Ébano - Parte 1

338 48 511
                                    

ADONIS NARRANDO
Belo Horizonte, 2019

Estou em um lugar lindo. É realmente um paraíso. É um bosque com as mais belas flores. Um rio de águas cristalinas. E o melhor de tudo, não tem mais ninguém aqui.

Mas em um minuto, o despertador toca. A vida começou novamente e meu belo sonho se desfez em questão de segundos. 5 da manhã.

É hora de aturar tudo novamente. Às vezes me pergunto se o propósito da vida de todos é ser feliz, porque isso é a última coisa que sou.

Percebi que ainda não me apresentei.

Sou Adonis. E segundo algumas pessoas, esse nome é condizente a minha beleza. Tenho a pele branca, olhos castanhos, cabelos pretos e as sobrancelhas levemente grossas. Sou meio baixo e bastante fraco, pois antes de ter sido adotado eu não tinha muito o que comer. Então sempre fui meio desnutrido. Tenho 17 anos.

Meus pais me adotaram quando eu tinha 9 anos. O orfanato era um lugar terrível. As outras crianças eram muito más. Sempre que os outros meninos iam jogar bola, ou brincar, eles não deixavam eu ficar junto deles. Diziam que eu era muito gay. As meninas falavam que eu era esquisito.

Nunca tive o prazer de saber o que é um amigo. Nem na escola as pessoas gostam de mim. Parecem ter uma aversão a pessoas como eu.

O que os meninos diziam era verdade.

Sou gay.

O que as meninas diziam também é verdade.

Sou esquisito. Sou quieto, raramente converso, não fico correndo atrás de meninas, não me visto como a maioria dos meninos, não jogo bola na educação física, prefiro ler em vez de ver filmes. Sou um típico nerd. Nunca sou chamado para as festas.

Esse sou eu.

E agora tenho que me vestir para ir para a escola. Me arrumo silenciosamente para não acordar ninguém. Meu pai trabalha de vigilante noturno. Então ele chega lá pras 8 da manhã, nessa hora já estou na escola. Ele pega serviço às 7 da noite. Ele dorme durante o dia, não podemos acordá-lo. Minha mãe é enfermeira. Pega plantão a noite também.

Muitas vezes quem fica comigo são o Rubens e a Sara. Eles são os filhos biológicos dos meus pais. São gêmeos de 18 anos. Eles pediram para que eu não os chame de irmãos. Pois eu sou só um garoto que mora com eles, e nada mais que isso.

Às vezes, penso que eu só estou aqui por causa da minha mãe. Meus irmãos não gostam de mim, e papai é sempre muito rude e grosso comigo.

Mas agora é hora de aturar algo pior.

A escola. O bullying. As agressões. A segregação. A humilhação.

Me visto rapidamente e bem discreto. Pego uma goiaba na geladeira, e saio. Eu vou a pé. Minha escola não é muito longe. Saio pelo caminho mais longo, dou uma volta pela Pampulha. Depois tomo o caminho para minha escola. Rubens e Sara dizem que eu devo sair antes deles. Não podem saber a que a mãe deles adotou o garoto mais esquisito da escola.

Vejo em meu relógio que falta 7 minutos para a aula. Vou para o banheiro e espero até que falte um minuto. Com o professor dentro da sala, Leo não tem coragem de me bater.

Quando entro no banheiro para me esconder, Leo e seus amigos estão lá.

- E aí, sua bicha? Eu fiquei sabendo que você estava se escondendo aqui antes das aulas pra não apanhar. Melhor achar outro esconderijo. - Ele fala com o tom aterrorizante.

Tento ir para a porta, mas Rodrigo, um colega de Leo, fica entre mim e a porta, e não me deixa passar.

- Por favor, me deixem em paz. Nunca fiz nada de mal para você. Eu nunca fiz nada de mal para ninguém. Por favor parem de me maltratar. - Eu peço desesperado.

ColoursOnde histórias criam vida. Descubra agora