Capítulo 1

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Annabelle andava sem destino pelo centro comercial da cidade que a havia acolhido tão bem pelos últimos meses lamentando o fato de em breve precisar abandoná-la. Sua estadia já havia extrapolado os planos iniciais quando ela concluiu o curso de Ciências Biológicas na Universidade Federal de Juiz de Fora e conseguiu emprego em um laboratório de análises de histocompatibilidade. Agora, eram dois os motivos para precisar voltar a morar com os pais em uma pequena cidade no interior de Minas Gerais.

O mais forte era o fato de não ter mais como se sustentar financeiramente, pois com a redução do quadro de funcionários no laboratório onde trabalhou por um ano, ela havia perdido sua única fonte de renda. O outro motivo foi ter flagrado seu agora ex-namorado, aos beijos com outra mulher na sala dos funcionários do banco onde ele ocupa um dos cargos de gerência.

Seu olhar vagava pelas fachadas das lojas sem se prender a nenhuma, até o cansaço conduzi-la para dentro de uma cafeteria graciosamente encaixada entre uma livraria e uma loja de sapatos de grife próximo à entrada de um shopping. O letreiro em madeira sobre a porta, as mesinhas do mesmo material, em cor mais escura, com quatro cadeiras em volta e o ambiente em estilo retrô, visíveis através da vitrine, era convidativo demais para Annabelle procurar por outro lugar onde descansar e fazer um lanche.

O estabelecimento estava quase vazio, provavelmente pelo horário — ela imaginou. A maioria das pessoas ainda deveria estar ocupada trabalhando. Esse pensamento fez a mulher se lamentar por não estar mais na mesma situação. Das sete mesas, apenas duas estavam com clientes e os quatro banquinhos de frente para o balcão estavam livres. Ela escolheu uma mesa decorada com uma pequena toalha e um arranjo delicado de flores num canto entre a estufa de pâtisserie e a vitrine da loja. Enquanto escolhia de longe uma das guloseimas, um homem usando um avental bege com o nome da cafeteria bordado em azul; Art's Café – se aproximou dela.

— Posso interromper seus pensamentos? — perguntou ele com um sorriso no rosto.

— Tudo bem, não está interrompendo nada — respondeu Annabelle deduzindo com base na própria idade que ele não deveria ser muito mais velho do que ela e, portanto, não deveria passar dos 30 anos. — Estava apenas escolhendo um daqueles. — Ela apontou para as rosquinhas.

— O doughnut de chocolate com recheio de morango é um dos meus preferidos, se me permite a sugestão — disse ele sem esconder a animação.

— Gosto da mistura de sabores, acho que vou aceitar a dica... — Ela apertou os olhos para ler o nome no crachá fixado no avental. — Felipe.

— Ótima escolha!

Os dois trocaram um sorriso.

— Posso sugerir também um café para acompanhar? Os grãos são da fazenda da minha família, que fica perto daqui, e é a nossa especialidade. Atrevo-me a dizer que é o melhor de Juiz de Fora!

— Uau! Acho que não posso sair da cidade sem experimentar então! — Ela sorriu. — Pode me trazer uma xícara, por favor.

— Em um minuto — respondeu Felipe se afastando.

Annabelle ficou olhando enquanto o homem se afastava. Cabelo castanho escuro curto, pele clara, alguns músculos, mas nada exagerado, sorriso bonito, simpático. Praticamente um clichê de comédia romântica ambulante. Talvez se estivesse com seus longos cabelos castanhos presos em um coque frouxo e a cafeteria fosse de uma franquia famosa, a sorte estivesse a seu favor. No entanto, a falta dos dois detalhes a fez sentir que a chance de a sua vida ser transformada com aquele encontro casual dissipar como fumaça. A mulher riu com aquela ideia maluca.

Felipe voltou com uma bandeja com os pedidos e um açucareiro. Ele colocou tudo sobre a mesa e esperou enquanto ela adoçava o café e bebia o primeiro gole.

EscuridãoOnde histórias criam vida. Descubra agora