Coelhos, Clubes e Um Tênis Utopia Dixe - Parte 10

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De manhã a casa ficou naquela agitação habitual, pernas apressadas para o banheiro, gente batendo na porta querendo entrar, Cauê resmungando da cama por dez minutinhos a mais. Fumaça olhava os habitantes da casa, ninguém lhe dava atenção ele até precisava esquivar para não ser pisoteado, miou querendo atenção de Roberto que nem o olhou e seguiu direto pra cozinha, tentou o mais novinho que ainda esfregando os olhos parecia nem saber onde estava, Maiara até encarou o gatinho, disse que não tinha tempo e apenas passou a mão em suas costas, ele gostou, mas ainda era pouco. Caminhou até o quarto de Aiyra e a menina calçava o tênis sentada na cama, o bichano subiu no colchão e Aiyra desejou um bom dia para Fumaça, terminou de amarrar os cadarços e surpreendeu o gato num abraço, ele miou fazendo-se difícil, levou aquela fungada clássica, uns paparicos e quando Aiyra foi tomar café da manhã Fumaça sentia-se um novo gato, andando pomposo de rabo em pé, como se fosse o rei da casa.

Na mesa Roberto olhava Maiara, eles não entendiam o clima fúnebre. Cauê mal olhava a irmã, parecia um tanto desconfiado, olhando os pais, depois a irmã, até parar no achocolatado, como se pudesse ler algo de novo na embalagem. Aiyra não estava menos estranha, lembrava um zumbi, encarando o nada, chegando ao ponto de parar com o pão perto da boca, travada, uma maquina quebrada.

— Aconteceu alguma coisa com vocês? — Perguntou Maiara e os filhos saíram do transe.

— Não, alguma coisa? Não.

— Tranquilo aqui também, nada, nadinha, tudo... De boa.

Na frente da escola Roberto se despediu dos filhos e sobrinhos saindo com o carro. Aquele mundaréu de gente entrando no colégio. Ana falava sobre alguma coisa que era pra ser engraçada, mas Aiyra não prestava atenção. Pensou em se despedir do irmão mas ele já havia sumido com Lucas, talvez fosse melhor assim, os dois estavam esquisitos com ela. As pessoas se empurravam, conversando, andando de celular na mão, muitos sons, cheiros e vozes.

— Aiyra! Tá me ouvindo? — Ana a encarava aborrecida.

— Eu...

— Parece que ainda não acordou, credo, animo minha filha. — Ana sorriu e beijou a prima se afastando pra sua sala. — No intervalo quero ver essa carinha melhor hein?

Aiyra sorriu e concordou com a cabeça. Ajeitou a mochila nas costas e começou caminhar no meio das pessoas quando viu Rebeca e as amigas num corredor mais vazio. A valentona estava de cara fechada enquanto as meninas conversavam, ela olhava fixamente pro meio da multidão e Aiyra reparou nos pés da garota, tão tristinhos num tênis velho e sujo, seu coração quase parou.

*

Natasha segurou uma risada, esses mangás eram pra ser violentos, até eram, mas mesmo entre mãos decepadas, cabeças rolando e muito sangue preto e branco nos quadros, o humor fazia-se presente, era legal, muito legal. De repente a revistinha de Natasha foi arrancada de suas mãos, ela estava sentada e olhou assustada pra cima, só pra ver uma Aiyra ofegante.

— Eu tô ferrada Nati, mortinha.

Antes do sinal tocar Natasha e Aiyra vagavam pelo corredor, procurando, o que exatamente Nati não sabia, mas a amiga parecia bem aflita e quando foi contando a história dos coelhos e o tênis, Natasha arregalou os olhos.

— O utopia dixe da Rebeca?

— Shhhh! Cala essa boca. — Aiyra olhou ao redor, pessoas passavam despreocupadas conversando entre si. — Tá ficando doida? Fala baixo.

— Mas era não era?

— Sim, eu vi hoje, ela tá usando os velhos.

— É amiga, você tá ferrada mesmo.

Sangue AntigoOnde histórias criam vida. Descubra agora