Anjo de Concreto

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Cheongdam-dong, South Korean, 2013

O enterro tinha sido finalizado e Jennie não sabia se aquilo era uma sensação de alívio ou não. Ela pescou o conjunto de chaves do bolso do seu casaco preto e adentrou na casa de Lisa, deixando a porta aberta para Hoseok e Jisoo.

Por mais que a casa de Lisa trouxesse lembranças dolorosas, ela não voltou para o seu apartamento. Jennie queria vendê-lo e comprar a casa da namorada — ela se recusava a usar o termo ex —, ninguém além dela tinha que ter a permissão de viver naquele lugar que foi seu refúgio por tantos meses.

— Eu estou bem — disse Jennie —, vocês não precisavam me acompanhar.

— Ah. Sem problemas. — respondeu Hoseok. Ele abriu espaço e deixou Jisoo entrar antes de si. — É bom andar de carro após tanto tempo de bicicleta.

Jung tentou fazer uma piada para amenizar o clima melancólica que os acompanha desde o fim do enterro, mas Jisoo deu um leve tapa sobre o estômago do mais velho, o repreendendo com um olhar mortal.

— Deve ser legal, eu acho. — respondeu Jennie, a voz sem humor.

A cientista olhou para os amigos um momento antes de se virar e entrar na cozinha de Lisa. Sua garganta estava seca, ela precisava beber alguma coisa para aliviar a voz rouca e tentar relaxar a cabeça. Hoseok e Jisoo a seguiram em silêncio, sem saber se deveriam ficar ou não essa noite junto à Kim mais nova. Eles observavam os passos de Jennie com atenção e Jisoo nota que, além de Lalisa, nenhum dos dois ali tinha perdido alguém na vida antes. Ambos estavam tristes e abalados com a fatalidade, sim, porém não se compara ao que Jennie estava sentindo. Ela estava segurando-se para não se desmontar outra vez.

Jennie abriu um dos armários e puxou uma caixinha de chá. Ela odeia chá mas algumas pessoas gostam de como isso às acalma e é isso que ela precisa. A cientista ignora os olhos dos outros dois queimando em suas costas. A torneira da pia é ligada e um copo de vidro é colocado embaixo da água corrente.

— Precisa de ajuda para achar algo? — Jisoo perguntou, olhando a amiga perambular pelo o cômodo atrás de algo e negar a pergunta. — Você quer companhia essa noite, Jennie?

— P-podemos ficar... — comentou o Jung, ele olhou entre as garotas rapidamente e parou em Jennie. — Eu posso fazer pipoca e podemos assistir alguma coisa. Quem sabe tenha algum filme que...

— Vocês já podem ir. — interrompeu a Kim mais nova. Ela permaneceu de costas para afugentar a voz cansada e abatida, mas não funcionou. Hoseok e Jisoo continuaram a olhá-la até que Jennie suspirou. — O que eu quero dizer é que não quero terminar o pior dia da minha vida fingindo estar bem ou fazer atividades para ocupar minha cabeça. Sem ofensa, mas eu não quero terminar esse dia conversando com vocês. Eu só… Quero ficar sozinha, por favor.

Jisoo olhou para Hoseok ao seu lado e notou pela a primeira vez a expressão séria no rosto dele. Boca franzida em uma linha reta, o maxilar tensionado em uma face rígida e ela podia ver a confirmação nos olhos dele. Ela franze a testa e pisca seu olhar de volta para Jennie, ela não queria deixar a amiga, de forma alguma, mas entendia que ela precisa do próprio espaço agora.

— C-claro, Jenn. Estamos saindo. — a mais velha apertou as juntas contra as alças da bolsa. — Ligue para mim se precisar de algo.

Jennie não acenou, não olhou para trás, não fez nada além de segurar seu copo e encarar a água ali dentro. A expressão tão nítida sobre a luz da cozinha e tão morta ao mesmo tempo que Jisoo olhou mais uma vez para Hoseok, buscando alguma ajuda como se esperasse que a resposta de sua amiga fosse ser dita por ele. Quando ela não veio, apenas lhe restou se virar e sair do cômodo.

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