O Ponto de Partida

399 38 8
                                    

*Laura*

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

*Laura*

Era uma sexta-feira de manhã, janeiro de 2019. Poderia ser um dia qualquer: acordar, tomar café, ir para o colégio e depois aproveitar o resto do dia descansando ou saindo com meus amigos. Mas hoje não. Hoje não seria como qualquer outro dia.

Em poucas horas, eu estaria dentro de um avião com minha mãe, Marcela, saindo de São Paulo rumo a Manhattan. Tudo por causa dela e de um cara que ela conheceu no trabalho. Eles começaram a sair e, depois de uns três meses, ele contou que voltaria para Manhattan. Estava no Brasil só a trabalho. Tentaram manter um relacionamento à distância por um tempo, mas acho que todo mundo sabe o quanto isso é complicado. Então, um dia, ele sugeriu que nos mudássemos para lá.

No começo, odiei a ideia. Só de pensar em deixar meus amigos, a minha rotina, tudo o que eu conhecia, já me dava um aperto no peito. Mas ao mesmo tempo, ver minha mãe tão feliz depois de tanto tempo me fez reconsiderar. Desde o divórcio dos meus pais, nunca a vi assim, tão radiante. E eu não queria ser o motivo para estragar isso.

Morávamos só eu, minha mãe e minha tia Sarah em São Paulo. Minha tia é mais velha que minha mãe, mas nem em um milhão de anos minha mãe permitiria que eu ficasse sob os cuidados dela. A responsabilidade era dela, e ela sempre fez questão disso.

Viajar para outro país sempre foi um sonho, ainda mais para um lugar tão perto de Nova York. Mas não foi algo que me deixou animada. Eu tinha 16 anos, já tinha minha vida toda construída aqui, meus amigos, minha rotina. E, acima de tudo, tinha o Paulo.

Eu era completamente apaixonada pelo meu melhor amigo de infância. A gente namorava há um ano e quatro meses e ele fazia eu me sentir especial, como se nada no mundo pudesse me machucar. A gente tinha tantos planos! Íamos fazer faculdade juntos, morar juntos, adotar um gato... Coisas bobas, mas que pra mim faziam sentido. Mas tudo isso acabou. Nós sabíamos que namoro à distância era complicado, mas prometemos tentar, falar todos os dias. Nenhum de nós queria perder o outro.

Ele sempre esteve comigo, desde que éramos crianças. Foi ele quem segurou minha mão no meio do divórcio caótico dos meus pais, quem me fazia rir quando tudo parecia desmoronar. E agora eu ia embora, deixando ele para trás.

Depois de fazer minha higiene matinal, me vesti com as roupas que tinha separado na noite anterior: jeans claro, moletom e tênis. Sempre ouvi dizer que avião é frio. Desci para a cozinha e lá estava minha mãe, linda como sempre. É engraçado como todo mundo diz que parecemos irmãs. Pele clara, cabelo castanho, alta... só não herdei os olhos verdes dela.

— Bom dia, mãe — disse, notando nossas malas já perto da porta.

— Bom dia, meu amor. Está pronta? A tia Sarah vai sair mais cedo do trabalho pra buscar a gente às 11h. Ainda são 9h30, dá tempo de você tomar café e se despedir das suas amigas.

— Fiz isso ontem. Se eu for de novo, capaz de não me deixarem ir embora. — Dei um risinho, lembrando do drama que foi a despedida.

Não que eu tivesse um milhão de amigos, mas as três que eu tinha valiam por dez. Gabriela, Jéssica e Bárbara. Eu sempre fui mais próxima da Jéssica, a gente se entendia sem precisar falar muito. Nossa despedida foi cheia de lágrimas e abraços. Elas até tentaram bolar um plano para me impedir de ir, mas quando perceberam que não havia nada a fazer, só me fizeram prometer que manteria contato e mandaria fotos de tudo. O Paulo também foi me ver antes de eu partir. Me abraçou forte, pediu para eu não ir, mesmo sabendo que não havia escolha. Ele chorava, e eu chorava mais ainda. Me despedir dele foi a parte mais difícil de todas.

— Laura, sei que você tem sua vida, seus amigos, e não quero que pense que só me importo comigo — minha mãe começou a dizer. — Lá você vai ter um futuro muito melhor. O André gosta muito de você, e a filha dele tem a sua idade, vocês vão ser amigas...

— Mãe, para com isso — cortei. Eu sabia que ela se sentia culpada, mas não queria que fosse assim. Sim, eu estava triste, mas eu também sempre quis viajar. Eu queria que ela soubesse que eu estava bem.

No aeroporto, fizemos o check-in e aguardamos no portão de embarque. Quando o voo foi anunciado, minha tia Sarah veio nos dar o último abraço.

— Cuida bem da minha princesa, Marcela. Qualquer coisa, me avise. Eu amo vocês. — Seus olhos estavam vermelhos, e eu sabia que ela estava se segurando para não chorar mais.

— Nós também te amamos, tia — disse, abraçando-a.

Minha mãe também não conseguiu segurar as lágrimas. Era um adeus. Eu me sentia estranha, como se uma parte de mim estivesse ficando para trás.

Embarcamos e eu tentei me distrair com a experiência de estar em um avião pela primeira vez. Minha mãe percebeu e sorriu, talvez aliviada por me ver animada com alguma coisa.

— Olha como o dia está lindo! — Ela apontou para a janela. — Já estou com medo de que aconteça uma tragédia, imagina se...

— MÃE! — cortei, arregalando os olhos. — Para de querer me assustar!

Ela riu, satisfeita com a brincadeira.

— Ainda bem que paguei um curso de inglês pra você — disse, mudando de assunto.

— Sim, mas estou enferrujada. E ainda bem que o André é brasileiro, porque você no inglês é uma tragédia, mãe.

Ela riu alto e me cutucou.

— Ah, sua pilantra. Filho de peixe, é o quê mesmo?

Eu amava aqueles momentos com a minha mãe. Eles faziam tudo parecer menos pesado. Mas, no fundo, eu sabia que nada seria igual sem o Paulo, sem as minhas amigas, sem a vida que eu estava deixando para trás.

Enfim, VocêOnde histórias criam vida. Descubra agora