Butterflies

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1780, Hamilton: 

Vou começar dizendo: Elizabeth Schuyler era uma das pessoas mais doces que eu já tinha conhecido, e poderia de fato gastar várias horas dos meus dias escrevendo cartas para a mesma. Ela era bonita e gentil, sem dúvidas, e além do mais, rica. Se relacionar com qualquer uma das irmãs era o sonho de qualquer homem naquela cidade, ainda mais os pobres, assim como eu.
Naquela manhã de quarta, tinha decidido tomar uma atitude quanto a minha relação com Eliza, e esperava que nada desse errado.

Me encontrei com Washington assim que saí de casa, ambos atolados de trabalhos, correndo contra o tempo. Em resumo, o comércio local só aceitava moeda britânica e a cavalaria sempre se atrasava. Passei horas escrevendo cartas, mandando bilhetes, avisos, tentando resolver e organizar ao máximo todos os problemas que vieram com a guerra. Estávamos fazendo algo grande ali, mesmo tenso e cansado, ainda me sentia elétrico pra enfrentar qualquer coisa.

Depois de terminar todo o trabalho, caminhei até o bar mais próximo, que era onde geralmente todos se encontravam, bebendo até cair. Lafayette estava sentado em uma das mesas com um rapaz que só conhecia de olhar, seu rosto expressava preocupação.

-Então, recebeu alguma notícia? -perguntei, me referindo as milhares de cartas que havia enviado para a França.

-Nesse ponto, apenas rezo pra que nos enviem algum navio -disse, me empurrando um copo de cerveja.

Depois de alguns minutos, um rosto familiar se juntou. John Laurens entrou, também aparentando estar estressado com toda a situação.

-Ei -olhei para ele, apontando para uma cadeira vazia ao meu lado. Ele se sentou, imediatamente pedindo outro copo de cerveja. Revirei os olhos e sorri. Bêbados.

John olhou para Lafayette, perguntando ao amigo o mesmo que antes perguntei. Lafayette apenas balançou a cabeça em negação, soltando um suspiro.
No mesmo minuto, Laurens bate o copo na mesa e se levanta.

-NÓS ESTAMOS DE MÃOS ATADAS! -grita, chamando a atenção do bar inteiro para a nossa direção.

-Laur... -começo, na tentativa de acalma-lo, mas sou interrompido quanto ele sai do bar, batendo todas as portas.

-Ele está certo, não há nada que podemos fazer além de esperar. -diz o homem sentado ao lado de Lafayette.

Dou um sorriso forçado e saio para procurar o revoltado.
Encontro uma figura cacheada sentada na beira da rua, jogada como um bêbado. Me sento ao seu lado.

-Eu sei que isso não é o que você esperava. Não é o que nenhum de nós esperávamos, pra falar a verdade. -suspiro -Mas nós vamos ficar bem. Você veio de tão longe, e finalmente alguém está tomando uma posição de lutar!

-Eu estou cansado de lutar -ele diz.

-Isso é a maior mentira que já escutei! Consigo ver nos seus olhos a sua sede por liberdade, idiota. Tudo isso vai valer a pena no final.

John sorri, tirando a expressão séria e trocando por uma mais leve, no lugar.

-Eu sei, você está certo.

-Eu sempre estou certo.

-Não era isso que eu imaginava ao me juntar a revolução. Talvez eu tenha lido romances demais -riu e segurou minha mão, fixando seus olhos no meu  - Obrigado. Por sempre estar aqui.

Suas mãos geladas tocando na minha, suas palavras. Aquilo parecia significar para mim mais do que deveria, e isso me assustava. 

 -O prazer é todo meu. -pisquei para ele, que revirou os olhos.
-Agora vamos, ou alguém vai ser morto pelo Comandante hoje. 

Ficamos juntos no trabalho, escrevendo ensaios contra a escravidão, páginas e mais páginas, o que só provava o meu ponto: ele ainda tinha a luta dentro de si. Acho que é o que acontece quando a guerra é tudo o que você tem. Eu não tinha uma casa, uma família ou dinheiro guardado, tudo o que eu tinha era minha inteligência e minhas habilidades no campo de batalha, tanto com a espada e com a pena. Quando não se tem muito, se agarra no pouco que tem.
Cada hora que passava era uma prova da nossa amizade e bravura, cortando linhas de abastecimento, roubando contrabando, escolhendo nossas batalhas e lugares para tomar posição.
Vê-lo escrever, riscando os erros ao invés de apaga-los, me dava a esperança que eu precisava. Nossa nação estava em boas mãos.

Após alguns minutos de descanso, John tocou em um assunto delicado.

-Como vão as coisas com a Senhorita Schuyler? -diz, meio ansioso.

Isso acontecia sempre que nossas relações amorosas eram um tópico.

-Vão bem, eu espero. Troquei cartas com ela nessa semana.

Ele abaixa a cabeça, e corta o sorriso.

-Ela é mesmo uma mulher fascinante. E rica, bem rica -completa.

-Sim, rica também -digo com um sorriso constrangedor, esperando cortar a tensão.

-Então, o que está te impedindo?

-Me impedindo de que?

-De se casar com ela.

Engoli em seco.
Nem eu mesmo sabia qual era o problema, a idéia de se casar com ela parecia necessária, porém duvidosa. Que tipo de louco estaria em dúvida quanto a se casar com uma mulher como ela?

-Eu não sei... -disse, tentando contornar o assunto -Ainda é tudo tão recente, mas de fato, hoje mesmo decidi dar um passo adiante. Não me vem a cabeça qualquer pretendente a altura dela.

Dizendo isso, pensei que faria Laurens esquecer o assunto, ao convencê-lo que queria me casar com ela mais do que qualquer outra coisa. O que funcionou, só não da maneira que eu esperava.

A feição de Laurens mudou ao ouvir meu comentário, quase como se estivesse esperando uma resposta diferente. Qual outra resposta eu poderia dar? Era muito difícil saber o que estava acontecendo na sua cabeça na maioria do tempo, o que só me deixava mais confuso sobre muitas coisas. 

-E...com você? -provoco, empurrando seu ombro com o meu. Naquele momento, estava perturbado em meus próprios pensamentos. Eu sabia o que queria que ele respondesse. Que não tinha ninguém, ou que não estava interessado em ninguém. Mas porquê?

-Não tem nada, Alexander, você sabe disso -diz, meio sem graça, com o rosto ainda confuso.

-Você vai encontrar alguém que faça seu coração bater mais rápido -disse, na tentativa de contornar tudo aquilo, mas sem de fato querer dizer aquelas coisas. Nunca tinha imaginado Laurens com alguém, só a idéia fazia minha barriga doer.

-Sim, se essa pessoa não pertencer a outra primeiro. -ele respondeu, simples assim, abaixando a cabeça ao encarar o chão.

Nesse momento, uma explosão aconteceu, tanto em meu estômago quanto na minha cabeça, imaginando os diferentes significados que aquela frase poderia ter, de uma só vez.
O que estava acontecendo?
Pela primeira vez, estava sentindo algo que nunca tinha sentido antes, coisas que nem mesmo eu tinha o poder de entender.

Lams: Just The Two of UsOnde histórias criam vida. Descubra agora