Até o apito final [Conto]

BASTA ACREDITAR

Seus pés nunca estiveram tão pesados como ali, quando, com um galo na garganta, se aproximou das três barras de ferro. 

Ele tinha que se concentrar para não esquecer de respirar, era como se todo o corpo dedicava-se só para aquilo, da barriga que contorcia a cada inspirada e expirada ao canto do nariz que ele não parava de remexer, coçando de leve. Sentia a pele molhada mesmo antes de começar a jogar.

Não era só a responsabilidade com os imperadores que ele carregava naquele momento.
Era a substituição do maior pequeno goleiro que ele já conheceu.

E de nada adiantava sua experiência, essa partida nem se comparava com os últimos 263 que ele jogou pelo clube.

Não era pela pressão de jogar bonito. De se destacar.

Ele não podia falhar.

Não podia cagar todo o esforço do menino até ali. Todas as bolas que ele pegou ao longo do campeonato. Todas as salvações que ele fez. 

Raoni tinha que honrar seu nome. Seu tornozelo.

O pivete tinha se doado por inteiro para a Império. Impressionado muito mais em sua pequena trajetória que Raoni em todos os anos no clube. Nada menos que 200% era esperado dele agora.
O veterano bateu de leve na trave superior assim que chegou no destino. Duas vezes. Era seu modesto ritual, como cumprimentar um velho amigo. Um tapinha para cada inspiração que o levou até ali.

— Faz tempo, né? — murmurou para as redes que balançavam ao ritmo do vento.

Ele inspirou fundo e se deu o luxo de levantar a cabeça e observar a torcida dali. Tentou estufar o peito para mostrar a confiança que ele não tinha bem certeza se possuía. Ele se sentia tão pequeno, com mais de 60mil pares de olhos em sua direção.

Não precisava decifrar cada grito para entender que nenhum imperador aprovava aquela substituição. Ainda que naquele momento estavam mais indignados com o juiz que não tinha feito nada a respeito do lance anterior.

O babaca que machucou o herói do jogo estava no meio do campo com a bola, esperando o começo da partida. Não importa o quanto os torcedores turquesas gritavam por sua expulsão.