acabei com a minha vida. Agora eu tenho que viver com um pai que tem vergonha de mim e uma mãe que me odeia.
  Comecei a ter uma crise de choro e Eduardo começou a me abraçar e ficamos assim por um tempo até eu ir me acalmando aos poucos.
  – Eu tentei te esquecer Benjamin, mas eu não consigo, mesmo que eu tenha ficado com outras pessoas eu nunca deixei de te amar – diz Eduardo limpando minhas lágrimas – eu quero você de volta e vou te ajudar.
  – Como? – Perguntei com uma ponta de esperança.
  – Confie em mim.
  Papai aparece olha para mim e Edu.
  – Vamos Ben que o dia hoje vai ser cheio – diz Papai.
  Dou um abraço em Eduardo de despedida.
  – Espero que você seja muito feliz – digo a ele – adeus.
  Entro no carro e fico apenas observando Eduardo até o carro virar a esquina e eu não ser mais capaz de vê-lo.
  Papai me levou até a minha casa e disse que iria resolver algumas coisas enquanto eu fazia as malas e daqui há algumas horas ele voltaria para me buscar.
  Entrei em casa e o silêncio reinava no ambiente, eu sei que mamãe já está na cidade, porém permanece internada junto com meu irmãozinho. O melhor para todos é que eu arrume minhas coisas e saia antes que ela volte, não quero causar mais problemas.
  Entro no meu quarto, pego uma mala e começo a arrumar minhas coisas até que depois de um tempo eu escuto alguém me chamar.
  – Benjamin – viro para ver quem é.
  Alisson está parado na porta do meu quarto se aproximando de mim.
  – Alisson... Pensei que não tivesse ninguém em casa.
  – Seu pai ligou para a Cecília avisando que você iria passar aqui pra pegar suas roupas – diz Alisson – e como sua mãe já recebeu alta e ficou com o bebê no hospital eu pensei que essa seria a nossa chance.
  – Chance pra quê?
  – Eu quero te fazer uma proposta Ben.
  – Que proposta?
  – Vamos fugir. Vamos largar tudo e vamos embora do país juntos, nós podemos ir pra onde você quiser.
  – Você tá maluco? Você acabou de ser pai, além de disso depois de tudo que aconteceu você acha mesmo que eu fugiria com você? Acabou Alisson!
  – Eu sei que você tá zangado comigo – ele se aproxima de mim – me perdoa.
  – Não chega perto de mim! A única coisa boa nisso tudo é que eu nunca mais vou precisar te ver de novo!
  Alisson se joga aos meus pés e começa a chorar, igual àquele dia que ele fez a mesma coisa com a minha mãe.
  – Por favor Benjamin eu te amo como eu nunca amei ninguém, eu sei que eu errei em te deixar levar toda a culpa quando a sua mãe descobriu, mas eu estou arrependido de verdade, por favor vamos fugir juntos! – Diz ele entre lágrimas.
  De repente eu ouço passos se aproximando de nós.
  – Então era tudo mentira... – mamãe caminha até nós com uma expressão de ódio.
  – Mãe!
  – Amor! – Alisson se levanta do chão e limpa as lágrimas rapidamente.
  Mamãe para há alguns metros de nós, na sua mãe direita ela segura uma arma, a mesma que Alisson tentou atirar no Eduardo.
  – Você vai aprender a não me fazer de idiota – ela levanta a arma e aponta na nossa direção – eu vou te matar!

  Existem milhares de frases a respeito de como você deve falar a verdade, porém nenhuma dessas frases fala sobre as marcas que isso deixa em nós. Nenhuma dessas frases diz que algumas vezes saber da verdade pode transformar amizade em ranço, o carinho em indiferença, o amor em ódio e as vezes pode terminar em tragédia.

Meu PadrastoOnde histórias criam vida. Descubra agora