Os olhos dela me observavam atentamente enquanto eu continuava estática. Passei tanto tempo imaginando como seria esse dia que, agora que estava acontecendo, eu não sabia como agir. Acomodei-me no sofá com a postura reta, coisa que eu não fazia em casa, e soltei um pigarro antes de começar a falar.
-Ahn... Primeiramente, eu gostaria de dizer que é um prazer imenso conhecer a senhora.
- Você, Sophie. Minha idade já é avançada, mas não precisamos de tanta formalidade. Afinal, somos apenas duas escritoras batendo um papo, certo?
Ela dizia cada palavra com extrema tranquilidade e, apesar de toda euforia que eu estava sentindo, não conseguia deixar de achar um pouco estranho pelo fato de eu ser uma desconhecida sentada no sofá da biblioteca de sua casa, mas apenas tentei encarar a situação com naturalidade.
- Certo. - Não pude impedir um riso bobo de sair junto com minha resposta.
- Então, o que você quer saber? Perguntou-me de forma direta, como eu já imaginava que seria.
- Bom, eu tenho algumas perguntas aqui e gostaria que você...
- Jogue-as fora. – Interrompeu-me antes mesmo que eu terminasse a sentença.
- O que?
- Olhe, - começou a falar enquanto se recostava em sua poltrona, numa postura totalmente fina, porém, natural. - já me entrevistaram diversas vezes para me perguntar sobre aquela época e você não irá conseguir nada autêntico com as mesmas perguntas padronizadas. Aprendi que, algumas vezes, uma boa conversa revela mais do que um monte de questionamentos. Então, pode onde começamos?
- Pelo começo, eu acho. - Me martirizei durante alguns instantes pela resposta boba, mas, a julgar pela risada contida que Camila soltou, acho que não foi tão boba assim.
- Certo, pelo começo.
Nova York, Junho de 2020
Não surta, Camila.
Eu repetia mentalmente dentro do táxi, tentando me acalmar antes daquela reunião. O filho da puta do editor chefe me diz que uma reportagem de quinze páginas que irá estampar a capa da revista daqui a dois meses será minha e não diz mais nada sobre o assunto.
- Vai se foder, Scott. - Resmunguei.
Uma lição importante aprendida nesses dois anos trabalhando é que as suas chances de continuar no emprego são diretamente proporcionais à sua habilidade de xingar seu chefe pelas costas, mas manter um sorriso complacente na frente dele.
Entreguei o dinheiro ao taxista e adentrei ao prédio andando em passos largos, tentando evitar qualquer contato com as pessoas que andavam apressadamente ao meu lado.
Fui pela escadaria para poupar tempo e tentar me acalmar enquanto subia os lances, tentando arrumar a manga do meu sobretudo e ajeitar meu cabelo. Já no quarto andar, parei para me olhar no reflexo refletido na grande janela de vidro.
Lá embaixo, uma multidão andava apressadamente como soldados, indo em direção a mais um dia de labuta. Me incomodava todas aquelas pessoas. Não as pessoas, em si, mas elas andando apressadamente, rumo a um sistema que as fazem trabalhar até a exaustão, programadamente sem sequer perceber. A verdade é que nós arquitetamos a sociedade e, em resposta, ela nos rege de acordo com suas regras e, por mais que pareça uma equação fácil, a partir dai, não há nada que possamos fazer.
A movimentação de algum estagiário passando apressado com um copo grande de café do meu lado me tirou de meus devaneios e eu, apressadamente, me dirijo até a sala de Scott. Dou três batidas na porta e a abro após ouvir um "entre!" abafado.

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Miami Blue
Storie d'amore"A cor azul significa tranquilidade, serenidade e harmonia, mas também está associada à frieza, monotonia e depressão. Simboliza a água, o céu e o infinito." Camila Cabello, uma jovem jornalista, se contenta em ser boa. É uma boa profissional, boa f...