02 | Sinal de Alerta

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Atualmente, trabalho em um hotel no topo do vilarejo de Oia. Kynthia, a dona, me cedeu o emprego quando me encontrou deitada em um dos bancos na frente do hotel. Era noite e fazia muito frio, as poucas roupas que colocara na mochila não eram quentes o suficiente, ainda mais com o fraco sereno que caia sobre mim.

- Em que posso ajudá-la? - perguntou-me. Quando finalmente sentei e olhei para ela, percebi que a mesma carregava uma caneca fumegante. Ela corria os dedos por seus cabelos grisalhos demonstrando certa impaciência.

Só então percebi que tinha adormecido no banco. Torci para que meus cabelos não estivessem tão bagunçados e nem minhas roupas tão amarrotadas. Passei as mãos no rosto, totalmente constrangida.

- Você precisa de uma ajudante? - falei tão rápido que mal tive tempo de respirar - Eu posso fazer qualquer coisa. Só preciso de um lugar pra dormir.

A mulher me mediu da cabeça aos pés. Olhou para minha mochila rapidamente e depois voltou seu olhar para mim. Parecia ponderar sobre o meu pedido. E inesperadamente, estendeu a caneca que estava em suas mãos, oferecendo-me.

- Como você se chama, mocinha? - ela parecia estar interessada em toda aquela cena.

- Maria. Maria Rodríguez. - suspirei enquanto negava a caneca. Tentei fazer a minha melhor cara de triste, de repente ela se compadecia de mim. Quem sabe?

- Vamos entrar. Você pode passar a noite, mas amanhã quero que me mostre o que sabe fazer, e aí decido se fica ou não. - ela falou seriamente, olhando firme para mim. Balancei a cabeça, tentando expressar o quanto estava agradecida.

Logo depois daquela noite, mostrei tudo o que poderia e conseguia fazer. Meu trabalho era arrumar os quartos - ou tudo o que precisava ser arrumado - e ficar na cozinha, como ajudante. Aos poucos, fui ganhando a confiança de Kynthia e de todos os empregados do hotel.

Eu sou eternamente por Kynthia ter me dado uma chance naquela noite. Se não fosse por ela, teria voltado para a Espanha ou ainda estaria vagando pelo mundo, sem um lugar para chamar de lar.

Ela era uma mulher de sessenta e nove anos, sozinha, com seus cabelos loiros e grisalhos e pele enrugada. Gerenciava o hotel por conta própria, não tinha família por perto. Em uma noite de conversa, contou-me que sua filha e seu marido morreram num acidente de barco e, por isso, nunca mais saiu da ilha.

Com o tempo eu percebi que mãe não é só quem te coloca no mundo. É quem te acolhe quando você mais precisa, quando está com medo. É quem cuida de você quando mais precisa e, ao passar dos anos, enxerguei em Kynthia tudo o que não enxergava em minha mãe.

E logo depois de me estabilizar, mandei uma carta para Espanha avisando onde eu estava e que tudo andava bem. Não obtive resposta, não que eu estivesse esperando uma, mas no fundo aguardava por qualquer retorno.

Enquanto os anos foram passando, fiz um curso de turismo e hotelaria para que minha ajuda e meu trabalho chegassem a um nível maior dentro do hotel. Além de falar inglês e espanhol - especialmente -, aprendi o grego, língua materna da ilha. Aos poucos, consegui chegar à recepção do hotel. Kynthia também foi me preparando e testando para esse cargo. Não era um cargo difícil, mas um bom atendimento é fator crucial para a estadia dos clientes.

O movimento estava calmo hoje. Era início de setembro, o que significa que a alta temporada está acabando e que a maioria dos turistas está indo para suas casas. Alguns quartos do hotel já tinham sido desocupados. A melhor época para viajar pela Grécia é durante o verão europeu, julho e agosto são os meses menos chuvosos e água do mar fica mais quente e transparente.

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