Cave In

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Fazia quase três anos desde a morte de Keith Harvey.

Não morava mais em Cannon Beach, ainda que meu pai ainda estivesse lá, como sempre, em nossa bela casa de pedra à beira-mar, hospedando surfistas, guiando turistas e ensinando criancinhas a se equilibrar em cima de uma prancha. Pouco antes de Keith morrer, fomos ambos aceitos na Western Oregon University, em Monmouth, que ficava há apenas umas três horas de Astoria. Eu queria estudar biologia marinha, ele, economia. Depois da morte dele, eu acabei indo, mas fui estudar Ciências Moleculares. Estranho, pelo menos para mim.

Mas eu nunca mais fui capaz de chegar perto do oceano.

Então ser bióloga marinha estava meio que fora de cogitação.

Desde que fui para a faculdade, nunca mais havia voltado para Cannon Beach, nem para visitar meu pai. Ele costumava vir para Monmouth me ver nos seus dias de folga e no natal e, apesar de sempre me pedir para ir para casa nas férias de verão ou para o dia de Ação de Graças, eu sempre arranjava uma desculpa e nunca ia.

Ainda doía demais.

Sempre doeria demais.

Logo que conheci Keith Harvey e seus lindos olhos, percebi que ele seria uma pessoa especial para mim. O único que eu poderia amar por toda a vida. Você sabe, ele era minha alma gêmea, a tampa da minha panela, minha metade, meu chinelo velho, meu destino, meu bachert* ou qualquer um desses termos clichês. Apaixonamos-nos, sim. E éramos um casal estranho aos olhos dos outros, mas estranhamente certos para nós mesmos. Apesar de toda aquela capa de garoto mau, meu Keith era apenas tímido e inseguro. No fundo, era um garoto gentil e amável, que adorava sentar na areia e me ver nadar. Ele adorava também o gosto de sal na minha pele quando nos beijávamos, adorava enterrar as mãos em meus cabelos embaraçados e sentir a areia nas costas quando nos deitávamos na praia deserta.

E eu o amava. O amei mais do que achei que meu pequeno coração fosse capaz. Era como se eu prendesse a respiração até o momento em que o via, caminhando em minha direção. Então, eu respirava e sentia a vida fluir novamente por meu corpo. Meu coração pulava dentro do peito só por vê-lo sorrir para mim, mesmo no meio do refeitório da escola, separados por uma multidão. Eu não me cansava dos seus lábios, das suas mãos, do seu corpo. Mas também não me cansava de suas piadas sem graça e das suas ideias mirabolantes sobre a nossa futura vida juntos. Eu ria do seu mal humor quando seu time de basquete preferido perdia e o animava, levando-o para ver as estrelas na praia. Deitávamos na areia e ficávamos contando os minúsculos pontos brilhantes no céu, as mãos apertadas juntas. Ele não soltava minha mão, mesmo quando nossas palmas começavam a suar. Eu gostava disso. Amava sentir que ele não queria me soltar nunca, que precisava estar sempre me tocando, como se para saber se eu estava mesmo ali.

No entanto, o que eu mais amava sobre ele ainda continuava sendo os seus olhos. De dia, eram tão claros que eram quase verdes, como o oceano brilhando sob o sol. De noite, escureciam até um azul intenso, da cor das ondas escuras que batiam nas pedras. Eu amava fitar aqueles olhos, amava tentar descobrir os pensamentos por trás deles, tentar compreendê-los. Podia olhá-los para sempre. Mas o mais incrível era simplesmente ser alvo daquele olhar. Keith tinha um jeito tão único de pousar aqueles olhos em mim, que, mesmo depois de muito tempo, ainda era capaz de me ter arrepiada. Ele parecia que estava sempre me fitando, e seus olhos eram como uma tempestade no mar, então quando ele percebia que eu o estava vendo, sorria, a luz chegando até seus olhos como a calmaria após a tempestade.

Eu sabia que podia passar a vida toda tentando decifrar Keith Harvey e seus lindos e enigmáticos olhos. Sabia que gostaria de fazer isso. Sabia que, com ele, minha vida nunca seria cansativa ou monótona. Sabia que nunca ninguém me faria sentir as coisas que ele me fazia sentir.

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