Furca na ale laris Raum!
Furca na ale laris Raum!
Furca na ale laris Raum!
O mantra soturno era como um canto gregoriano e vinha lá de baixo. Foi como um soar de sirenes; um alarme: o pior de todos. Carrie deixou o chalé e correu encosta abaixo para salvar o seu bem mais precioso, estava desarmada, mas por algum motivo havia trazido aquele objeto sestro consigo, estava agarrada ao livro como se sua vida dependesse dele. Precisava escondê-lo, pensou, enquanto corria no breu, seus pés pareciam ter se acostumado com a dor, pois ela não sentia o atrito com o chão, sentia a superfície gelada e escorregadia, sentia a terra e o musgo, sentia o capim e as folhas secas, sentia o vento gelado bater contra o rosto e o incômodo por não enxergar onde estava pisando voltara, mas ao mesmo tempo era como se sua mente estivesse bloqueando todas essas sensações. Seu corpo todo estava anestesiado por uma adrenalina que ela nunca sentira antes, não tinha medo de cair e nem de pisar em algum animal esquisito. Não era exatamente coragem que sentia, muito pelo contrário, mas o medo de perder Jullie e Robert tinha surtido nela o efeito de uma droga: de um calmante reverso. Ela continuou correndo sem parar e sem pensar exatamente no que ia fazer. Queria apenas chegar antes que as coisas acontecessem. Ela sabia o que podia acontecer, mas não queria pensar. Queria apenas pegar Jullie e sair dali com vida, mas ela precisava de um plano, precisava saber como agir ou não teria chance nenhuma contra a multidão que a aguardava, e enquanto suas ideias fervilhavam em busca de um plano de fuga, ela não sentiu os dedos afrouxaram e o livro escorrer pelas suas mãos, com um estardalhaço o objeto rolou pela ladeira e ela teve de decidir em segundos se pararia para pegá-lo ou se seguiria em frente. Não havia tempo, o mantra estava em seu ápice, ela precisava chegar antes que...
O pé esquerdo de Carrie pegou fogo por um segundo, seu corpo foi projetado para frente com tanta força que ela só teve tempo de perceber que cairia quando estava com o rosto a centímetros do chão. Caiu com os braços na frente do rosto e mesmo assim não conseguiu amortecer a queda e nem impedir que ralasse o queixo no chão, o pé que tropeçara latejou como se protestasse contra ela. Com um gemido baixo, mais de lamento do que de dor, Carrie sentiu as lágrimas turvaram a visão e então desatou num choro infantil e desesperado, afundou o rosto nos braços e se deixou sentir todas aquelas coisas; a angústia que vinha evitando há dois anos; aquele ressentimento que vinha escondendo todo esse tempo; o medo de perder Robert; o medo de perder Jullie... Julie!
Carrie se levantou ainda zonza, engatinhou e depois caminhou meio curvada pela escuridão, algum osso do pé que ela não sabia o nome doía como se estivesse tentando consertar uma torneira nele com o auxílio de um alicate, ela sentia a dor apertar e pulsar a cada passo. A 10 metros o candeeiro revelou uma silhueta robusta, ela pensou em se esconder, mas era melhor não levantar suspeitas sobre o que sabia e aqui ela ficou feliz por não estar segurando mais o grimório. A grande silhueta saiu das sombras, ela tinha conseguido se levantar e tentou mancar o menos que pôde, mas não precisava tanto esforço: ninguém veio perguntar se estava tudo bem. A primeira coisa que ela reparou foi na nesga de pele branca iluminada pelo candeeiro, vinha saindo de trás de uma árvore; da floresta; a coxa era grossa e com veias saltadas e espalhadas como um céu tempestivo em noite de raios; depois que saiu das sombras ela reparou no corpo completamente nu; dois metros de músculos rijos como marfim; observou com constrangimento uma moita de pentelhos obscenos e um pênis pendulando como um sino; por fim ela pôde ver o rosto do desconhecido: uma barba espessa e dourada escondia o lugar onde deveria haver lábios; um nariz aquilino reluziu como um carro que acabara de ser encerado e estacionado debaixo de um poste, de longe ela poderia dizer que era um bico bem afiado; os olhos azuis grandes e redondos tinham uma intensidade tétrica e veias estouradas. Mas foi o ruído que ele fazia ao andar que fez Carrie ficar preparada. Sem tirar os olhos dele, ela recuou, a cada passo que o homem dava um som metálico riscava a terra dura. Ele parou a uns 5 metros dela; o machado cintilou ao lado dele; estava sujo de sangue; o cabo; a lâmina; ela enxergou os respingos em suas pernas também. Ao menor movimento do Carrasco, Carrie correria, não importasse para onde, mas ela correria para qualquer lado que fosse oposto àquela presença robusta que empunhava um machado ensanguentado. Na verdade, em sua mente ela já estava correndo, mas estava petrificada fisicamente.
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A Alcateia
HororCarrie vê seu casamento desmoronar ao descobrir que a traição do marido resultou em um filho. A relação com os parentes dele é conflituosa por conta do comportamento racista de sua sogra e torna a situação ainda pior. Tentando então salvar essa rela...