Capítulo 1 - O Bosque

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         Acordei com a luz do sol incomodando meus olhos e ligeiramente tonta, como que se eu estivesse girando e não percebesse. Embora eu ainda me sentisse cansada nos primeiros instantes, imediatamente fiquei em alerta quando vi o céu acima de mim, não o teto de meu quarto. Também, me sentindo desconfortável, notei que não estava num colchão, e sim em cima das duras raízes de uma árvore.

         Meu coração acelerou-se em uma mistura de pânico com nervosismo. O que havia acontecido?

         A possibilidade de eu ter sido sequestrada passou por minha mente, mas nenhum sequestrador iria deixar sua vítima intocada e simplesmente deixar ela solta em qualquer lugar. Pensei que talvez eu tivesse passado por uma crise de sonambulismo, porém era certo que eu não conseguiria passar da portaria do prédio caso isso ocorresse. Meu cérebro loucamente tentava achar uma causa lógica para eu ter acordado fora do meu quarto e provavelmente longe de casa, mas simplesmente não havia explicação plausível alguma.

         Levantei-me, então. Se eu não conseguia saber o porquê de estar aqui, pelo menos tinha que identificar aonde que eu estava saindo daquele bosque que me cercava.

         Andei por um longo tempo, com meu estômago reclamando cada vez mais por eu não ter ingerido nada desde a tarde do dia anterior e os meus lábios ressecando pela sede. Eu estava mais do que perdida, mas seguia em frente, tentando achar algum sinal de ocupação humana para tentar me localizar. Lamentei por não estar com meu celular. Ele seria muitíssimo útil.

         Depois do que me pareceu quase uma eternidade, achei uma pequena estrada no meio do bosque, praticamente uma trilha, porém melhor que nada. Mas eu já estava exausta, com fome e com sede. Tudo o que eu queria era me deitar de novo em minha cama e só sair de lá no dia seguinte, de preferência. E pouco depois a tontura voltou, para completar com a merda que minha situação estava. Parei no lugar em que estava. Tentei respirar fundo e tentar seguir em frente, mas parecia que toda minha energia tinha acabado.

         Ouvi o barulho do que poderiam ser cascos, mas pareciam longes demais para que eu me importasse. Logo em seguida, tudo escureceu.

         ___

         Assim que Edward viu a figura estendida na trilha, ele puxou as rédeas da montaria e desmontou, indo analisar de perto. Tinha visto alguém cair à distância, e estava curioso para saber quem era.

         Os cães cheiravam curiosamente o corpo. Era uma jovem, provavelmente quase adulta, miúda e de corpo ligeiramente esguio, porém bonita, que usava roupas meio estranhas e parecia estar em sono profundo. Naqueles tempos sombrios, ela bem poderia ser mais uma das várias vítimas da peste negra, mesmo com a ausência de sinais visíveis da doença.

         Mas, após um instante observando-a a uma certa distância, viu que a jovem respirava lentamente, pela movimentação no peito. Não estava morta: apenas inconsciente. No delicado rosto da jovem, percebeu os lábios ressecados e as olheiras profundas nos olhos. Talvez ela estivesse exausta e sedenta por estar há um longo tempo fugindo de alguém.

         Segundos depois, os companheiros de caçada estavam ao lado de Edward, confusos por ele ter resolvido tão subitamente galopar e parar ali. Em seguida, viram a garota inconsciente.

         — Por Deus, por qual motivo alguém estaria aqui em terras de caça? — um deles perguntou.

         — Talvez ela esteja fugindo de alguém — Edward apontou. — Observem que ela parece ter andado por um longo tempo.

         Seus amigos e companheiros de caça permaneceram em silêncio, alguns demonstrando ansiedade e um pouco de impaciência para continuar a caçada, esperando o que o príncipe faria em seguida.

         Aquela garota era uma desconhecida completa, uma face que ele nunca tinha visto em momento algum, nem mesmo a distância. Talvez ele devesse deixar ela na trilha e fazer com que o destino tomasse conta dela. Mas Edward não era esse tipo cruel, pelo menos não com donzelas bonitas e desamparadas.

         — Levaremos ela para o palácio.

         Um dos companheiros, um jovem cavaleiro, indignou-se.

         — Levar essa garota? Viraste um monge agora, ajudando os desamparados?

         — O próprio Cristo disse que todos devem ajudar o próximo.

         — Mas e a caçada? Vamos acabar sem nem termos realmente pegado algum animal? — outro perguntou.

         — Vamos. Agora, me ajudem a colocar ela em cima do cavalo.

         Os outros cavaleiros estavam surpresos e irritados com aquela situação toda, mas não falaram mais nada em objeção à decisão de Edward, embora ainda trocassem sussurros irritadiços entre eles.

 Com o máximo de cuidado que conseguiu, colocou a jovem na sela e depois subiu e segurou as rédeas do cavalo, envolvendo-a com os braços e impedindo que caísse. Assim que tudo parecia certo, partiu num passo moderado, logo sendo seguido pelos cães e companheiros de caçada.

___

 Na próxima vez em que eu acordei, a primeira coisa que percebi, com a visão ainda meio nublada, era que estava em movimento, ou que tudo havia se tornado um borrão, não tinha certeza.

 Enquanto lentamente recuperava meus sentidos, percebi que estava em cima de um cavalo. Braços fortes me envolviam e eu estava apoiada em algo, ou alguém, pois conseguia sentir a respiração de uma pessoa nas minhas costas.

 Eu ainda estava tonta e confusa naquele momento, não conseguindo formular alguma teoria do que estava acontecendo. A minha visão aos poucos ia se definindo, até que pude ver que estávamos passando, à uma certa distância, por uma vila ou um trecho afastado de uma cidade.

 Poucas pessoas estavam ali, mas notei que a maioria usava roupas estranhas, com um estilo estranhamente antigo, mas não dei bola para isso, e sim para a quantia considerável de corpos que estavam sendo recolhidos na rua, alguns com manchas que podiam ser vistas até de onde estávamos.

 Embora eu quisesse fazer perguntas e descobrir aonde eu estava e o que estava acontecendo, ainda me sentia tonta e enfraquecida demais e simplesmente adormeci novamente nos braços do cavaleiro anônimo.

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