A República

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Acho que já fazia meia hora que eu estava tocando o interfone. Era impressão minha ou as pessoas que passavam estavam prestando atenção demais nas minhas roupas surradas?! Abaixo a cabeça envergonhada e desejo que naquele momento eu fosse intangível, livre de olhares e julgamentos.

Tento o interfone mais uma vez. Dois segundos depois um bipe e uma voz ecoam.

— Se for trote, vaza. Já é ruim o bastante ninguém querer ficar aqui, não precisa zoar.

Fico sem reação com voz destemida da garota do outro lado da linha e demoro para dá uma resposta até que o bipe ecoa de novo.

— Hello, tem alguém aí? Ok então.

— N-n-não faça isso! — digo gaguejando. — Por favor não desligue. Estou aqui pela vaga na república. Me chamo Genevieve e acabei de chegar na cidade.

A pessoa do outro lado da linha não responde, mas o portão do pequeno apartamento se abre permitindo eu entrar. O prédio era antigo e havia rachaduras por todos os lados seguindo o teto até às paredes das escadas. A porta de carvalho antigo continha o famoso olho mágico. Bato três vezes na porta e ninguém responde ou abre. Na quarta tentativa o cômodo é aberto.

Não sabia bem o que esperar ou quem esperar, mas o que eu vi me surpreendeu. O apartamento embora simples era lindo por dentro. Os móveis em estilo vintage e luzes de neon aqui e ali preenchiam a pequena sala. Em destaque tinha uma televisão quebrada com uma frase pichada: Foda-se o mundo.

A dona do cômodo era linda como a decoração. Sua pele morena era tão intensa como um chocolate da melhor qualidade. Seus cabelos castanhos caiam em cachos perfeitos na altura do quadril e seus olhos do mais vívido azul.

— Pode entrar, eu não mordo — disse ela — Só se você quiser.

Eu entro e ela logo em seguida bate a porta atrás da gente. Sento em uma poltrona rasgada de frente para a televisão quebrada. E ela se senta no sofá vermelho.

— Sou Genevieve. — digo. — Como eu falei lá em baixo pelo interfone, estou aqui pela vaga na república. Acabei de chegar na cidade, não tenho parentes próximos e nem posso pagar muito caro pela estadia.

— É um prazer conhecê-la Genevieve, sou a Annie. — diz ela estendendo a mão. Levanto e aperto minha mão contra a dela e depois me sento novamente. — Faz tempo que ninguém tenta preencher a vaga dessa república. Estou deveras surpresa com isso. Mas enfim, tenho que conhecer minha talvez colega de república. Me conta a sua história.

Fico um pouco tensa.

— Minha história?

Annie faz que sim com a cabeça.

— Tá bom... — começo — Eu sou de uma cidadezinha no sul do país. Moro com meus pais e com meu irmão mais velho. Passei a minha vida toda vivendo a sombra do meu irmão. Embora pobres e com poucos recursos meus pais fizeram de tudo pelo meu irmão e sempre me deixaram de lado. Nem roupas compravam para mim, eu ganhava tudo do bazar da igreja. — Annie percebe que fico emocionada em falar sobre minha família e sua expressão se suaviza. — Por isso resolvi vim para Minas Gerais tentar fazer faculdade aqui. A bolsa que eu consegui é de cinquenta por cento e por isso preciso de um emprego urgentemente. Resumindo isso é tudo.

Annie relaxou na poltrona e eu aproveitei para fazer o mesmo. Jogar essas informações assim no ar me deixaram tão descarregada que levaria tempo para relembrar o passado mais uma vez.

— Como pretende pagar a república? — perguntou a garota.

— Vou adiantar dois meses — respondo — Mas se eu não conseguir um emprego infelizmente vou ter que desistir de tudo.

— Você foi sincera Genevieve e eu amo sinceridade. As pessoas julgam meu apartamento por está caindo aos pedaços, julgam minha aparência e julgam minha opção sexual, mas vejo uma empatia forte com você. Eu quando comecei fazer arquitetura achava que meu mundo iria cair, meu pai se matava de trabalhar para que nada me faltasse aqui e eu dei valor ao esforço dele.

Annie parecia bem orgulhosa de si mesma. Dava para ver o orgulho em seu rosto, ela brilhava como uma supernova.

— Agora eu faço design e dou aula em algumas matérias de arquitetura. — continuou ela. — Não é muito, mas o suficiente para me mandar estável.

— Deve ser muito bom ter essa força de vontade que você tem.

Annie surpreendente se levanta e entrelaça minha mão na dela. O calor do corpo dela invade o meu, tão gentil e acolhedor.

— E você pode ter Gen. E eu vou te ajudar no que for preciso. até mesmo em se prostituir — disse ela.

Ela comentou o final rindo e debochando, mas eu corei instintivamente. Alguns dias atrás tão hipótese passou pela minha cabeça. Mas isso quebra valores e princípios que estava disposta a erguer. Edificar uma personalidade e moral que fizessem de mim uma mulher forte e empoderada.

— Deus todo poderoso! — falo — Eu não teria tamanha coragem para fazer algo do tipo.

— Então eu nem devo falar do aplicativo do momento. Já que baixou a Santa Maria Madalena em você. — diz Annie.

— Que aplicativo?

Annie sorri maliciosamente.

— Um aplicativo para encontrar Sugardaddy. Onde você se torna uma Sugar Baby e sai com coroas ricos que estão dispostos a te dá tudo que você quiser em troca de carinho e atenção.

Começo a rir debochando, mas ela confirma com a cabeça que aquilo tudo era sério. Queria questionar o motivo de alguém desperdiçar dinheiro assim embora tenha maluco de todos os tipos.

— Annie não me diz que você já usou isso?

Ela começa a rir baixinho.

— Não consegui essa decoração de graça meu amor.

Pego a almofada mas próxima e jogo nela.

— Quem sabe um dia eu também ceda a isso — provoco — Ser uma... como é mesmo o nome? Sugar Baby?

Annie rir e eu dou risada com ela. Ela realmente é uma pessoa que você adotaria como melhor amiga facilmente, isso se eu soubesse o que é ter uma melhor amiga. Ela sai da sala e entra em um pequeno corredor e volta com dois copos de plástico e um garrafão com um líquido roxo. Seu rosto esboçando o mais safado sorriso.

— O que é isso? — pergunto.

A garota enche os copos e me entrega um. O cheiro forte evidencia que se trata do vinho mais barato já produzido.

— Isso honey é a bebida da vitória. — diz Annie animada. — Vamos brindar pela minha nova colega de república e pela união de nossas almas. Vamos juntas enfrentar os machistas, misóginos, homofóbicos entre outros e é claro ao seu talvez emprego na loja da minha tia.

— Está falando sério? — não consigo conter a felicidade.

Annie ergue o copo e eu faço mesmo.

— Claro que estou! Mas se eu conseguir o emprego você vai ter que se inscrever no aplicativo.

— Tá bom.

Brindamos os copos e antes de bebermos minha colega de república grita:

— A Genevieve e seu futuro Sugardaddy!!!

Bebemos e marcamos ali o início de uma grande amizade.

O Sugar Daddy Mandou Onde histórias criam vida. Descubra agora