Tarde Te Amei (Conto)

5⃣- Não Importa o Lugar!

“Tarde te amei, beleza tão antiga
e tão nova, tarde te amei,
chamaste e clamaste
e rompeste a minha surdez.
Brilhaste, cintilastes
e afastastes minha cegueira.
Exalaste o Teu perfume
e eu respirei e suspiro por Ti.
Saborei-te e agora tenho
fome e sede de Ti.
Tocaste-me e inflamei-me
no desejo de Tua paz”.

Agostinho de Hipona

Eu escrevi aquelas palavras no meu diário e levantei a cabeça respirando aquele ar puro. Sentindo a realidade daquelas palavras. Eu demorei tanto para encontrar meu Senhor, mas depois que o achei, não queria mais nada. Avistei a igreja que já havia crescido e os novos intercambistas brincando com as crianças. Já se haviam passado três anos desde a minha vinda para Guiné Bissau e eu não quis mais voltar. A agência de intercâmbio acabou me contratando para tomar conta da base aqui.

Nesse tempo só tive contato com minha mãe que informou minhas amigas e ninguém mais. A minha vida e família estava ali na África agora. A Sra. Abigail se tornou minha discipuladora, mãe e confidente, éramos inseparáveis. O Senhor me ensinou tanto. Eu larguei todas as minhas meninices de menina criada em cidade com mordomia e aprendi a cozinhar, lavar roupas, a servir as senhoras da comunidade. Comecei a ensinar as crianças na escolinha e essa foi a parte mais gratificante e também assustadora. Eu não sabia ser disciplinada e ter autoridade e por meio de muitas orações e instruções consegui dominar minha turma. 

Ele encheu-me dele, não foi fácil, mas agora eu podia colher os frutos de quem escolheu confiar nas promessas das escrituras. Quem escolheu esperar somente no Senhor Jesus e dEle tirar sua alegria.

Eu não tinha mais planos ou mesmo expectativas, apenas vivia um dia de cada vez, vencendo o mal de cada dia. Finalmente encontrei a paz e a alegria que tanto buscava. Meu coração havia aprendido a se firmar somente no Senhor. Aos 30 anos eu pude dizer que o havia encontrado. Quão tarde eu o amei, mas, enfim, verdadeiramente o achei e nEle me deleitei.

– Srta. Isis, o grupo chegou, eles chegaram! – O pequeno Pablo veio ao meu encontro empolgado.

– Vamos lá, então! – Levantei-me do assento atrás da casa da Sra. Abigail e corri em direção a porta de entrada do vilarejo.

Todas as crianças e os demais moradores estavam na expectativa da espera do novo grupo de missionários. Eu me escorei numa árvore ao meu lado e avistei uma van branca se aproximar. Ela parou e a porta se abriu. Um por um começaram a descer, eram mulheres e homens nem tão jovens como esperávamos, eles olhavam o local com os olhos comprimidos por causa do sol. Em último lugar desceu um jovem rapaz com um coturno preto, uma bermuda bege, uma blusa polo e quando mirei em seu rosto, os olhos azuis dele inundaram a minha alma.

– Muito prazer, nós somos o grupo “Um Litro de Luz”. – O ecoar daquele nome na voz do senhor de cabelos grisalhos fez o meu coração ir ao pico e voltar.

“Meu Deus do Céu!”.

Era ele. Era Matheus bem na minha frente. Nossos olhares se prenderam um no outro como se tudo tivesse sumido por um momento.

Ele começou a caminhar, mas eu não conseguia me mover, não tinha forças para dar um passo sequer. Matheus vinha em minha direção e sem eu me dar conta, ele me arrebatou em seus braços, não se importando com nada e nem ninguém.

– Eu te encontrei! – ele disse em meu ouvido.

Meu coração se aqueceu com aquelas palavras. E depois de me atentar para aquele gesto, eu, finalmente, o abracei com todas as minhas forças. Depois de uns longos minutos, nos afastamos.