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Depois de ouvir Falcon, não consegui respirar por um momento. A certeza na voz dele era quase avassaladora. Respirei fundo e reuni todas as minhas forças para perguntar:

"Como é que podes ter tanta certeza?" – eu nem tinha a certeza se queria saber a resposta dele.

"Porque o que estás a sentir não é normal... não é suposto sentirmo-nos assim." – era incrível o quão certo ele estava do que dizia. – "E eu sei que tens pensado nisso, cada dia que passa sentes-te pior."

A ideia ficou a pairar na minha cabeça. Nunca tinha sido baleada antes, mas tinha quase a certeza que ele tinha razão.

"Pode ser apenas uma infeção. Só temos de aguentar até sair daqui!" – contrapus desesperada.

"Só um de nós é que se vai safar e não vais ser tu, princesa!" – continuou remexendo no seu casaco. – "As balas estão impregnadas de veneno."

Lágrimas escorriam pelo meu rosto sem as conseguir controlar. Tentava respirar com calma para encontrar alguma lógica naquela conversa, para conseguir entender se Falcon estava a falar a sério ou não.

"Então mas tu também levaste um tiro..." – foram as palavras que me saíram da boca.

"Cada um de nós tem uma dose do antídoto. Não somos parvos o suficiente para andar por ai com veneno nas nossas mãos e não termos um antídoto." – respondeu como se fosse óbvio.

Durante vários dias dizia em voz alta que não me ia safar. Mostrava a toda a gente que estava pronta para partir, no entanto, interiormente, nunca achei que morrer fosse sequer uma hipótese. Pensava que mais tarde ou mais cedo íamos encontrar uma solução e ninguém tinha de morrer, nem mesmo Falcon. Naquele momento, essa certeza que íamos todos sobreviver que estava ancorada no meu cérebro despedaçou-se de repente, deixando no seu lugar um desespero desmedido e acima de tudo medo. Eu não estava pronta.

"Porque é que me contaste isto?"

Até fazer esta pergunta não tinha entendido o verdadeiro significado do ditado a ignorância é uma bênção.

"Eu não tinha intenção de te contar, mas achei que não era justo morreres sem saber o porquê!"

Agora a raiva sobrepunha-se ao medo. Como é que alguém podia ser tão cruel. Como?

"Quanto tempo é que me resta?"

Não me contentava com apenas metade da informação. Não conseguia. Não ia aguentar ter sempre a mesma questão na minha cabeça será que é agora?

" Não sei ao certo, mas não mais que um dia!"

Não mais que um dia. Não mais que um dia. Não mais que um dia. Tinha de arranjar uma solução. Ainda tinha muita coisa para fazer. Só tinha 19 anos e ainda não tinha concretizado sonhos nenhuns. Ainda não tinha feito uma viagem pelo mundo, ainda não tinha feito voluntariado, ainda não tinha aberto uma empresa só minha. Não podia morrer assim, deixando para trás os meus pais, o meu irmão gémeo, Luke, os meus amigos. Não podia.

"Divide o antídoto comigo. Por favor! Estou a implorar-te Falcon." - sentia-me patética a fazer aquela figura, mas que mais me restava?!

"Não posso! A dose é suficiente para uma pessoa, se dividir contigo nenhum de nós se safa..."

Hoje pergunto-me se estivesse no lugar dele o que é que faria, e ainda não consigo ter uma resposta. Mas na altura odiei-o com todas as minhas forças. Era injusto um gajo que tinha atacado um grupo de pessoas inocentes sabe-se lá com que propósito ia viver e eu não. Eu, que sempre tentei ser a melhor versão de mim mesma, que sempre tentei ajudar os outros.

"Por favor, Falcon!" – voltei a suplicar.

"Sarah! Sarah!" – gritou o rapaz.

Poucos segundos depois apareceu Sarah preocupada a perguntar o que é que se tinha passado. Ele não lhe respondeu conclusivamente, mas pediu-lhe que o tirasse dali. Que o levasse até à varanda para apanhar ar. A rapariga assim o vez deixando-me sozinha. Mas não por muito tempo, assim que viram que eu não estava acompanhada e ainda me encontrava a chorar, Philipa e Katie vieram a correr ter comigo.

"O que é que se passa, B?" – inquiriu Katie ajoelhando-se à minha frente.

"É que dói tanto, meninas!" – sem contar toda a verdade fui capaz de não mentir. – "Mas eu prefiro estar sozinha agora."

Fazendo-me a vontade, elas deixaram-me naquele canto da sala comum a chorar e a ter pena de mim mesma.

...

A noite caiu rapidamente. Parecia que o tempo estava a gozar comigo e passar mais depressa que o habitual, para que eu sentisse que a vida me estava a ser tirada a uma velocidade abismal.

Assim que a escuridão recaiu sobre todos nós, Sarah trouxe Falcon de novo para junto de mim. Ele não parecia nada bem. Estava pálido e parecia cansado. Mal se deitou no chão gelado, o rapaz adormeceu e eu fiquei ali a olhar para ele com todo o tipo de pensamentos a cruzar a minha mente. Pensamentos que me deixavam assustada, com medo de mim mesma. Tentei fazer aquela ideia da minha cabeça, mas esta parecia colada a mim, parecia a única coisa a fazer.

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