Fetiche

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   Ele rastejava por todo o quarto, procurando ajuda. Seu corpo entrava em êxtase e ele podia ouvir as articulações de seus ossos se rompendo um por um.
   As paredes cimentadas e tingidas em um tom de amarelo pérola pareciam fazer jus a toda beleza proporcionada pela sua dor. O ápice da loucura e do prazer proporcionados por uma coisa só.
   Aquilo era o suficiente para ele.
   Era excitante a sensação de querer morrer todos os dias.

Selteburgo - 17 de Setembro de 2017

   O Sol já estava no topo do céu e parecia estar ainda mais radiante aquele dia. Andrew se deslocava até a sua cafeteria preferida, mas dessa vez, se encontraria com alguns amigos. Já que o trabalho do dia anterior tinha sido cansativo -e sua cabeça coçara o dia inteiro graças ao boné que fazia parte do uniforme- era hora de se divertir um pouco.

   - Boa tarde meus amores!- Andrew saltita e cumprimenta animadamente as duas pessoas sentadas em uma das mesas da cafeteria.

   - Achei que não viria.- O garoto diz meio preocupado. Ele estava coberto de roupas pretas e acessórios metálicos, apesar de ter uma aparência extremamente fofa.

   - "O Paul está morrendo de fome. Estávamos esperando você chegar para fazer os pedidos."- A outra garota responde por língua de sinais. Ao que aparenta, ela é muda.

   - Desculpem pela demora. O ônibus acabou atrasando…- Andrew coloca sua mochila no chão e se senta junto a eles na última cadeira restante da mesa.- Então, vamos pedir?

   As grandes vidraças da cafeteria permitiam que o lugar fosse muito iluminado, dando uma visão ampla da rua e das árvores que enfeitavam as calçadas. Aquele visual rústico e confortável parecia conversar muito bem com a satisfação de todos os fregueses alí.
   De um lado da mesa, Louise provava pela primeira vez o sabor de um cappuccino quente, Paul degustava um pequeno croissant de queijo com orégano e, como de costume, Andrew pedira um copo de meio litro de sorvete de chocolate.

   - Paul, eu vi que você se formou...- O moreno puxa assunto ainda com muito sorvete na boca.- O que você pretende fazer agora?

   - Bem, eu quero arrumar um emprego na área de design mesmo.- Paul pausa a fala e deposita os talheres no próprio prato.- E eu quero sair da casa dos meus pais, o quanto antes.

   - É a melhor coisa que você faz, sabe…- Andrew parecia querer incentiva-lo com a ideia.

   - "Ainda mais por conta do chato do seu pai…"- Louise diz gesticulando por sinais mas logo se acanha.- "Desculpe tocar nesse assunto."

   - Está tudo bem Louise. Você não mentiu, ele é chato mesmo.- Paul responde entre leves risadas mas era notório o seu incômodo ao falar sobre sua própria família.- E como anda o seu pai?- O mesmo pergunta ao Andrew, tentando mudar o foco do assunto.- Vocês ainda se falam, né?

   - De vez em quando ele me liga…- O moreno responde em tom baixo.- Mas na maioria das vezes ele só quer falar sobre o meu trabalho.- Ele dá de ombros e volta a brincar com o sorvete na colher.

   Essa foi a vida que Andrew tinha logo após ter se mudado do Distrito de Al Mijir. Deixou sua mãe e irmãs naquela cidade para morar durante um tempo com seu pai em Selteburgo em busca de uma vida melhor. O mesmo houvera ganhado uma bolsa para universidade, da qual teve que abandonar, tendo em vista o local em que iria morar.
   Demorou um pouco para que Andrew arrumasse um emprego e abandonasse o alojamento de seu pai. Apesar das dificuldades, ele sonhava em ter uma vida melhor, distante daquele ambiente hostil.
   Mesmo se tratando de pai e filho, ambos eram o inverso um do outro. Andrew Elmaalouf era considerado um doce de garoto, sempre tentava agir da forma mais racional possível e sempre disposto a ajudar e ser justo com quem precisasse. Seu pai, era o famoso "velho ranzinza" que todos tinham medo. Nunca chegara a bater em seu filho, mas as palavras de baixo calão eram o suficiente para fazer com que Andrew se sentisse inútil.
   O moreno nunca pôde sentar e conversar com seu pai, nunca recebeu uma abertura para expressar o que sentia. Muitas vezes, o garoto chegara a praticar automutilação quando mais novo. Totalmente em vão. Talvez ele tivesse medo da dor da morte. Um medo que ia além da sua vontade de acabar com tudo.
   Coração e mente corrompida, ele insistia em tentar melhorar. Não sabia no que era bom e nem no que poderia fazer no futuro, mas ele gostava do pouco que fazia. Escrevia aqui, desenhava alí, chegou a fazer músicas e fotografias. Ele era um pedacinho de cada coisa. Queria absorver cada experiência e cada conhecimento que o mundo poderia proporcionar.
   E foi em uma dessas experiências que ele descobriu sua bissexualidade, da qual, demorou anos para revelar aos familiares preconceituosos. Os únicos que conheciam seus segredos eram seus amigos. Os maiores confidentes que Andrew poderia querer.

Where Is Viktor?Onde histórias criam vida. Descubra agora