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A noite caiu o que significava que já estávamos presos há quase dois dias e não parecia haver uma solução próxima.

Durante a tarde, vários carros da polícia haviam estacionado à porta da faculdade. Com a ajuda de Philipa e Katie, fui até à varanda ver o que se passava e vi que enquanto um homem gordinho tentava passar a vedação elétrica, um dos agentes tentava falar com os atacantes. Nenhum com especial sorte. O homem da vedação levou alguns pequenos choques elétricos, mas não desistia de tentar até ser severamente eletrocutado e teve de ser transportado inconsciente por uma ambulância e o agente tentou durante horas negociar mas nem conseguiu que algum deles respondesse ou mostrasse a sua identidade. Dentro das 4 paredes, o rapaz baleado estava no lado oposto, também ele a ouvir as tentativas falhadas da polícia e a rir, dizendo a Sarah que nunca na vida Keaton iria ceder àquele tipo de propostas.

"Juro que aquele gajo me irrita!" – comenta Philipa gesticulando efusivamente com as mãos. – "Quem é que ele pensa que é para se estar a rir daquela forma? E ainda por cima a manipular a Sarah..."

"Não me parece que ele a esteja a manipula-la." – contrapus.

"Honestamente, a mim também não." – concordou Katie. – "A Sarah nunca foi muito fácil de se apaixonar, acho que ela está mesmo a gostar dele!"

Era a mais pura das verdades, Sarah sentia-se um autêntico patinho feio por ter excesso de peso, usar óculos e ter o cabelo frisado. Via apenas as coisas piores nela, mesmo tendo um sorriso e uns olhos arrasadores, era super querida e o seu bom humor contagiava qualquer um e pela primeira vez sentiu que alguém gostava dela pelo que ela era, alguém com quem ela se identificava.

...

Já devia ser meia-noite quando toda a gente, exceto eu e o terrorista que tínhamos baleado, estavam a dormir profundamente. Por muito pouca coisa que havia para fazer, a maioria das pessoas sentia-se extremamente cansada. Assim que se deitavam no chão, ou se encostavam à parede e fechavam os olhos adormeciam quase de forma instantânea. Por outro lado, o rapaz a meu lado parecia desconfortável por ter sido posto junto a mim para dormir. Sentado contra a parede, evitava olhar para mim e não se esforçava para adormecer.

Ali estava, no silêncio da noite, a oportunidade perfeita para arrancar-lhe todas as informações que nos iriam ser úteis. Como que a preparar-me, sentei-me confortavelmente e respirei fundo antes de começar a falar.

"Então e posso saber o teu nome? Eu sou a Blake." – tentava soar o mais simpática possível apesar de sentir um sabor amargo na boca.

"Eu sei quem tu és!" – limitou-se a responder.

Ele nem lhe dirigiu o olhar. Roía as unhas aflitivamente e não mostrava qualquer tipo de emoção. Parecia uma fortaleza impenetrável. A única vez que o tinha visto com a expressão suavizada fora junto de Sarah, sempre que qualquer um dos rapazes se aproximava dele para lhe dar comida, água ou trocar o curativo ele trancava a cara e não era homem de muitas palavras.

"A Sarah já te falou de mim?" – tentei prosseguir para ganhar a sua confiança.

"Não tens de fingir que estás a tentar conhecer-me, princesinha. " – afirmou desta vez fixando nos meus olhos. – "Posso não ter um curso superior mas não sou parvo nenhum, 'tás a ouvir? Da minha boca não vais ouvir nada, eu sou leal aos meus."

Estava redondamente enganada sobre aquele rapaz magro, de cabelo rapado e barba comprida. Podia até ser o mais novo, podia até ter um aspeto mais frágil, mas não era de todo o elo mais fraco.

"Aos teus?!" – trocei. – "Juraste lealdade às pessoas que te deixaram para trás depois de teres levado um tiro? Depois de teres suplicado para que ficassem? Grandes amigos que tu tens... nós aqui podemos ajudar-te, testemunhar a teu favor quando sairmos daqui se colaborares connosco não percebes?" – em pouco tempo os ânimos exaltaram-se e o esforço era gigante para não acordar toda a gente.

"Colaborar com as pessoas que me deram um tiro? Só se fosse otário!" – recusou.

A raiva crescia dentro de mim de forma abruta. Da maneira que ele falava, parecia que nós é que éramos os maus da fita. Tentei ignorar os meus sentimentos negativos e continuar com a minha missão. Tinha de arranjar uma maneira de o manipular.

"Diz-me pelo menos o teu nome." – pedi.

"O pessoal trata-me por Falcon." – acabou por dizer já um pouco mais calmo.

Achei de imediato uma escolha interessante de nome. Obviamente, é o nome de código que usa com o resto do grupo e se ele o escolheu propositadamente significa que ele se preparou para vir para a guerra e ganhar, trouxe consigo um sinal de bom presságio. O que significava que para nós era um mau presságio.

Ignorei toda a conotação do seu nome, desvalorizando na minha cabeça como se fosse apenas uma coincidência e continuei:

"Falcon, junta-te a nós, pela Sarah." – vi logo nesse instante na cara dele que tinha atingido um pouco fraco. – "Não queres que ela saia daqui com vida e contigo?"

A dúvida na cara de Falcon era bem explícita. Encostou a cabeça à parede mirando o teto à procura de uma resposta às suas questões interiores.

"Não fales da Sarah. Ela não é perdida nem achada na nossa conversa. A Sarah só sai daqui sem vida por cima do meu cadáver."

Por muito que me custasse a admitir, Falcon preocupava-se realmente com uma das minhas melhores amigas, o que me provocava um conflito interno. Não devia estar a manipular e a jogar com os sentimentos da pessoa pela qual a Sarah está apaixonada, porém também não podia abandonar o plano. Só Deus sabia o que nos podia acontecer se não fizéssemos nada.

"Espero que tenhas a certeza disso porque..."

Não consegui acabar a frase porque comecei a tossir compulsivamente. Quando olhei para a minha mão, esta estava manchada de vermelho relembrando-me do momento que fui baleada. Tentei esconder o sangue de Falcon, contudo o rapaz estava mais atento do que parecia.

"Isso não parece estar famoso, princesinha." – comentou.

"Isto deve ser normal." – não sei se o estava a convencer a ele ou a mim própria que o que me estava a acontecer era uma reação comum.

"Pois, não sei. Eu próprio não me lá sinto bem." – o rapaz dizia isto sem grande sentimento na voz, como se não se preocupasse com a sua própria saúde.

Não era apenas o sangue que me preocupava. Não parava de sofrer de suores frios e enjoos constantes e durante aquela tarde a ferida tinha começado a deitar um líquido estranho e com um cheiro nada agradável. Não tinha dito ainda nada a ninguém porque não os queria preocupar, mas o medo começava a tomar conta de mim.

"Talvez se nos ajudasses a sair daqui íamos para um hospital mais rápido!" – cuspi virando para o outro lado de modo a evitar mais conversas.

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