III. REVOADA

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"Você sempre reclama que ela não se sente especial, Carrie. Dê essa chance à ela." Foram com essas palavras que Robert convencera Carrie a encerrar a discussão e permitir que Jullie levasse a tal cesta que representava seja lá o que fosse, mas desta vez ela concordava com ele, a filha estava realmente feliz e isso aqueceu seu coração, fazendo com que ela esquecesse as mágoas por um momento. Eles estavam em frente a construção que se assemelhava a uma capela bem no coração do vilarejo, mas não havia cruz ali ou nenhum símbolo cristão que indicasse que aquela era de fato uma capela. Contudo, era impossível ignorar o pináculo cuja ponta era tão aguda que lembrava uma agulha pronta para furar o céu, as portas e vitrais de forma ogival e também a rosácea cujos vidros em diversas cores lembravam uma estrela de seis pontas formada por dois triângulos entrelaçados. Aquele maldito símbolo, pensou Carrie, mas guardou suas suspeitas, seja lá quais eram elas, para si. Tudo ali era parecido com uma espécie de santuário.

— Estranho. — sussurrou Carrie, tentando espiar pelos vitrais.

— O que é estranho? — quis saber Robert.

— Não... Não estranho de ruim... — ela desconversou: não queria brigar. — Estranho essa igreja estar tão bem conservada.

— Como sabe que é uma igreja?

— Bem, Rob... É meio óbvio.

Jullie não estava interessada na tal capela, se soltou das mãos de Carrie e foi correr com as outras crianças.

— Tome cuidado, mocinha! Não suma! Fique por perto! — gritou a mãe.

— Você precisa deixá-la viver, Carrie. Não é saudável prendê-la desse jeito. — disse Robert.

Carrie respirou fundo, pensou em responder, mas se calou. Se aquela não era uma capela, ela não iria dar ouvidos a nenhum sermão.

— É uma igreja muito bonita. — ela desconversou de novo.

— É. — concordou Robert, esticando o pescoço para espiar entre os vitrais também. — Será que podemos entrar?

— E em qual igreja é proibida a entrada de pessoas?

— Nunca se sabe.

— Olha. — Carrie apontou para uma espécie de planta desenhada dentro de um círculo, que estava pregada na porta dos fundos. — Aqui diz ra...um. Raum. O que será?

— Deve ser a planta da igreja. — observou Robert. — Mas parece grande demais e...

— O que estão fazendo?

A voz vinha de trás deles.

— Não podem ficar aqui. Vai começar. Venham. — chamou a jovem moça de longos cabelos dourados e olhos cor de piscina.

Carrie observou Robert sorrir e responder gentilmente com um "Estamos indo", mas talvez ele quisesse responder apenas com um "Vou"; talvez se estivesse a sóis com ela teria respondido apenas com um "Vamos"; mas talvez fosse paranoia. Carrie pegou o celular para fazer aqueles pensamentos traiçoeiros se dissiparem, mas ela quase a enxergou em sua frente; quase viu Robert sorrindo para ela; quase viu Cheryl tentando seduzi-lo de novo.

CARRIE!

Ela acordou.

— Está tudo bem? Já vai começar. Vamos. — chamou Robert com a pouca paciência que ainda parecia lhe restar.


* * * * * *


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