Capítulo 3: A Fuga para Lisboa
O ano de 1789 marcou o início de uma era tumultuada que transformaria a Europa para sempre. A Revolução Francesa, com sua promessa de liberdade, igualdade e fraternidade, rapidamente degenerou em caos e violência. Para as famílias nobres, como os Orleans Bragança, a revolução trouxe não apenas a ameaça de perda de privilégios, mas também o perigo iminente à vida.
Alice Orleans Bragança tinha apenas seis anos quando as notícias da Queda da Bastilha chegaram a Paris. A princípio, sua família, como muitas outras da nobreza, subestimou a gravidade dos eventos. No entanto, à medida que a situação se deteriorava, ficou claro que a França não era mais um lugar seguro para eles.
Mary Hamburgo Orleans de Nice, mãe de Alice, foi rápida em perceber a ameaça. Com a morte de seu marido, Inácio, Duque de Nice, em 1788, ela estava determinada a proteger seus filhos a qualquer custo. Em reuniões secretas com aliados próximos, Mary começou a planejar a fuga da família. Seu irmão, Rei Andrew Hamburgo, e outros parentes fora da França, enviaram cartas urgentes oferecendo abrigo e assistência.
A decisão de fugir foi tomada em um clima de medo crescente. O Palácio de Nice, onde Alice passara seus primeiros anos, tornou-se um lugar de ansiedade e preparação silenciosa. Os servos mais leais foram informados do plano e juraram segredo. As malas foram feitas discretamente, e documentos importantes foram escondidos.
Numa noite fria de outubro de 1792, a família Orleans Bragança deixou Paris sob o manto da escuridão. Alice, Mary, Jorge e a pequena Mary Orleans York foram escoltados por uma caravana que incluía alguns guardas leais. A viagem foi longa e cheia de perigos. Passaram por aldeias devastadas pela revolta e cruzaram rios sob a constante ameaça de serem descobertos por patrulhas revolucionárias.
Lisboa, a cidade que se tornaria o novo lar da família, parecia um refúgio distante. Chegaram à capital portuguesa exaustos, mas aliviados. Foram recebidos por Dom João VI de Portugal, que, solidário com a situação da nobreza europeia, ofereceu-lhes abrigo e proteção. A acolhida em Lisboa foi calorosa, mas a adaptação a uma nova vida não foi fácil.
Alice, embora jovem, compreendia a gravidade da situação. A menina, antes acostumada ao esplendor dos salões parisienses, agora encontrava-se em um novo ambiente, onde o luxo era substituído por uma vida mais contida e discreta. Mary, sua mãe, assumiu a responsabilidade de garantir que seus filhos recebessem uma educação adequada e se adaptassem à nova realidade.
Os primeiros meses em Lisboa foram marcados por uma mistura de alívio e saudade. Alice sentia falta de sua casa, dos jardins onde costumava brincar e das noites de contos que seu pai, Inácio, narrava. No entanto, a cidade portuguesa oferecia novas oportunidades. Mary incentivou seus filhos a aprenderem o idioma e a se integrarem na sociedade local.
Lisboa, com sua rica história e cultura, logo se tornou um novo lar para Alice. Ela fez novos amigos entre os filhos de outras famílias nobres exiladas e começou a frequentar eventos sociais cuidadosamente organizados. A Primeira Eucaristia de Alice, realizada em 12 de junho de 1794, foi um evento significativo que marcou sua aceitação na comunidade religiosa de Lisboa.
Apesar das dificuldades, a fuga para Lisboa foi uma bênção disfarçada. A distância da violência revolucionária permitiu que Alice e sua família encontrassem paz e estabilidade. Em um novo país, rodeada pelo amor de sua família e pela generosidade de novos aliados, Alice cresceu e floresceu, carregando consigo as lições de resiliência e adaptação que a Revolução Francesa forçara a aprender.
Em uma manhã fresca de novembro de 1792, após semanas de uma exaustiva e perigosa jornada, a família Orleans Bragança finalmente avistou as colinas ondulantes de Lisboa. A cidade, com suas fachadas de azulejos brilhando sob o sol matinal e as cúpulas douradas de suas igrejas pontuando o horizonte, parecia um refúgio seguro para a jovem Alice, sua mãe Mary, Duquesa Viúva de Nice, e seus irmãos, Jorge e Mary Orleans York.A travessia havia sido longa e árdua, mas ao se aproximarem da capital portuguesa, um suspiro coletivo de alívio percorreu a carruagem. Para Mary, a chegada significava um novo começo, longe das sombras da Revolução Francesa que havia consumido sua terra natal. Para Alice, então com apenas nove anos, era uma mistura de curiosidade e receio, enquanto observava pela janela da carruagem as novas paisagens que se descortinavam.Ao passarem pelos portões da cidade, foram recebidos por uma comitiva enviada por Dom João VI de Portugal. A hospitalidade portuguesa manifestou-se de imediato, com bandeiras tremulando e aplausos dos moradores locais, sensibilizados pela situação dos exilados franceses. A carruagem real, enfeitada com brasões e guirlandas, estava pronta para levá-los ao Palácio da Ajuda, onde ficariam hospedados.O palácio, imponente e majestoso, oferecia um contraste marcante com o clima de tensão e incerteza que haviam deixado para trás. Suas amplas salas e corredores ornamentados, decorados com tapeçarias e móveis requintados, proporcionavam uma sensação de segurança e conforto. Ao serem conduzidos para seus aposentos, Alice e seus irmãos não puderam deixar de se maravilhar com a grandiosidade do lugar.Mary, apesar do cansaço evidente, manteve a compostura e agradeceu calorosamente ao rei português. A Duquesa Viúva, uma mulher de notável dignidade e força, estava determinada a garantir que seus filhos se adaptassem rapidamente ao novo ambiente. Ela sabia que a estabilidade e a normalidade seriam cruciais para o bem-estar de sua família.Nos primeiros dias em Lisboa, a família foi envolvida em um redemoinho de atividades. Mary insistiu que seus filhos começassem imediatamente a aprender a língua e os costumes locais. Professores e tutores foram contratados para ensinar português, história, e etiqueta portuguesa, enquanto a própria Mary se dedicava a reforçar suas conexões com outras famílias nobres exiladas e a corte portuguesa.Alice, com sua natureza curiosa e adaptável, rapidamente começou a explorar os jardins do palácio e a fazer novas amizades. Ela se encantou com as flores exóticas e as árvores frutíferas que não existiam na França. Seus dias eram preenchidos com aulas e brincadeiras, mas também com um crescente entendimento de sua nova realidade.A cidade de Lisboa, com seu vibrante mercado e ruas movimentadas, oferecia uma variedade de experiências novas e emocionantes. Aos domingos, a família frequentava a missa na Sé de Lisboa, onde Alice teve sua Primeira Eucaristia em junho de 1794, um evento que marcou sua integração na comunidade local e fortaleceu sua fé.Para Jorge, seu irmão mais velho, a nova vida também trouxe desafios e oportunidades. Ele foi matriculado em uma prestigiosa escola local, onde continuou seus estudos em ciências naturais, um campo que o fascinava desde a infância. Jorge logo se destacou por sua inteligência e dedicação, ganhando o respeito de seus professores e colegas.Mary Orleans York, a caçula, era um espírito alegre e sociável. Sua capacidade de fazer amigos facilmente ajudou a família a se conectar com outras crianças nobres exiladas, criando uma rede de apoio e amizade que se mostraria valiosa nos anos seguintes.A Duquesa Viúva Mary, por sua vez, encontrou consolo na correspondência regular com seus parentes na Europa e na administração dos assuntos familiares. Embora ainda carregasse a dor da perda de seu marido e das incertezas que haviam enfrentado, Mary começou a ver Lisboa não apenas como um refúgio temporário, mas como um novo lar onde seus filhos poderiam crescer em segurança e prosperidade.A chegada em Lisboa marcou o início de uma nova fase para Alice e sua família. Longe das turbulências da França revolucionária, eles encontraram um lugar onde podiam reconstruir suas vidas. As lições de resiliência e coragem aprendidas durante a fuga seriam fundamentais na formação do caráter de Alice, preparando-a para os desafios futuros que a aguardavam.
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Alice Bragança, Duquesa de Coimbra
Historical FictionAlice Bragança, Duquesa de Coimbra" narra a vida de uma nobre e virtuosa mulher, cujo destino foi entrelaçado com as complexidades da história europeia do século XVIII e XIX. Nascida em uma família de linhagem real, Alice enfrenta os desafios da Rev...